Moraes exige que Bolsonaro deponha, hoje, sobre vazamento de inquérito

Ministro do STF já tinha definido prazo até esta sexta para PF ouvir o presidente, mas depoimento não foi agendado. Bolsonaro divulgou pela internet dados sigilosos de investigação não finalizada.

(Foto: Reprodução)

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes determinou nesta quinta-feira (27) que a Polícia Federal colha, ainda hoje (28), o depoimento de Jair Bolsonaro no inquérito que apura o vazamento de documentos sigilosos em uma transmissão do presidente em redes sociais.

Moraes negou um pedido de Bolsonaro para abrir mão de ser ouvido na investigação, e definiu que o depoimento deve ser prestado no início da tarde, na Superintendência da PF em Brasília.

O ministro também retirou o sigilo da investigação e ordenou que, após o interrogatório, a PF conclua o inquérito.

A Advocacia-Geral da União (AGU), responsável por representar o governo na Justiça, foi intimada da decisão. Até a tarde de ontem, quinta, mesmo com o depoimento estando previsto desde o ano passado, ainda não tinha sido agendado. Bolsonaro e a AGU usaram de todos os recursos para protelar esse depoimento, em diversas ocasiões.

O inquérito foi aberto para investigação da divulgação feita por Jair Bolsonaro, em redes sociais, de dados e documentos sigilosos de um inquérito não concluído sobre ataques ao sistema do Tribunal Superior Eleitoral.

“Em respeito ao cidadão”

Na decisão, Moraes afirmou que a participação de investigado no inquérito “não é apenas um meio de assegurar que os fatos relevantes sejam trazidos à tona e os argumentos pertinentes considerados”. Segundo o ministro, o depoimento é importante para o próprio investigado e representa respeito e a consideração que qualquer cidadão merece.

“Em uma República, o investigado – qualquer que seja ele – está normalmente sujeito ao alcance dos poderes compulsórios do Estado necessários para assegurar a confiabilidade da evidência, podendo, se preciso, submeter-se à busca de sua pessoa ou propriedade, dar suas impressões digitais quando autorizado em lei e ser intimado para interrogatório”, escreveu.

Moraes disse ainda que o “respeito às garantias fundamentais não deve ser interpretado para limitar indevidamente o dever estatal de exercer a investigação e a persecução criminal, função de natureza essencial e que visa a garantir, também, o direito fundamental à probidade e segurança de todos os cidadãos”.

Para o ministro, o direito ao silêncio de um investigado não assegura a recusa de prestar depoimento.

“A Constituição Federal consagra o direito ao silêncio e o privilégio contra a autoincriminação, mas não o “direito de recusa prévia e genérica à observância de determinações legais” ao investigado ou réu, ou seja, não lhes é permitido recusar prévia e genericamente a participar de atos procedimentais ou processuais futuros, que poderão ser estabelecidos legalmente dentro do devido processo legal, máxime quando já definidos ou aceitos pela defesa, como na presente hipótese em que, inclusive, houve concordância do acusado em participar do ato procedimental e solicitação de dilação de prazo para agendamento e oportunidade para o presidente da República exercer real, efetiva e concretamente seu direito de defesa, como fator legitimador do processo penal em busca da verdade real e esclarecimento de importantes fatos”.

Jogando o delegado no fogo

Na manifestação enviada ao Supremo, ao pedir o arquivamento do inquérito, a AGU explicou como foi acesso de Bolsonaro ao inquérito sigiloso sobre o ataque ao TSE e afirma que a conduta do delegado do caso levou a erro o presidente e o deputado Filipe Barros, que participou da live com o presidente.

Segundo a AGU, Filipe Barros enviou ofício à PF em 14 de julho do ano passado pedindo para ter acesso ao material da investigação e dizendo que “com expressa ressalva de que deveriam ser apartados do compartilhamento eventuais dados sigilosos ou cuja divulgação pudesse fragilizar o impulso investigativo”.

O governo afirma que no dia 26 de julho, o delegado enviou a íntegra do inquérito e sem “a contextualização de qualquer óbice para o seu aproveitamento e ampla divulgação, seja no âmbito da Comissão Parlamentar ou em qualquer outra esfera”.

O documento cita trechos do depoimento do delegado Victor Campos, apontando que essa investigação não estava sob segredo de Justiça.

Para a AGU, isso mostra que Bolsonaro não divulgou dados sigilosos – e que, portanto, não ficaria configurado crime. “É cristalina a compreensão de que se está diante de conduta manifestamente atípica por parte do Senhor Presidente da República, na medida em que não divulgou documentos agasalhados pelo timbre do sigilo”.

Segundo o governo, não há distinção entre divulgar o inquérito em uma comissão da Câmara ou na live do presidente.

A AGU disse que, para efeitos de diálogo, na hipótese de se admitir que os documentos eram sigilosos, o que não ocorre, a conduta da Polícia Federal induziu em erro o deputado Federal Filipe Barros, destinatário de cópia dos autos, e o presidente da República, que, neste caso, estariam incorrendo em erro sobre elemento constitutivo do tipo legal, o que excluiria o dolo, autorizando, noutro giro, a apuração do crime cometido pelo terceiro que determinou”.

O governo aponta ainda que “não havia sigilo, segredo de justiça, diligência em andamento ou tampouco prejuízo aos rumos da investigação”.

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