Uruguai – Na Marcha do Silêncio, multidão clama por verdade e justiça

Milhares de pessoas prestam homenagem aos quase 200 detidos desaparecidos na ditadura uruguaia.

Foto: Reprodução da Internet

Sob o lema “Onde estão? A verdade segue sequestrada. É responsabilidade do Estado”, marcharam nesta sexta-feira (20) milhares de pessoas que, por conta própria, ou representando organizações de direitos humanos, sindicatos e ex-presos políticos, a cada ano prestam homenagem aos detidos desaparecidos durante a ditadura cívico-militar uruguaia (1973-1985) e exigem resposta pelas pessoas ausentes que foram vítimas do terrorismo de Estado.

A Marcha do Silêncio, que esteve dois anos sem ser realizada presencialmente, por causa da pandemia da Covid-19 e este ano completou a sua 27º edição, é convocada pelo coletivo Mães e Familiares de Detidos Desaparecidos do Uruguai e se realiza a cada 20 de maio em distintos pontos do país e no exterior. Neste ano, foram registradas 35 mobilizações em todos os estados e atividades em 12 países como França, Argentina, Espanha e Reino Unido.

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“A homenagem às vítimas não podem ser outra que o reconhecimento por meio da verdade dos direitos, a recuperação da memória e a exigência de que no Uruguai nunca mais exista a tortura, as execuções e o desaparecimento forçado de pessoas”, expressa a convocatória.

A organização de familiares distribuiu cerca de 22 mil fotografias dos quase 200 desaparecidos. As imagens tinham um QR Code com a história da pessoa para que todos pudessem carregar uma durante a marcha. Também divulgaram vídeos protagonizados por mães que incitam a participar e a levar as imagens.

Com o silêncio ensurdecedor como lema e milhares de pessoas que tomaram mais de 15 quadras com passos lentos pela principal avenida de Montevidéu, 18 de Julho, a marcha se desenvolveu nos dois anos nos quais os organizadores tiveram que pensar estratégias para que, pese a falta de pessoas nas ruas, fosse possível recordar aos desaparecidos virtualmente.

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Como acontece em cada edição, o silêncio se quebra unicamente quando os alto-falantes colocados nas ruas começam a dizer o nome de cada um dos 197 desaparecidos, enquanto as pessoas que marcham dizem com voz calma mas intensa: “Presente”.

Ao final, na chegada à Praça Liberdade, é entonado o hino do Uruguai e as vozes tomam uma particular força na estrofe “tiranos temblad” (tremer tiranos), que todos os presentes cantam com muita intensidade.

Em coletiva de imprensa, o grupo expressou que as fotos que encabeçam a marcha, “simbolizam as dores mais profundas que viveu nossa sociedade”. “Neles, nos seus corpos que as Forças Armadas mantiveram sequestrados, está representado todo o padecimento de uma sociedade submetida ao autoritarismo mais atroz. Junto a eles está o coração de nossas mães, que iniciaram esta luta e abriram uma luz na obscuridade da impunidade, reivindicando verdade e justiça, para esclarecer seu destino. Onde estão?”, questionaram.

Na página oficial na internet, informam que, apesar de alguns passos significativos até o esclarecimento dos fatos acontecidos no país, ainda “faltam importantes parcelas de verdade relacionadas com os mais de 200 casos denunciados”.

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Tendo-se em conta que a ditadura no Uruguai terminou há décadas, o certo é que a busca pelas pessoas desaparecidas começou há pouco tempo. Somente no início do século XXI se formou a Comissão para a Paz, pelo governo do então presidente Jorge Batlle (2000-2005) e ali começou a ser tratado o tema. Anos depois, com a Frente Ampla no Governo, foi encontrado o primeiro corpo de uma pessoa desaparecida, em 2006.

Desde então, somente os corpos de cinco dos 197 ausentes foram achados em diferentes locais militares do país. “Sem declínio das ações nesta temática referida às graves violações aos direitos humanos ocorridas durante a ditadura militar, familiares promovem ações que tendem à busca da verdade e da justiça, à preservação da memória e à reparação integral das vítimas, realizando eventos de divulgação e promovendo ações para o desenvolvimento dos direitos humanos”, diz o texto.

Este texto é uma tradução e edição da Agência Regional de Notícias com informações do jornal El Observador