Eleição na Colômbia acontece hoje entre projetos opostos

A oposição, liderada por Gustavo Petro, acena à construção do diálogo e reconstrução do pais, mas teme fraude eleitoral. A participação da juventude pode ser decisiva.

Foto: Germán Rendón

Neste domingo (19), 39 milhões de colombianos estão aptos a votar para elegerem o próximo presidente da República. No país, o voto não é obrigatório e a participação da juventude pode ser decisiva.

Em jogo, dois projetos opostos. De um lado, a perspectiva de mudança, com o economista Gustavo Petro e a advogada Francia Márquez, com um projeto progressista, e de outro, o magnata Rodolfo Hernández.

A chapa de Petro traz a esperança na construção de uma Colômbia com diálogo e defesa dos interesses nacionais, com o fortalecimento da indústria, investimento na educação pública, gratuita e de qualidade, respeito à natureza, à vida e à Constituição.

Rodolfo Rodriguez já foi condenado por corrupção, fugiu de debates e conta com a máquina do governo Iván Duque – que impôs a ferro e fogo as reformas neoliberais – e do ex-presidente Álvaro Uribe (2002-2010), tristemente célebre pelo Plano Colômbia, que assassinou milhares de jovens inocentes vestidos como guerrilheiros, impulsionou os desaparecimentos forçados, torturas e assassinatos, e oficializou o narcoestado com o paramilitarismo.

A preocupação com uma possível fraude eleitoral cresceu nos últimos dias com a tentativa de impedir a presença de observadores internacionais e até mesmo a fiscalização do software da contabilização das urnas, sob alegação de que está sob a responsabilidade de uma empresa privada.

Petro denunciou ao longo da campanha que, para a meia dúzia de famílias que se revezam no poder há décadas e sua mídia, ser jovem e pobre naquele país o converte em inimigo. “Mas neste jovem pobre está a Pátria”, enfatiza.

O exemplo de Duvan

Jovens erguem a foto de Duvan Felipe Barros, barbaramente torturado e assassinado em Tintal, pelos policiais da Tropa de Choque de Iván Duque

Duvan Felipe Barros tinha apenas 17 anos quando foi barbaramente torturado e assassinado por policiais da Tropa de Choque de Iván Duque. “Ele saiu no dia 5 de junho de 2021 e nunca mais voltou. A última vez que o viram foi aqui no Portal da Resistência, onde os jovens da Primeira Linha faziam as manifestações. Foram um mês e seis dias de busca por hospitais, delegacias de polícia e de menores, mas haviam desaparecido com Duvan. Aqui no Portal encontraram um cadáver, tiraram de um duto uma pessoa, mas diziam que era mais velha, que não era o meu filho. Para mim foram dias de tortura”, contou, entre lágrimas, a mãe Dolores Cecilia Barros Gomes. Na verdade, ele havia sido encontrado antes, mas pelas terríveis sevícias, a polícia só entregou o corpo quando este já se encontrava em decomposição.

Dolores acredita que com Petro e Francia haverá profundas mudanças na estrutura de governo, para que a Justiça avance de forma mais rápida e não haja impunidade. “É um problema que não é só meu, é de milhares de famílias. Oficialmente são 6.400 jovens falsos positivos, mas sabemos que há mais, porque muitos não denunciam porque vivem com medo. Porque quem denuncia é morto. Mas eu não ficarei calada”, frisou a mãe.

Dolores Cecília Barros denuncia as terríveis torturas que Duvan recebeu antes de ser assassinado

Emocionado, Rafael Salazer Gomez, tio de Duvan, foi quem reconheceu que havia inúmeros golpes em todo o corpo, que tinham quebrado o seu nariz, havia múltiplas lacerações nos braços, como se tivesse sido amarrado. “Nós o reconhecemos pelas tatuagens, mas eles continuavam negando. Quando nos entregaram o corpo, apesar do estado de decomposição, pudemos comprovar as torturas. É uma pena, mas não foi o único caso e continuam perseguindo”, alertou.

“Este é um governo narcoterrorista que está matando os jovens”, denuncia Rafael Salazar.

Nos tiraram tanto que nos tiraram até o medo

“Em nosso país, nos tiraram tanto que nos tiraram até o medo”, declarou a jovem mãe Ingrid Bernal, dirigente do movimento Primeira Linha — que esteve à frente na defesa contra a repressão do governo — em Cidade Bolívar, em Bogotá.

Líder da resistência em Cidade Bolívar, Ingrid Bernal acredita que “hoje a transformação e a esperança têm nome: Gustavo Petro e Francia Márquez

“O que buscamos é a esperança. Todos os jovens e aqueles mais velhos que participaram do estallidosocial [levante popular], lutaram para que haja uma verdadeira justiça. Neste momento, a transformação e a esperança são Gustavo Petro e Francia Márquez. Queremos que as mães tenham um túmulo onde chorar, que tenham o filho desaparecido encontrado, que os filhos que não conheceram seus pais possam saber onde estão. Nos atrevemos a sonhar com um país mais bonito, mais digno e inclusivo, com paz e tranquilidade”, enfatizou.

Vítima ocular das violentas repressões às manifestações do Primeiro de Maio de 2021, Daniel Jaime denunciou que, apesar de ter perdido a visão do olho, não lhe foi dada nenhuma garantia pelo mesmo governo que executou os disparos.

“Os únicos que nos ouviram foram os dirigentes do Pacto Histórico. Por isso, como vítimas e ativistas sociais esperamos a vitória da oposição, com o desmantelamento do Esmad (Esquadrão de Choque Móvel), a reparação dos danos causados e que não haja mais repetição destas dezenas de lesões, que são fruto de treinamento. Além disso, é preciso lembrar que, além dos assassinados e desaparecimentos, continuam ocorrendo os falsos positivos judiciais, através dos quais montam farsas para incriminar quem protesta”, protestou. Daniel Jaime acredita que Rodolfo é a continuidade desta política “e isso não podemos permitir”.

Governo rasgou o acordo de paz

Ao encerrar a campanha da frente progressista neste sábado (18), em Cali, junto a veteranos das Forças Armadas e da Polícia, a candidata à vice-presidência Francia Márquez destacou a responsabilidade dos presentes com a nova Colômbia que emergirá. “Amanhã, cada um de vocês poderá dizer a seus filhos, seus netos, que contribuiu decisivamente para a reconciliação e para que a paz fosse uma realidade para todos os colombianos e colombianas. Com isso, os convido a dar o primeiro passo para a paz que começou, mas que este governo se encarregou de rasgá-la em pedaços, indo neste domingo às urnas em família, com amor, com alegria, em comunidade para cumprir este momento com nosso país, com nossa pátria”, afirmou Francia Márquez.

Com edição de Guiomar Prates

*A Agência ComunicaSul está na Colômbia cobrindo o segundo turno das eleições presidenciais graças ao apoio das seguintes entidades: Associação dos/das Docentes da Universidade Federal de Lavras-MG, Federação Nacional dos Servidores do Poder Judiciário Federal e do MPU (Fenajufe), Confederação Sindical dos Trabalhadores/as das Américas (CSA), jornal Hora do Povo, Diálogos do Sul, Barão de Itararé, Portal Vermelho, Intersindical, Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Sindicato dos Bancários do Piauí; Associação dos Professores do Ensino Oficial do Ceará (APEOC), Central Única dos Trabalhadores (CUT), Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES-Sul), Sindicato dos Bancários do Amapá, Sindicato dos Metroviários de São Paulo, Sindicato dos Metalúrgicos de Betim-MG, Sindicato dos Correios de São Paulo, Sindicato dos Trabalhadores em Água, Resíduos e Meio Ambiente do Estado de São Paulo, Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp Sudeste Centro), Associação dos Professores Universitários da Bahia, Sindicato dos Trabalhadores no Poder Judiciário Federal do RS (Sintrajufe-RS), Sindicato dos Bancários de Santos e Região, Sindicato dos Químicos de Campinas, Osasco e Região, Sindicato dos Servidores de São Carlos, Sindicato dos Trabalhadores no Poder Judiciário Federal de Santa Catarina (Sintrajusc); mandato popular do vereador Werner Rempel (Santa Maria-RS), Agência Sindical, Correio da Cidadania, Agência Saiba Mais, Revista Fórum e centenas de contribuições individuais.