A esquerda bem informada
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Descentralização aprofunda desmonte de licenciamento ambiental

A proposta do governo federal de retirar o licenciamento ambiental do Ibama depara-se com o problema da falta de capacidade institucional e de estrutura técnica dos Estados para essas questões

A descentralização do (Foto: Ditec_Ibama – AM/Banco de Imagens do Ibama)

O governo federal está com uma proposta que retira licenciamento do Ibama para repassá-lo às Secretarias estaduais. Mas a descentralização possibilita que questões ambientais sejam tratadas de modo distinto pelos governos, o que pode fragilizar decisões na área. Há também intenções obscuras por trás da mudança.

O professor do Departamento de Engenharia de Minas e Petróleo da Escola Politécnica da USP, Luis Enrique Sánchez, explica que a descentralização do licenciamento ambiental enfraquece o processo, pois o Ibama montou e capacitou equipe com vasta experiência.

“Infelizmente, o mesmo não ocorre nos órgãos estaduais. Pelo contrário! Nós temos visto, na maioria dos órgãos ambientais, um enfraquecimento. As pessoas mais experientes das equipes terminam suas carreiras, se aposentam ou mudam de posição.”  

Com isso, na avaliação dele, ocorre um enfraquecimento institucional do controle ambiental com as profundas mudanças ocorridas nos últimos anos na legislação e na política ambiental. “Vejo com muita preocupação esta mudança que está sendo ventilada”, resume.

O que se busca além da flexibilização

Já existe também a Lei Complementar nº 140, que procura colocar um ordenamento na distribuição das competências entre o governo federal, estadual e, em alguns casos, municipal. isto para não haver judicialização de licenciamentos e evitar imposição de interesses financeiros sobre a proteção e sustentabilidade ambiental.

Luis Enrique Sánchez – Foto: Maria Leonor Calasans/IEA

Mas o professor destaca que “a intenção parece ser mexer nesse decreto e aproveitar para trazer mais coisas, além desses casos pequenos que estão com o Ibama”, como os “empreendimentos de maior interesse do próprio governo” de outros setores econômicos que nem sempre pensam na melhor solução em termos de sustentabilidade.

O governo justifica que muitas obras portuárias e aeroportuários já estão sob responsabilidade estadual e não deveriam passar por licenciamento federal. O problema é que obra de infraestrutura que atinge o meio ambiental (praias, mangues, mares, rios, flora, fauna, ar, solo, etc) não afetam apenas uma localidade, mas pode tem implicações dramáticas para mais de um estado ou município.

Sánchez destaca que nem essa proposta do Executivo federal nem a lei de licenciamento ambiental, que está sendo debatida no Senado, vão ao cerne da questão. “Se eu tenho um empreendimento com licenciamento estadual, um outro federal, […] quem olha para o conjunto? Quem trata dos impactos ambientais que resultam desses diversos empreendimentos, no mesmo território, funcionando ao mesmo tempo?”, enfatiza. 

Com tais mudanças, a visão técnica do Estado para assuntos ambientais, feita pelo Ibama, se perderia com a descentralização. “A capacitação das instituições e das pessoas, a sua estrutura, disponibilidade de recursos computacionais, possibilidade de fazer trabalhos e vistoria de campo, de acompanhar depois efetivamente um empreendimento que está funcionando”, como aponta o professor, na maioria dos Estados, está em trajetória de decadência com redução drástica de recursos e estrutura. 

“Há um sério problema de capacidade institucional. Muitas vezes temos pessoas muito competentes nesses órgãos estaduais, mas não têm estrutura adequada para executar o trabalho que seriam capazes de fazer”, afirma Sánchez.