BC ameaça acelerar alta de juros, como única medida anti-inflacionária

Enquanto bancos celebram lucros astronômicos, em meio à pandemia, setor produtivo, comercial e consumidor mergulham em recessão, sem que isso afete a inflação.

Ameaça de aumento sistemático de juros favorece banqueiros e especuladores e prejudica todo o resto Edi;áo de imagem por Cezar Xavier

Depois de elevar os juros básicos da economia em 1 ponto percentual na semana passada, o Banco Central (BC) poderá apertar ainda mais o cinto da política monetária caso a inflação resista a cair, disse hoje (10) o diretor de Política Monetária da instituição, Bruno Serra. Em videoconferência com investidores, ele disse que o órgão fará o necessário para trazer a inflação de volta para a meta em 2022 e 2023, embora sua única ferramenta considerada seja a taxa Selic.

A alta de juros é uma política recessiva, pois reduz a capacidade de investimento, compras e gastos das empresas e consumidores, estagnando a economia e a produção para que a inflação seja controlada pela falta de demanda. Essa política, no entanto, é altamente benéfica para os bancos e para investidores que deixam de aplicar na economia produtiva para depositar todo seu recurso na especulação financeira. A alta de juros também agrava o endividamento da União e das empresas, que passam a pagar mais pelos serviços da dívida.

“Quando se está disposto a fazer o que for necessário, não existe restrição. O Banco Central sempre pode ajustar os seus passos se o cenário mudar, mas parece que esse nível de ajuste tempestivo é bastante adequado no momento”, declarou, ignorando os protestos de economistas heterodoxos, sindicalistas, empresários do setor produtivo e do comércio que são atingidos pelo crédito mais caro.

Como se não bastasse, o diretor da área do Banco Central que monitora a inflação e define a política de juros indicou que pode fazer elevações superiores a 1 ponto dependendo do comportamento dos preços. Durante todo o período recente, quando havia aumentos, geravam em torno de 0,25 ponto.

Segundo o último boletim Focus, pesquisa semanal com analistas de mercado divulgada pelo BC, as instituições financeiras preveem que a inflação oficial pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) encerrará 2021 em 6,88%, acima do teto da meta para este ano.

O Conselho Monetário Nacional (CMN) estipulou meta de 3,75% para o IPCA em 2021, com 1,5 ponto percentual de tolerância, o que faz a inflação ficar numa faixa entre 2,25% e 5,25%. Para 2022 e 2023, a meta está em 3,25% e 3%, respectivamente, também com 1,5 ponto de tolerância.

A ata da última reunião do Copom, divulgada hoje, informou que o BC elevará os juros em 1 ponto percentual no próximo encontro, no fim de setembro, e continuará a subir a taxa básica até que a Selic fique acima do nível considerado neutro. Desde 2018, a taxa está abaixo do nível neutro, para estimular a economia.

Pressões internas

Ausente na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) na semana passada por estar com covid-19, Serra declarou que, em relação aos juros, o BC atualmente está mais preocupado com o cenário interno do que com a economia internacional. Apesar de reconhecer as preocupações com a evolução dos casos de covid-19 ligados à variante Delta, o diretor disse que considera atualmente mais importante fatores ligados à economia brasileira.

O primeiro fator consiste no fechamento do hiato (redução da capacidade ociosa da economia) mais rápido que o esperado, decorrente do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB, soma das riquezas produzidas), que deve ultrapassar 5% neste ano. O segundo fator são as pressões sobre a inflação ligadas à retomada do setor de serviços. O terceiro são os choques de preços nos alimentos, nos combustíveis e na energia elétrica.

Todas essas pressões podem ser aliviadas por políticas econômicas que podem ir muito além de ajustes fiscais. Uma população que tem reduzido intensamente sua capacidade de consumo, devido à recessão da pandemia, é forçada a reduzir ainda mais com a dificuldade de obtenção de crédito.

A inflação de alimentos pode ser combatida com políticas de segurança alimentar que foram desmontadas no primeiro dia do governo Bolsonaro. Não há qualquer controle sobre a exportação de alimentos, desabastecendo o mercado interno. Desde o golpe de 2016, por outro lado, a política de preços da Petrobras e sua cadeia produtiva de combustíveis foram totalmente alteradas para beneficiar acionistas estrangeiros. A falta de investimento em produção de energia também agrava o cenário, conforme se enfrenta períodos de seca cada vez mais prolongados.

Em relação ao setor elétrico, o diretor de Política Monetária disse que o BC tem apresentado, em seus cenários de inflação, as projeções da bandeira tarifária em 2021 e 2022. Ao ter menos oferta de energia, o consumidor ainda é punido com sobretaxação, que aumenta o lucro das empresas de energia elétrica.

Sobre o impacto da proposta de emenda à Constituição (PEC) que parcela os precatórios e propõe despesas novas fora do teto de gastos, o diretor do BC disse que o assunto entrou no cenário de risco para as contas públicas traçadas pela instituição financeira, mas que ainda não há uma avaliação específica. A ata de hoje do Copom destacou que o risco fiscal foi “fator preponderante” para o BC acelerar a alta da Selic para 1 ponto percentual.

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