“Industrialização garantirá soberania e menor preço dos alimentos”, afirma líder do Peru Livre

Yuri Castro afirmou que “com apoio técnico e injeção de recursos na agricultura familiar, a segunda reforma agrária anunciada pelo presidente Pedro Castillo romperá a dependência da importação de trigo, milho e soja, controladas pelo estrangeiro”

“Com apoio técnico e injeção de recursos na agricultura familiar, a segunda reforma agrária romperá a dependência da importação de trigo, soja e milho, commodities mundiais controladas pelo estrangeiro e que explodem nos preços da cesta básica da população”, afirmou Yuri Castro, membro do comando nacional do Peru Livre – partido do presidente do país, Pedro Castillo. E a alta no primeiro semestre de 2021, em dólares, foi mais do que abusiva em relação a igual período do ano passado, quando o preço já se encontrava nas nuvens: trigo (24,4%), soja (65,9%) e milho (72,3%).

A nova reforma agrária busca orientar as políticas públicas em favor do desenvolvimento da agricultura familiar e das cooperativas agrícolas, e foi lançada precisamente em um três de outubro, data que iniciou em 1968 o governo nacionalista de Juan Velasco Alvarado. Como a reforma anterior, feita por Velasco, a atual luta por garantir independência ao país em um mercado dominado por cartéis que manejam as sementes, a engenharia genética, os maquinários, adubos e fertilizantes.

Conforme Yuri Castro, “o projeto apresentado pelo professor Castillo é muito interessante e tem sido debatido amplamente não só dentro do Peru Livre, como no conjunto da esquerda, porque diz respeito ao fomento à agricultura familiar e a um novo modelo de desenvolvimento”. “Ele une famílias que têm pequenas propriedades de dois ou três hectares e que antes não recebiam qualquer apoio técnico. Criamos uma espécie de cooperativa agrícola onde os universitários podem dedicar seu tempo e exercer suas práticas contribuindo para potencializar a produção. É uma forma de conjugar e harmonizar as técnicas modernas com as tradicionais, ensinando os benefícios das rotações de cultivos”, frisou.

“Porque, infelizmente, um dos problemas do nosso país continua sendo a prática do monocultivo. Se a pessoa planta batata, é apenas batata, o que danifica o solo, porque não há alternância. Então todos esses conhecimentos são introduzidos pelos engenheiros agrônomos, de alimentos e agroindustriais que vão poder educar os pequenos agricultores familiares. Isso também vai lhes dar uma maior rentabilidade nos cultivos”, declarou.

O significado de centrar o foco nestes pequenos proprietários, explicou o dirigente, “é que no Peru a agricultura é basicamente familiar, com as grandes exportadoras não chegando a 15%”. Sem condições de abastecer o mercado interno, o resultado é o aumento da fome, principalmente rural, aponta o Instituto Nacional de Estadística e Informática (INEI). Assim o país chegou até a pobreza, que em 2020 afetou 45,7% da população rural – cresceu 4,9% em relação a 2019 – e 26% da população urbana – com um incremento de 11%.

Yuri Castro

Mas para avançar na atenção aos pequenos produtores, Yuri Castro acredita que é preciso ir além de ampliar o crédito ou garantir compras do Estado, e dar atenção especial à industrialização. “Enquanto Peru Livre, nós propusemos desde a campanha eleitoral de Castillo a criação de um Ministério de Ciência e Tecnologia, que está em processo de formatação. Esperamos vê-lo concretizado o mais breve possível para que tenhamos um conjunto de engenheiros e especialistas na agricultura plenamente envolvidos com práticas e políticas inovadoras”, acrescentou.

A questão do pleno abastecimento e do rebaixamento dos preços dos alimentos será praticamente uma consequência, enfatizou Yuri Castro, porque no Peru se consome muito produto importado. “O fato é que, apesar de termos terras férteis e que nos possibilitariam todas as condições para produzir, importamos muito trigo, por exemplo, fundamentalmente dos Estados Unidos. Não podemos desconhecer que são commodities mundiais que subiram de forma elevada no último período. E muitos azeites domésticos são extraídos da soja e do milho”, assinalou.

Mudar Constituição é prioridade

A fim de garantir que não haja retrocesso, Yuri Castro considera essencial “a mudança de Constituição, algo que para nós é extremamente importante e estamos impulsionando a coleta de assinaturas para a mudança de Constituição”. “Temos um grupo de pessoas que está trabalhando intensamente nesta questão porque compreendemos a necessidade de rompermos com a herança fujimorista. Estamos colhendo assinaturas por todo o país. Somente em Lima, em apenas um mês, já recolhemos mais de 100 mil assinaturas, 20% do meio milhão que nos propusemos arrecadar. Acreditamos ser expressivo termos obtido essa resposta positiva da população e que seguiremos avançando para, em dois ou três meses, atingir o objetivo final”, destacou.

Segundo Yuri, quando as pessoas são contatadas nas ruas para colocar a sua assinatura na solicitação, “o principal sentimento que lhes move é a recuperação dos recursos naturais do país, valiosos patrimônios que foram entregues aos estrangeiros na época da ditadura”. “Se tivessem sido vendidos, teria havido algum lucro, mesmo que a preço de ovo, mas foram doados”, condenou.

Diante do intenso embate no Congresso e na sociedade, particularmente contra uma oligarquia e uma mídia que continuam se beneficiando da sangria dos recursos da nação, o dirigente do Peru Livre reforçou a importância de que, “no último sábado, o professor Castillo tenha voltado a reiterar nosso compromisso com a recuperação dos recursos do gás de Camisea, que é um tema da nossa agenda em que vamos trabalhar”.

“O gás toca profundamente as pessoas porque subiu muito. O que ocorre com o gás de Camisea é que nos compram a 0,5 centavos de dólar o metro cúbico, enquanto nos vendem a 4,5 dólares: nove vezes mais. Em Camisea, a cidade onde está localizado o gás, os moradores compram o Gás Liquefeito de Petróleo (GLP) a quase 15 dólares o galão. O GLP praticamente duplicou o seu preço no ano. E o gás natural está subindo com a desculpa de que o barril de petróleo está subindo, mas a verdade é que 80% do GLP do Peru se produz dos líquidos do gás de Camisea, não vem do petróleo. Então estão metendo a mão no nosso bolso. Repito: 80% do gás que usamos se produz dos líquidos do gás de Camisea. E os estrangeiros sobem o preço supostamente porque o petróleo subiu. Temos atualmente o gás quase no preço da gasolina, quando deveria custar muitíssimo menos, porque a matéria-prima que utilizam é o excedente do gás natural. Isso está controlado pela Repsol”, alertou.

Outra das “trágicas heranças do fujimorismo” denunciada por Yuri Castro é a “precarização total do emprego”. Para isso foram criadas as chamadas “services” –  empresas que agenciam mão-de-obra a outras que não querem assumir qualquer responsabilidade sobre os seus contratados. Assim, em caso de um acidente ou problema trabalhista, o empregado deve dirigir-se a ela, como contratante formal, mas não à empresa que lucra com o seu trabalho. “A terceirização converte o trabalhador praticamente em um semiescravo porque empurra todas as obrigações do emprego considerado ‘normal’, mas sem reconhecer qualquer direito trabalhista: nem folga, nem férias, nem feriado ou Natal, nada”.

Do ponto de vista continental, Yuri Castro defende “a necessidade da construção de uma ampla unidade das nações da América Latina para enfrentar o império e qualquer das suas ameaças”. “Isso não só na questão do controle de preços, mas algo como uma União Sul-Americana de Nações onde possamos ter uma moeda comum e fortalecer e enfrentar os Estados Unidos e a União Europeia, que são quem fundamentalmente neste momento controlam a economia, os empréstimos e condicionam os governos da nossa América às suas políticas internacionais”, enfatizou.

Para o dirigente, mais do que nunca é importante estar alerta em defesa da democracia. “Temos uma direita que não admite ter perdido e continua insistindo em pedir a vacância do cargo de presidente. Querem retirar da Constituição o equilíbrio de poderes para poder tirar o presidente quando lhes dê vontade. Seu projeto de lei acaba de ser rechaçado, mas vão apresentá-lo por insistência, como assinalaram, e o governo vai levar a questão ao Tribunal Constitucional, que é eleito pelo Congresso. Então há um temor de que o Tribunal Constitucional acabe aprovando esta lei. Estamos trabalhando para que isso não ocorra e que o voto da maioria do povo seja respeitado”, concluiu.

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