São Paulo terá cinco novas estátuas de personalidades negras

Carolina Maria de Jesus, Adhemar Ferreira da Silva, Itamar Assumpção, Madrinha Eunice e Geraldo Filme serão homenageados em monumentos na capital

Novas estátuas homenageiam personalidades negras na cidade de São Paulo

A escritora Carolina Maria de Jesus, o pentacampeão de salto triplo Adhemar Ferreira da Silva, os cantores e compositores Itamar Assumpção e Geraldo Filme e a sambista e ativista Madrinha Eunice serão homenageados com cinco estátuas que serão instaladas na cidade de São Paulo.

A pressão por mais monumentos que homenageiam personalidades negras na cidade de São Paulo é antiga e se intensificou após o incêndio na estátua do bandeirante Borba Gato. O ato reacendeu o debate sobre a pertinência de monumentos que homenageiam pessoas ligadas à escravidão, colônia, ditadura e a outros períodos sensíveis no passado do Brasil.

De acordo com a prefeitura, foram escolhidas personalidades negras com forte ligação com o município. A medida se insere numa ampla política de promoção da igualdade racial e valorização da diversidade étnica na capital. O anúncio ocorreu na terça-feira (17) durante a Semana de Valorização do Patrimônio, que vai até sexta-feira (20).

A estátua de Carolina Maria de Jesus, autora do clássico Quarto de Despejo, será instalada no Parque Linear Parelheiros, onde a autora viveu por muitos anos. A estátua de Geraldo Filme ficará na Barra Funda, perto do antigo Largo da Banana, local que, segundo a prefeitura, foi “aprovado por pessoas do movimento e pela própria família do Geraldo”.

Ainda não está o local onde ficará de estátua de Adhemar Ferreira da Silva, mas é provável que seja no canteiro central da Avenida Braz Leme, no bairro da Casa Verde, onde o pentacampeão de salto triplo sempre morou e onde surgiram clubes de atletismo em decorrência do sucesso dele. A estátua de Madrinha Eunice, fundadora da primeira escola de samba da capital, a Lavapés, ficará na Praça da Liberdade.

A localização da obra em homenagem a Itamar Assumpção ainda não está definida. “A prefeitura ainda está em contato com a família do artista para indicação de lugares possíveis para a homenagem, mas localidades como a Casa de Cultura da Penha, onde Itamar gravou a trilogia Bicho de 7 cabeças, em 1993, e que também conta com um estúdio em sua homenagem e no bairro onde ele nasceu; e a Praça Benedito Calixto, importante espaço cultural da cidade próximo ao antigo teatro Lira Paulistana, já estão sendo considerados”, diz nota divulgada pela Secretaria Municipal de Cultura.

No ano passado, a prefeitura inaugurou uma estátua na Praça Clóvis Bevilácqua em homenagem a Joaquim Pinto de Oliveira (1721-1811) , um escravo que foi um artesão e arquiteto e ficou conhecido com a alcunha de Tebas.

Segundo levantamento do Instituto Pólis de 2020, a capital paulista tem 367 monumentos, dos quais 200 homenageiam pessoas. Desses, 137 são homens brancos, 18 são mulheres brancas, e apenas 5 homenageiam pessoas negras, sendo 4 homens negros e 1 mulher negra.

O número de estátuas de pessoas negras deve subir para 10 até fevereiro de 2022, o que representará cerca de 5% dos monumentos.

Quem foram?

A ESCRITORA CAROLINA MARIA DE JESUS. FOTO: REPRODUÇÃO/ACERVO INSTITUTO MOREIRA SALLES)

Carolina Maria de Jesus é um dos maiores nomes da literatura brasileira e um caso impressionante pela trajetória. Nascida em 1914, no interior de Minas Gerais, em 1947 se instalou na favela do Canindé, na zona norte de São Paulo. Levantou ali um barraco com as próprias mãos e viveu boa parte da vida com os três filhos, catando e vendendo papel para sobreviver.

Em 1958, o jornalista Audálio Dantas, da extinta Folha da Noite, descobriu que ela mantinha um diário em que comentava o cotidiano da favela. ele passou a publicar trechos dos seus escritos no jornal, sendo publicado como “Quarto de Despejo” em 1960. A obra foi traduzida para 13 idiomas e vendida em mais de 40 países.

Em 1977, ela morreu em decorrência de crise de asma.

Geraldo Filme de Souza foi precursor do samba paulista. Ele nasceu em 1927, em São Paulo, e morreu em 1995, sem nenhum reconhecimento maior.

Ele ajudou a organizar os cordões e blocos que mais tarde se transformariam nas escolas de samba da cidade. Foi o primeiro presidente da União das Escolas de Samba de São Paulo, diretor, conselheiro e compositor.

O salto em Helsinque

Adhemar Ferreira da Silva, atleta do salto triplo, conquistou dois ouros em Olimpíadas, em Helsinque-1952 e Melbourne-1956, e disputou quatro edições dos Jogos.

Suas duas medalhas de ouro estão simbolizadas nas duas estrelas douradas do símbolo do São Paulo Futebol Clube, do qual foi atleta. Ele também bateu o recorde mundial do salto triplo cinco vezes.

Adhemar nasceu em 1927 na Casa Verde, zona norte da capital paulista. Formou-se em artes, educação física, direito e relações públicas. Foi adido cultural do Brasil na Nigéria após abandonar a carreira esportiva e participou do filme “Orfeu Negro”, vencedor da Palma de Ouro em Cannes.

Madrinha Eunice durante entrevista ao Museu da Imagem do Som

Madrinha Eunice (Deolinda Madre) fundou uma das escolas de samba mais antigas de São Paulo, a Lavapés, no bairro do Glicério. Ela era uma mulher negra, pobre e filha de escravos, que vendia limões no centro da cidade.

Nos anos 1930, ela e o marido, Francisco Papa, eram figuras populares. Cantavam marchinhas no rádio nas semanas que antecediam o Carnaval. Madrinha Eunice e Chico Pinga, seus apelidos,– conheceram as escolas de samba do Rio em 1936. Ficaram tão deslumbrados que decidiram criar em São Paulo algo parecido. Em fevereiro de 1937, fundavam a Lavapés. Os primeiros desfiles foram no centro antigo.

Reprodução do site de Itamar Assumpção

Itamar Assumpção foi um compositor, cantor e instrumentista precursor do afrofuturismo no Brasil. Ele nasceu em Tietê, no interior paulista, em 1949, e foi um dos principais artistas de música independente no Brasil.

Depois de se mudar para o Paraná, entrou em contato com o teatro, os festivais universitários e as efervescentes discussões políticas que marcaram o período da ditadura militar. Em 1973, passou a morar em São Paulo, onde se dedicou à carreira musical.

Seu disco Beleléu Leléu Eu, gravado de maneira independente em 1980, conquistou a crítica musical da época com suas letras em um tom satírico.

Semana de Valorização do Patrimônio

A Semana do Patrimônio já tem marcados cinco encontros on-line com transmissão nos canais do YouTube do Departamento do Patrimônio Histórico (DPH) e nas páginas do Facebook da Secretaria Municipal de Cultura.

Palestrantes convidados e servidores do DPH discutem no evento a atuação de órgãos de preservação de patrimônio e memória tendo como gancho acontecimentos recentes na cidade, como incêndio na estátua do bandeirante Borba Gato — mas não só. Dinâmicas de preservação de edificações protegidas como patrimônio cultural, arqueologia urbana e a participação do cidadão nas dinâmicas de preservação do patrimônio cultural também são temas da Semana.

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