Sem citar nome, empresário culpa Bolsonaro na CPI pela falta de vacina

Airton Cascavel, que atuou como número 2 na gestão de Pazuello, referiu-se ao acordo com o Instituto Butatan para fornecer 46 milhões de vacinas ao governo Bolsonaro

Airton Cascavel durante depoimento na CPI (Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado)

O empresário Airton Cascavel, que atuou de forma irregular (sem nomeação) no Ministério da Saúde como uma espécie de número 2 na gestão de Eduardo Pazuello, deixou claro que Bolsonaro prejudicou um acordo entre a pasta e o Instituto Butantan, de São Paulo, para o fornecimento de 46 milhões de doses da Coranavac, que poderiam viabilizar a vacinação dos brasileiros em dezembro do ano passado.

De acordo ele, sem citar o nome do presidente, o pacto seria assinado entre o ministério e os governadores em 20 de outubro de 2020, mas em função da “politização” as negociações não foram concretizadas. Inicialmente, ele disse que a politização vinha dos dois lados, porém, ao ser confrontado com as posições de Bolsonaro contra a vacina, declarou que “não poderia falar o nome.”

Nomeado como assessor especial para fazer a intermediação política da pasta, Cascavel disse que contou com o apoio do ex-prefeito de Salvador Antonio Imbassahy para reconstruir e pacificar a relação do governo Bolsonaro com os governadores.

“Fui mandado para São Paulo na função de interlocutor. Nos reunimos numa relação com a equipe do ministério, da vigilância sanitária, o setor jurídico, para tratar dessa aproximação necessária, porque era necessário. Naquele momento, nós precisávamos de vacina, e o Butantan tinha 6 milhões de vacinas. Construir esse diálogo, retornar esse diálogo, para que isso viesse a acontecer”, explicou.

Dirigindo-se ao relator Renan Calheiros (MDB-AL), o empresário lembrou que numa reunião com 13 governadores na fábrica União Química, em Brasília, ele fez um apelo ao parlamentar: “Senador Renan, despolitizem a questão da vacina. Vamos todo mundo trabalhar em busca da vacina, vamos nos unir neste momento. As pessoas estão morrendo neste país. Vamos trabalhar todo mundo para buscar vacina onde tiver”, lembrou.

“Mas é um apelo dirigido a quem? Quem é que não queria comprar vacina? Quem era que estava insistindo que as vacinas não tinham eficácia? Eu estou perguntando”, reagiu o relator. “Não posso afirmar”, respondeu Cascavel.

“Um manda e outro obedece”

O fato já era conhecido pela CPI, mas pela primeira vez um integrante da equipe do ministério resolveu admitir a interferência do presidente no processo, que um dia depois do anuncio do acordo disse que não iria comprar a vacina do João Doria, o governador de São Paulo.

“Já mandei cancelar o protocolo de compras da Coronavac, o presidente sou eu”, disse Bolsonaro na ocasião. Logo depois, numa live com o presidente, Pazuello esclareceu: “Um manda e outro obedece.”

Em depoimento à CPI, o presidente do Butantan, Dimas Covas, lembrou que a primeira proposta ao governo brasileiro era de 60 milhões de doses com entrega prevista em dezembro do ano passado e mais 100 milhões de doses até maio deste ano.

“Tínhamos 5,5 milhões de doses da Coronavac prontas e 4 milhões em processamento em dezembro. O Brasil poderia ter sido o primeiro país do mundo a começar a vacinação contra a Covid-19 não fossem os percalços enfrentados”, disse ele, que entregou à CPI todos os documentos sobre as tratativas com o governo.

Vacina

O empresário também disse aos senadores que não participou de negociações sobre compra de vacinas, pois essa era uma competência exclusiva da secretaria-executiva. O foco dele era voltado ao atendimento de políticos que tentavam defender necessidades de suas cidades e estados.

Os senadores perguntaram sobre as denúncias de corrupção que pesam contra ele e se isso não teria provocado resistência para sua nomeação, Cascavel afirmou que responde a processos na Justiça Eleitoral, mas houve “um chamamento maior” e que a ala militar não teria “traquejo político” para a função.

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