OAB e CNTE criticam PEC dos precatórios por “pedalada fiscal”

Debatedores criticam PEC dos precatórios durante audiência na Câmara, por comprometer recursos da Educação, para cumprir promessa eleitoreira e chantagear o Congresso.

Representantes da OAB e CNTE, presentes na comissão, criticaram a PEC dos precatórios. Gustavo Sales/Câmara dos Deputados

Deputados e representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) criticaram nesta quarta-feira (6) a proposta de emenda à Constituição que parcela precatórios (PEC 23/21), ou seja, as dívidas do setor público reconhecidas pela Justiça. Boa parte é devida entre os próprios entes da Federação.

Segundo os participantes de audiência pública na comissão especial que trata do assunto, a PEC, que foi apresentada pelo governo federal, não traz uma solução definitiva para o problema e configura calote em credores e “pedalada fiscal”, prejudicando principalmente o pagamento de dívidas cujos recursos devem ser utilizados na educação.

Assim como outros especialistas críticos da PEC, o presidente da Comissão Especial de Precatórios da OAB, Eduardo Gouvêa, disse que a proposta viola princípios constitucionais como o devido processo legal, a coisa julgada e o direito adquirido e que, portanto, será alvo de discussão no Supremo Tribunal Federal (STF), que já entendeu como inconstitucional, anteriormente, o parcelamento de precatórios.

Ainda segundo Gouvêa, o parcelamento poderá criar um problema econômico para o futuro. “O caixa da União tem R$ 1,7 trilhão disponíveis. Aqui está se falando em pedalar R$ 30 bilhões, R$ 40 bilhões, R$ 50 bilhões. Não representam nem 3% desse valor que se tem em caixa”, explicou. “Não precisamos deixar de pagar os precatórios. Se o pagamento for adiado, pode gerar uma bola de neve de R$ 672,4 bilhões a R$ 1,4 trilhão até o fim de 2036.”

Como soluções para o problema, Eduardo Gouvêa sugeriu medidas como compensação fiscal, conciliação e mediação, empréstimos privados e financiamento direto aos entes públicos ou aos credores pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Educação

Já o presidente da CNTE, Heleno Araújo, chamou a atenção para os precatórios relativos a dívidas do antigo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef).

“É uma dívida que cabe aos estados e municípios que não receberam, no tempo exato, os recursos devidos pela União. Esses recursos têm destinação: 60% são para salário de professoras e professores que atuam nos municípios, nas redes estaduais e no Distrito Federal. Os outros 40% são para salário dos demais profissionais da educação e a manutenção e desenvolvimento da educação em nosso país.”, detalhou Araújo.

O pedido dele é para que os parlamentares arquivem a PEC 23/21 e que o problema seja trabalhado de outras formas.

Dívidas eleitoreiras

Já parlamentares que solicitaram a audiência pública enxergam na proposta uma questão política. O deputado Idilvan Alencar (PDT-CE) acredita que os interesses do governo são eleitorais, ao pretender destinar recursos de dívidas judiciais para programas sociais como o Auxílio Brasil.

“Sob o ponto de vista do credor, é calote. Se é calote quando não paga alguém, por que para a União não é calote? Sob o ponto de vista fiscal, é pedalada. Sob o ponto de vista político, é chantagem. O ministro [da Economia] Paulo Guedes pergunta se vamos pagar precatório ou vamos aumentar os recursos de programa social”, afirmou Alencar.

Também o deputado José Ricardo (PT-AM) apontou “chantagem” do governo para com o Congresso e a população. “Essa história de pegar o dinheiro dos precatórios para garantir o Bolsa Família é demagogia. Sabemos que o governo tem instrumentos para garantir.”

Por sua vez, o deputado Enio Verri (PT-PR) lamentou que dinheiro da educação seja sacrificado pela PEC. “Dá para ajudar o governo nisso aí. Não precisa atingir o Fundef nem os pequenos recebimentos. Trata-se de uma escolha.”

O deputado Leonardo Picciani (MDB-RJ), que conduziu a audiência, atentou para as responsabilidades da comissão especial. “Mudar a Constituição é coisa séria. Se estamos discutindo essa questão, é importante que façamos sob a óptica de resolver e estruturar de forma permanente. Que a gente encontre o modelo que melhor atende aos anseios da população, para que a gente garanta o direito de quem tem uma dívida a receber e garanta previsibilidade a quem tem o dever de pagar”, ponderou.

Outras audiências

A audiência desta quarta foi a terceira realizada pela comissão especial. Na primeira, realizada na semana passada, o secretário especial de Tesouro e Orçamento do Ministério da Economia, Bruno Funchal, defendeu o parcelamento proposto. Ele disse que o total de precatórios teve um crescimento repentino e passou de R$ 54,7 bilhões, neste ano, para R$ 89,1 bilhões, no orçamento de 2022.

Em debate realizado na terça-feira (5), representantes de estados e de municípios pediram mudanças no texto. O Comitê Nacional de Secretários de Fazenda Estaduais (Comsefaz) informou que, em princípio, os estados são contrários ao parcelamento. Mas pediu que, caso a PEC seja votada, a dívida dos estados e municípios com a União não seja obrigatoriamente compensada com os precatórios que a União deve a esses governos.

De acordo com a PEC, até 2029, os precatórios com valor acima de 60 mil salários mínimos (ou R$ 66 milhões, atualmente) poderão ser quitados com entrada de 15% e nove parcelas anuais. Precatórios de até 60 salários mínimos (hoje R$ 66 mil) sempre serão quitados a vista. Ainda segundo a PEC, outros precatórios poderão ser parcelados se a soma total vier a superar 2,6% da Receita Corrente Líquida (RCL) da União. Nesse caso, o parcelamento começará pelos de maior valor.

O relator da PEC, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), poderá apresentar seu parecer à matéria nesta quinta-feira (7).

Com informações da Agência Câmara de Notícias

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