Macron perde maioria e esquerda se torna principal oposição

Segundo turno das eleições legislativas francesas confirmaram também o forte avanço da extrema direita.

No mapa das cadeiras da Assembleia Legislativa francesa, os amarelos precisarão dos azuis para compor maioria, enquanto os vermelhos da esquerda fazem oposição por um lado e os marrons da extrema-direita por outro.

Dois meses após a reeleição de Emmanuel Macron, o campo presidencial sofreu um violento revés nesta noite de domingo no segundo turno das eleições legislativas, privado da maioria absoluta na Assembleia Nacional e diante de um forte avanço da extrema direita. Macronistas importantes foram derrotados em suas regiões, e abstenção aumentou ainda mais que no primeiro turno.

A coalizão macronista Juntos! perdeu em grande parte a maioria absoluta de 289 assentos na Assembleia Nacional, no final do segundo turno das eleições legislativas neste domingo (19). O confronto foi com a aliança da esquerda unida Nupes, que se torna a principal oposição, além de um avanço muito forte do Encontro Nacional, o partido de extrema-direita de Marine Le Pen.

As esquerdas estão duas vezes mais presentes do que há cinco anos, enquanto uma extrema-direita se apresenta mais forte do que nunca e um partido republicano que se mantém. Nenhuma maioria clara surge, e as partes terão que aprender a compor, algo raro no legislativo e nos governos franceses.

Inéditos na V República, esses resultados abrem um delicado período de negociações em todos os níveis para selar alianças, reorganizar o governo e negociar cargos de responsabilidade na nova Assembleia. Emmanuel Macron, que havia pedido aos franceses que lhe dessem “uma maioria forte e clara“, encontra-se enfraquecido, apenas dois meses após sua reeleição contra Marine Le Pen.

“Trabalharemos a partir de amanhã para construir uma maioria de ação, não há alternativa”, assegurou a primeira-ministra Élisabeth Borne, ela própria eleita por pouco em Calvados, afirmando que esta “situação sem precedentes constitui um risco para o nosso país”.

Os símbolos do espancamento recebido pelos governistas foram as derrotas dos líderes da macronia na Assembleia, dois amigos íntimos de Emmanuel Macron: o presidente Richard Ferrand, massacrado em seu reduto de Finistère e o chefe dos deputados do LREM Christophe Castaner nos Alpes -de-Haute-Provence. Também derrotadas, três ministras – Amélie de Montchalin (Transição Ecológica), Brigitte Bourguignon (Saúde) e Justine Benin (Mar) – terão que deixar o governo. “Está longe do que esperávamos“, admitiu o ministro das Contas Públicas Gabriel Attal, que no entanto se contentou com as vitórias por um fio de dois ministros em Paris, Stanislas Guerini e Clément Beaune .

Mais de um em cada dois eleitores evitou as urnas durante o segundo turno. A abstenção aumentou ainda mais entre 53,5% e 54%, em relação ao primeiro turno. Mas não bateu o recorde de 2017 (57,36%).

Perdas e danos

O segundo mandato quinquenal do Presidente da República abre com uma crise política, após cinco anos pontuados por crises sociais e sanitárias. Uma reorganização deve ocorrer nos próximos dias: os ministros derrotados (Saúde e Transição Ecológica), terão que, segundo uma regra tácita, deixar o governo. Cabe à primeira-ministra Elisabeth Borne compor um novo ministério. Ao invés do Nupes ou do Encontro Nacional (RN), há uma boa chance de que ele recorra aos Republicanos para ultrapassar os 289 deputados e obter o voto de confiança da Assembleia. 

A união da esquerda não terá a maioria de 289 deputados, o que teria permitido trazer Jean-Luc Mélenchon para o palácio de Matignon. O primeiro turno viu a coalizão ultrapassar a maioria presidencial em várias dezenas de milhares de votos, mas a aposta de chegar a primeiro-ministro, muito celebrada, não se concretizou. 

No entanto, Jean-Luc Mélenchon conseguiu uma vitória em que ninguém acreditou após o dilaceramento da esquerda na eleição presidencial. Ele reuniu os principais partidos de sua orientação em uma coalizão, o que não acontecia há 25 anos. A esquerda mais ampla (Nupes + dissidentes) mais que dobrou o número de seus deputados em relação a 2017.

Principal desafio do Nupes: falar a uma só voz na Assembleia Nacional para influenciar o trabalho legislativo. A maioria presidencial deverá jogar com suas diferenças internas em relação à União Européia, assuntos internacionais e a transição energética para desestabilizá-la.

Para os Republicanos, os resultados superaram as expectativas. É certo que a direita republicana perdeu cadeiras em relação a 2017, dividida entre o partido presidencial e a extrema direita, mas resistiu mais do que o esperado.

Acima de tudo, esses resultados colocam o LR em uma posição forte para negociar com o partido presidencial. Olivier Véran, ministro das Relações com o Parlamento, antecipou-se às negociações evocando a rápida construção de uma maioria absoluta para o Ensemble (Juntos!): “Outros grupos vão permitir-nos obter a quota de votos suficiente para apresentar reformas e ter os textos aprovados”, disse ele, após o resultado eleitoral.

A extrema-direita foi a surpresa desta eleição. Uma multiplicação por mais de dez: 8 deputados para o Encontro Nacional em 2017, mais de 80 em 2022. A aposta é claramente ganha para Marine Le Pen, que não esperava tal pontuação. Ela que esperava que 15 deputados criassem uma bancada parlamentar no final de maio, depois 60 após o primeiro turno, finalmente obteve um resultado histórico.

O líder do RN saudou a formação de ” um grupo de oposição decisivo contra os desconstrutores de cima, os macronistas, e os desconstrutores de baixo, essa extrema-esquerda anti-republicana“. No aperto das dificuldades financeiras, com estes bons resultados nestas duas eleições, o Encontro Nacional certamente ganhará uma injeção de subsídios públicos que lhe permitiria voltar ainda mais forte em 2027.

A discreta campanha do RN, que sofreu com o despreparo de alguns de seus candidatos nos televisores, conseguiu jogar a cartada da firme oposição a Emmanuel Macron para convencer os eleitores. O Nupes, por sua vez, acusou o campo de Emmanuel Macron de ser o responsável por esse avanço sem precedentes da extrema-direita, por não ter convocado uma votação sistemática contra os candidatos do RN no segundo turno dessas eleições. 

Vermelhos representam as vitórias do Nupes (a esquerda unida), e azul escuro a vitórias do partido de Marine Le Pen.

As informações são da Rádio França Internacional

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