Bolsonaro sofre derrota com rejeição da PEC do voto impresso na Câmara

Proposta precisava de 308 votos no plenário, mas só alcançou 229. Decisão encerra tramitação da PEC e mantém formato atual de apuração.

A Câmara dos Deputados rejeitou e arquivou, nesta terça-feira (10), a proposta de emenda à Constituição (PEC) para o voto impresso em eleições, plebiscitos e referendos. Com a decisão da Câmara, o texto será arquivado, e o formato atual de votação e apuração fica mantido nas eleições de 2022. O tema também deixa de seguir para o Senado, o que ampliaria o discurso desestabilizador das eleições de Bolsonaro.

O resultado representa uma derrota para o presidente Jair Bolsonaro, quanto mais ele se desgastou com o tema sofrendo queixa crime, tornando-se réu em inquérito de fake news, além de atacar os demais poderes até com uma precária marcha militar.

Para ser aprovada, a PEC precisava de, no mínimo, 308 votos. No entanto, o texto elaborado pela deputada Bia Kicis (PSL-DF) teve o apoio de 229 deputados, o que representa 74% dos votos necessários. Outros 218 deputados votaram contra a PEC, e um parlamentar se absteve, o que também surpreendeu pela expectativa de uma maioria motivada pelo enorme desgaste dos últimos dias. Os 64 ausentes — entre os quais vários parlamentares de legendas governistas — contribuíram para a derrota de Bolsonaro.

“Eu queria, mais uma vez, agradecer ao plenário desta Casa pelo comportamento democrático de um problema que é tratado por muitos com muita particularidade e com muita segurança. A democracia do plenário desta Casa deu uma resposta a esse assunto e, na Câmara, eu espero que esse assunto esteja definitivamente enterrado”, disse o presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), torcendo para os ânimos se acalmarem, referindo-se ao modo como o presidente causou discórdia com outras autoridades da República.

O 1º vice-presidente da Câmara, deputado Marcelo Ramos (PL-AM), também afirmou que o debate do voto impresso precisa ser superado. “O brasileiro precisa de vacina, emprego e comida na mesa. A Câmara precisa virar esta página para tratar do que realmente importa para o País”, declarou.

Na última semana, os membros da comissão rejeitaram parecer favorável à PEC elaborado pelo deputado Filipe Barros (PSL-PR), da base de governo. Em seguida, aprovaram o relatório do deputado Raul Henry (MDB-PE) que recomenda o arquivamento do texto. Apesar disso, Lira decidiu pedir a opinião dos 513 deputados em plenário, considerando o modo como Bolsonaro tratou o tema como prioridade.

Debates

O clima do debate foi marcado pela tentativa dos deputados alinhados com o presidente em prolongar o assunto e marcar posição para o eleitorado bolsonarista. A oposição, por outro lado, não tinha porque manter o debate e dar espaço à argumentação do presidente e procurou acelerar a votação.

A argumentação girou em torno da suposta interferência do Judiciário no debate, assim como na suposta falta de transparência e segurança da apuração, que configuraria fraude eleitoral. Houve quem acusasse a oposição de politizar o assunto, numa inversão de sentidos.

Líder do PSDB, o deputado Carlos Sampaio (SP) admitiu já ter feito auditoria nas urnas eletrônicas, em 2014, quando o então candidato Aécio Neves (PSDB-MG) questionou a derrota por Dilma Rousseff. A auditoria, segundo o tucano, durou um ano com técnicos estrangeiros e brasileiros, além do TSE, desconstruindo o argumento de Bolsonaro de que as urnas não são auditáveis. “Ao final de 2015, lemos numa entrevista coletiva o resultado dessa auditoria. Havia alguma fraude? Não, nenhuma fraude foi constatada”, afirmou.

Para o líder da oposição, deputado Alessandro Molon (PSB-RJ), a votação passa um recado ao governo federal. “Dizemos não às intimidações, não à desestabilização das eleições, não à tentativa de golpe de Bolsonaro. Queremos no ano que vem eleições limpas, seguras, tranquilas e pacíficas, como o sistema atual garante”, disse Molon.

Durante a votação, alguns deputados que participavam remotamente da sessão reclamaram ao presidente Arthur Lira que não estavam conseguindo registrar o voto pelo celular — casos de Alexandre Padilha (PT-SP) e Gonzaga Patriota (PSB-PE), por exemplo. Ambos se posicionam contra o voto impresso, mas aparecem no registro da Câmara como “ausente”.

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