Governo esconde maioria das reuniões de pastores lobistas a MEC e FNDE

Pastores lobistas foram 127 vezes ao MEC e FNDE no governo Bolsonaro. Parlamentares criticam “antro de corrupção” que o Ministério da Educação se tornou para obter apoio de pastores a Bolsonaro.

O ex-ministro da Educação, Milton Ribeiro, com os pastores Arilton Moura (ao fundo) e Gilmar Santos em culto em Goiânia - Reprodução/Redes sociais


A Folha de S. Paulo divulgou dados que revelam que os pastores evangélicos Arilton Moura e Gilmar Santos visitaram 127 vezes o Ministério da Educação e o FNDE durante o governo Jair Bolsonaro (PL), o equivalente a uma vez por semana, apesar das tentativas do governo de esconder essa informação. Os pastores s˜ão protagonistas do escândalo do balcão de negócios do MEC (Ministério da Educação), que levou o pastor Milton Ribeiro a pedir demissão do cargo de ministro.

Os religiosos também estiveram 35 vezes no Palácio do Planalto desde 2019, segundo dados obtidos com base na Lei de Acesso à Informação. No entanto, a agenda oficial do MEC registra apenas 34 encontros de ao menos um dos pastores com autoridades da pasta de setembro de 2020 a 16 de fevereiro de 2022. Além disso, o MEC e o FNDE recusaram divulgação das listas de presença e atas das reuniões à imprensa, assim como entrevistas para explicar as visitas. Outro indício da irregularidade são as 47 vezes em que o pastor Arilton entrou pela entrada privativa do Ministério.

Arilton foi 21 vezes ao FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação). Gilmar, 3. O fundo é ligado ao MEC e responsável pelas transferências de recursos federais da educação a prefeituras.

Reações

Com isso, parlamentares da oposição estão reagindo acusando o Ministério da Educação de ser um “antro de corrupção” ocupado por pastores evangélicos para garantir apoio à reeleição de Bolsonaro. Foi o que disse o senador Humberto Costa (PT-PE) alarmado com as revelações da reportagem.

“Antro de corrupção no governo Bolsonaro, o Ministério da Educação virou o balcão de negócios para os pastores Arilton Moura e Gilmar Santos. E a presença frequente deles no MEC e FNDE é a prova disso. Desde que Bolsonaro assumiu, os pastores estiveram por lá 127 vezes!”

Agora, muito perguntam se os crimes cometidos contra a educação serão indultados por Bolsonaro, referindo-se ao recente perdão dado pelo presidente ao deputado Daniel Silveira (PTB-RJ), condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), por ameaçar a instituição e a integridade física de seus ministros.

Foi o caso do deputado Elvino Bohn Gass (PT-RS), exigindo investigação da Polícia Federal. “E o desvio das verbas do MEC pelos pastores amigos do Bolsonaro? Também serão indultados? A PF tem o dever de investigar a fundo. As acusações dos prefeitos que confirmaram pedidos de propina são gravíssimas!”

Outro comportamento revelador do governo Bolsonaro tem sido as constantes decretações de sigilos de 100 anos pelo Gabinete de Segurança Institucional (GSI). As tentativas de romper com a transparência no governo foram questionadas pela Controladoria Geral da União (CGU). Bolsonaro usa o expediente para tentar esconder as reuniões entre ele e os pastores, assim como já colocou em segredo um processo administrativo contra o ex-ministro Eduardo Pazuello (Saúde) e seu cartão de vacinação.

É o que já vinha questionando o deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS) nos últimos dias. “Só daqui a 100 anos: Tem aumentado a lista de sigilos do governo do Canalha da República. Por que esconder os registros de entrada no Palácio do Planalto de uma série de pessoas, incluindo dois pastores investigados por suspeita de corrupção no Ministério da Educação?”

Outros como o deputado Pedro Uczai (PT-SC) defendem a instalação de uma CPI do MEC, porque ele considera que Bolsonaro “é réu confesso”. “Decretou sigilo dos encontros dele com os pastores envolvidos nos escândalos de corrupção no Ministério da Educação. Dez prefeitos, por livre e espontânea vontade, deram depoimentos comprovando a corrupção. CPI JÁ!”

A deputada Maria do Rosário (PT-RS) também defendeu em plenário, nesta terça-feira (26), a instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar os escândalos do Ministério da Educação. “É mais do que justo que a Câmara dos Deputados ou o Congresso viessem a instituir, de fato, a CPI do MEC”, afirmou. Na avaliação da deputada, “a corrupção mais abjeta, que nos provoca mais indignação, se é possível assim referir, é aquela que acontece dentro do Ministério da Educação”.

Ela citou que nos últimos 5 anos, o investimento público em Educação atingiu o menor patamar desde 2012, segundo um estudo do Inesc. “De 2019 a 2021, neste péssimo período de governo Jair Bolsonaro, a educação deixou de receber investimentos na ordem de R$ 8 bilhões, mas, enquanto isto, os bezerros de ouro eram acomodados de uma forma vil e covarde, com a troca de influência, com o jogo político da pior espécie de quem prometeu aos brasileiros e brasileiras uma seriedade que nunca teve nem sequer como parlamentar”, criticou.

Escândalo de corrupção

Mesmo sem cargos no governo, os dois pastores negociavam com prefeitos a distribuição de recursos do FNDE para obras. Prefeitos afirmaram, durante audiência na Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado, que os pastores exigiam propina para intermediar a distribuição da verba.

O caso ganhou novas proporções após o áudio em que o próprio Milton Ribeiro fala em priorizar os amigos do pastor Gilmar a pedido do presidente Bolsonaro. “Foi um pedido especial que o presidente da República fez para mim sobre a questão do [pastor] Gilmar”, diz o então ministro na conversa em que participaram prefeitos e os dois religiosos. Assim que esse áudio foi divulgado pela imprensa, Ribeiro pediu demissão em 28 de março.

“Porque a minha prioridade é atender primeiro os municípios que mais precisam e, em segundo, atender a todos os que são amigos do pastor Gilmar”, diz o ministro, que agora silencia completamente sobre o assunto.

A troca do ministro é considerada inócua, porque Victor Godoy Veiga era o secretário-executivo do MEC que também recebia os pastores. A primeira visita do pastor Arilton ao MEC ocorreu em agosto de 2019, quando Abraham Weintraub era ministro, o que revela a continuidade do esquema.

O ex-ministro Milton Ribeiro, que também é pastor evangélico, afirmou à TV Record, em 24 de março, que teria recebido o pastor Arilton “uma ou duas vezes depois da denúncia” e acrescentou que chegou a proibir que ele fosse ao MEC e até teria denunciado ele à CGU. Os dados oficiais revelam que o pastor mentiu. Há relatos de visitas dos pastores ao apartamento do ex-ministro.

Além de visitar o MEC e o Planalto com frequência ao longo dos últimos anos, os pastores também acompanhavam o ministro e presidente do FNDE, Marcelo Lopes da Ponte, em viagens para encontros com prefeituras. Os pastores falavam como se tivessem cargo no governo.

Com informações da Folha de S. Paulo

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