Ministro de Bolsonaro reafirma em Glasgow: tem que pagar para não desmatar

Ministro do Meio Ambiente participou de evento da COP26 e exigiu mais dinheiro internacional para garantir preservação da Amazônia

Reunião de Joaquim Leite durante a COP26 em Glasgow. Montagem de Cezar Xavier sobre foto do MMA - Ministério Meio Ambiente

O ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, disse hoje (9), em Glasgow, na Escócia, que a proposta dos países ricos ajudarem as nações em desenvolvimento com US$ 100 bilhões anuais para financiar ações de preservação ambiental e de enfrentamento às mudanças climáticas tornou-se insuficiente, diante da urgência do mundo transformar o atual modo de produção.

“Acho que o desafio global é uma transição responsável na direção da neutralidade de carbono, de forma rápida, mas responsável. O que significa isto? Que nós precisaremos de mais recursos do que os US$ 100 bilhões anuais”, disse Leite ao participar de um evento do pavilhão brasileiro na Conferência Sobre Mudanças Climáticas da Organização das Nações Unidas (COP26).

Leite assumiu a pasta no lugar de Ricardo Salles, diante das inúmeras críticas internacionais ao aumento do desmatamento no Brasil, em particular na Amazônia. Além de ser investigado por envolvimento na venda de madeira ilegal, Salles estava perdendo recursos preciosos da Noruega e da Alemanha, destinado ao Fundo Amazônia. Diante da necessidade de retomar essa verba, o novo ministro assumiu o compromisso de convencer o mundo das boas intenções de Bolsonaro e passar o chapéu.

Esta visão mercantilista do governo Bolsonaro diante da política de meio ambiente tem sido criticada. A linguagem do governo para tratar o assunto gira em torno de aproveitar as oportunidades do mercado de créditos de carbono, estimular a Economia Verde, aumentar o Fundo Amazônia, entre outras medidas que focam apenas no aspecto financeiro da defesa do meio ambiente. O próprio ministro não é da área de meio ambiente, mas do agronegócio, sendo contrário `à demarcação de territórios indígenas, em benefício da agropecuária.

Não haveria problema nenhum na exigência de financiamento, se o governo Bolsonaro estivesse fazendo a lição de casa. Em vez disso, houve um desmonte dos principais organismos de fiscalização de crimes ambientais por esse governo, como o Ibama e o ICMBio. A antipolítica ambiental foi expressa abertamente por Ricardo Salles ao dizer que faria “passar a boiada” durante a pandemia. Assim como ficou claro internacionalmente, por medições de satélites, o aumento recorde de queimadas na Amazônia, com avanço de garimpos ilegais e pecuária em territórios indígenas com violência e morte de lideranças ambientais, pequenos agricultores, sindicalistas e indígenas.

A gravidade das mudanças climáticas verificada por cientistas de todo o mundo, apontando para a necessidade urgente de redução das emissões de gases de efeito estufa, não permite que governos negacionistas se aproveitem para lucrar com o aquecimento global. Embora os países ricos tenham uma responsabilidade muito maior na redução das emissões, ambientalistas acreditam que os governos precisam se unir em torno de medidas concretas para impedir o colapso do clima, e não tirar vantagem disso.

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Antes mesmo de o ministro Joaquim Leite chegar a Glasgow, onde desde a semana passada acontece a COP26, a delegação brasileira já tinha apresentado a representantes dos países que participam do evento uma proposta em defesa da ampliação, pelas principais economias mundiais, dos US$ 100 bilhões de ajuda, alegando que o valor fixado em 2009, e batizado de Fundo Verde, já não é suficiente.

O ministro citou um estudo da Boston Consulting Group (BCG) segundo o qual o mundo precisará investir US$ 150 trilhões nos próximos 30 anos se quiser cumprir as metas do Acordo do Clima pactuado em Paris, em 2015, e, assim, conter o aquecimento global.

Ou seja, US$ 5 trilhões anuais, pelas próximas três décadas, para transformar em realidade projetos que permitam a todos os países migrarem para um modelo econômico baseado no conceito de baixa emissão de gases de efeito estufa, dentre eles, o dióxido de carbono (CO²).

“O papel do Brasil é tentar buscar um consenso multilateral para que a gente rume de uma forma justa para uma economia mais verde. O grande desafio é o financiamento, o incentivo [financeiro]. O desafio não é punir, proibir ou parar. É acelerarmos na direção de uma nova economia verde. E como eu faço isto? Incentivando”, disse Leite antes de afirmar que, para o Brasil e outros países em desenvolvimento, será difícil custear as inovações necessárias sem o apoio financeiro das nações ricas.

“O Brasil apoia claramente este movimento de que a solução para uma nova economia, neutra em emissões, está no incentivo, no empreendedorismo, no juro verde – que faça com que qualquer projeto fique de pé. E muitos projetos, em algumas regiões, ainda não têm esta capacidade de fazer esta transição que o mundo todo espera”, acrescentou o ministro.

Os ricos que paguem

Antes da fala de Leite, o presidente da Confederação Nacional da Indústria, Robson Braga de Andrade também já havia se referido à “mobilização de recursos financeiros internacionais para ações de combate às mudanças climáticas” como uma “medida de grande relevância para a indústria brasileira”.

Contudo, o presidente da CNI se ateve aos US$ 100 bilhões já pactuados em 2009 e disse que, embora o acordo inicial estabelecesse que a verba deveria estar disponível a partir de 2020, países ricos ainda condicionam o aporte de recursos ao Fundo Verde à obrigação de países emergentes assumirem compromissos para reduzir as emissões e o desmatamento.

“Nossa expectativa é que os países desenvolvidos se comprometam, efetivamente, com o plano que prevê a liberação de US$ 100 bilhões, por ano, para apoiar as ações destinadas a minimizar os impactos do aquecimento global nas nações menos favorecidas”, declarou Andrade, defendendo a autonomia de cada país definir suas prioridades.

Rodrigo Pacheco/Glasgow
Presidente do Senado, Rodrigo Pacheco – Ministério do Meio Ambiente

Já o presidente do Congresso Nacional, senador Rodrigo Pacheco, fez questão de explicar que a cooperação global não deve ser vista como iniciativa filantrópica e também defendeu que o mundo precisa pagar para o Brasil não desmate.

“Quando se fala na ajuda dos países desenvolvidos para países em desenvolvimento, há uma lógica. Agora que chegamos a um ponto em que nos demos conta de que é fundamental que o desenvolvimento esteja pautado na contenção da emissão de poluentes e do desmatamento, todo o mundo, sem exceção, tem responsabilidade pelos lugares onde haja florestas que, para serem preservadas, precisam da contribuição de todos os países, sobretudo dos desenvolvidos, que se valeram antecipadamente do proveito das suas atividades econômicas com algum sacrifício ao meio ambiente”, disse Pacheco, defendendo “uma compensação dos países desenvolvidos aos países em desenvolvimento”, para que estes preservem seu meio ambiente.

Com informações da Agência Brasil

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