16 de março: Professores lutam por reajuste do piso salarial

Com questionamentos de prefeitos e governadores sobre o cálculo do reajuste do piso em 33,24%, começam as disputas com o sindicalismo, as greves e os parlamentares que defendem a Educação. A CNTE comenta o assunto.

A professora Berenice Darc Jacinto na luta da CNTE

presidente Jair Bolsonaro (PL) convocou uma solenidade no Palácio do Planalto para assinar no último dia 4 de fevereiro uma portaria que oficializou o reajuste de 33,24% do piso nacional de professores da educação básica, celebrada como um grande feito de seu governo. No entanto, o reajuste é resultado de uma legislação do Governo Lula, que foi sistematicamente sabotada pelo atual governo.

Diante da obrigatoriedade de sancionar, Bolsonaro ratificou que o salário mínimo desses profissionais deixa de ser R$ 2.886 e passa para R$ 3.845 e procurou alardear uma falsa paternidade. Em discurso, Bolsonaro disse que o aumento foi definido por ele, que detém “a caneta para assinar” o reajuste.

De qualquer forma, sindicalistas comemoram o reajuste como uma importante vitória da Educação, que terá impacto financeiro importante para as famílias desses profissionais. É o caso de Berenice D’Arc Jacinto
(DF), Secretária de Relações de Gênero da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação (CNTE), que observa, no entanto, que o reajuste não é linear, já que alguns estados e municípios já vinham reajustando o piso salarial em torno de 10% a 12%. No entanto, para outros que tinham seus salários arrochados, há anos, a novidade vai fazer muita diferença.

Ouça a entrevista completa:

“Acho importante dizer que, para as categorias que estão vivendo a pressão da reforma administrativa, de congelamento salarial, de uma EC 95 (do Teto de Gastos), é importante que haja esse reajuste”, disse a professora Berenice, em entrevista ao portal Vermelho.

A sindicalista também ressaltou a importância da aprovação da Lei do Piso, em 2008, pelo governo Lula, quando milhões de professores deixaram de receber menos que o piso salarial, o que era comum, até então. “Era uma luta de todas as entidades da categoria que foi acatada pelo presidente Lula. As diferenças salariais eram gritantes. Agora, Bolsonaro avança sobre essa política estabelecida como se fosse o presidente que mais investe em educação”, observou ela.

Ela lembrou as artimanhas e tentativas de tentar retirar os recursos do Fundeb da educação pública para a educação privada como parte do processo de sabotagem do governo para evitar esse reajuste. “Principalmente o Partido Novo teve uma estratégia de colocar no projeto de lei algumas cascas de banana onde os recursos iriam direto para as conveniadas e para o setor privado”, relatou.

O ato do presidente, no entanto, acabou questionado por governadores e prefeitos, que o veem como irresponsável. Berenice aponta que isso já ocorre em municípios e estados onde os profissionais dessas categorias da educação são desvalorizados. “São governos que não acham importante a garantia da lei, e, portanto, não vai ser um reajuste linear. Teremos muitas lutas nesses governos que não só ignoram o valor da categoria, como da própria educação.”

A própria lei do piso aponta que, caso um estado ou município comprove que não tem como arcar com o salário de professores, a União é obrigada cobrir a conta. Desde que a lei entrou em vigor, entretanto, isso nunca ocorreu.

A CTNE já discutiu uma agenda de lutas pela aplicação do piso, com a definição do dia 16 de março como o Dia Nacional do Piso em todo o Brasil, para defender a importância deste reajuste para a categoria e para a educação.

A lei do piso salarial

A criação do piso nacional dos professores é uma conquista da categoria resultante de anos de reivindicações por aumento. A lei que institui o piso é a 11.738, de 16 de julho de 2008. Foi sancionada pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O artigo 5º desta lei é claro: “o piso salarial profissional nacional do magistério público da educação básica será atualizado, anualmente, no mês de janeiro”. O parágrafo único desse mesmo artigo estabelece que o percentual de aumento do piso será o mesmo do aumento anual do investimento governamental por aluno da rede pública.

Este investimento por aluno é calculado de acordo com as leis que regulamentam o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). O fundo foi criado em 2007 e, inicialmente, existiria até 2020. Naquele ano, uma nova lei precisaria torná-lo permanente. Foi o que ocorreu, com o Governo Bolsonaro mobilizando sua base e seu ministro da Educação e da Economia para dificultar a liberação do recurso.

Resistência de prefeitos e governadores

Professores do ensino básico público são, em sua grande maioria, trabalhadores contratados pelos governos estaduais e prefeituras. São eles, portanto, quem terão de adequar os salários de seus funcionários ao novo piso anunciado por Bolsonaro.

Tão logo o novo piso foi oficializado, representantes de governos locais disseram não ter condições de pagá-lo. O governador do Piauí, Wellington Dias (PT), que também é presidente do Fórum Nacional de Governadores, estimou que mais de 70% das prefeituras e quatro estados terão dificuldades para adequar os salários de seus professores ao piso.

Após a reunião, governadores decidiram que pretendem se encontrar com representantes do governo federal para buscar uma solução para o pagamento do aumento. Apontaram também que a correção do piso salarial pela inflação seria “mais justa”, embora a luta seja pela valorização do piso, o chamado aumento real.

O fórum ainda quer discutir a validade do cálculo do reajuste.

Confederação Nacional do Municípios (CNM) divulgou uma nota no dia do anúncio oficial do novo piso salarial informando que a portaria assinada por Bolsonaro sobre o assunto “não tem base legal”. Isso porque, no entendimento da entidade, a lei de 2020 que tornou o Fundeb permanente anulou a regra de que o reajuste dos professores deveria seguir a conta do valor do investimento público por aluno.

Esse entendimento já havia sido divulgado pela CNM em janeiro, quando os cálculos do Fundeb já indicavam um eventual reajuste de 33,2%. Naquela época, a entidade declarou que esse reajuste causaria um impacto de R$ 30,46 bilhões nas contas das prefeituras.

De acordo com a confederação, o próprio Ministério da Educação (MEC) havia informado no último dia 14 que a fórmula de cálculo do aumento do piso havia sido anulada pela nova lei do Fundeb. A leitura, lembrou a CNM, estava baseada num parecer da Advocacia-Geral da União (AGU).

Parlamentares pressionam

Acontece que, após esse pronunciamento do MEC, parlamentares vinculados a comissões e frentes em defesa da Educação divulgaram uma nota de esclarecimento apontando que a fórmula do cálculo do piso permanecia em vigor. Deveria, portanto, ser cumprida.

Para o deputado federal Professor Israel (PV-DF), presidente da Frente Parlamentar Mista da Educação, a pressão fez o governo rever sua posição. “A equipe de Jair Messias Bolsonaro tentou sabotar o reajuste do piso salarial de professores. Foi a rápida reação da Frente de Educação no Congresso que o constrangeu a obedecer a lei”, declarou Israel. “Agora ele tenta surfar na onda, já que não conseguiu impedi-la.”

O Brasil de Fato perguntou ao MEC sobre a validade da regra do reajuste, o impacto do aumento nas contas públicas e sobre eventual ajuda do governo federal a estados e municípios para pagamento do novo piso. O órgão encaminhou à reportagem um parecer do MEC no qual o reajuste do piso dos professores é tratado de forma ambígua.

Primeiro, o MEC entende que ele não seria obrigatório, alinhando-se ao entendimento de prefeitos e governadores. Depois, o ministério admite que uma interpretação da lei do piso poderia basear o aumento de 33,2% aos professores, conforme defende a CNTE.

O parecer não indicou ao governo qual entendimento deveria ser seguido. Bolsonaro, porém, assinou a portaria oficializando o aumento.

Com informações do Brasil de Fato

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