Volta às aulas põe em teste a contenção da pandemia no Brasil

Velocidade da reabertura deve repetir o padrão da pandemia e ser marcada por desigualdade entre as regiões

Pela primeira vez desde o início da pandemia de Covid-19, todos os estados brasileiros vão abrir suas escolas para a volta às aulas presenciais. O segundo semestre escolar começa simbolicamente nesta segunda-feira (2) com a promessa de marcar o primeiro movimento consistente de reabertura parcial dos colégios em todo o País, num teste para a contenção da crise sanitária.

A velocidade da reabertura, porém, deve repetir o padrão da pandemia e ser marcada por desigualdade entre as regiões. Até hoje, 11 redes estaduais já adotavam o esquema híbrido, com aulas a distância e presenciais, sendo quatro delas só a partir de julho. Agora, mais 16 estados começarão a receber parte dos estudantes alguns dias por semana, de acordo com levantamento do Vozes da Educação.

Depois de quase um ano e meio de escolas fechadas, o diagnóstico de que já é possível retomar as aulas presenciais se baseia em dois pontos: o avanço da vacinação e a estabilização da pandemia, ainda que em patamares elevados. Porém, conforme pondera João Marcelo Borges, pesquisador do centro de desenvolvimento da gestão pública e políticas educacionais (FGV DGPE), “não estamos voltando para a situação de antes”.

“Estamos reabrindo as escolas com a pandemia em marcha, o que inclui várias incertezas e acúmulo de problemas dos últimos meses”, diz Borges. “Para transformar esse passo em caminhada, vai ser preciso ser transparente e aprender com erros.”

A expectativa é que os estados que já largaram na frente tenham vantagem para aumentar a presença nos bancos escolares. Mas o sucesso de uma reabertura mais ampla vai depender dos aprendizados acumulados em cada rede com a crise sanitária. A presença dos alunos não é obrigatória e, em geral, cada cidade ou escola ainda pode optar por permanecer fechada por ora.

Nos municípios, a diferença de maturidade para a reabertura também é elevada. Pesquisa da Confederação Nacional de Municípios (CNM) realizada entre 19 e 22 de julho indica que 17,7% das redes municipais ainda não tinham previsão de ter aulas presenciais. Em 29,5%, as aulas já começaram e em 38,5% a previsão é ter aulas presenciais em agosto.

Outro levantamento do mês passado, da União dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), indicava que 40,4% dos municípios ainda não tinham protocolo de segurança sanitária. Para piorar, nos Estados e municípios, dados orçamentários reunidos pelo Tesouro têm apontado redução dos gastos com educação em 2020 e 2021.

Para Gregório Grisa, doutor em Educação e professor do Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS), mais do que criar regras como uso de máscaras e distanciamento social, é preciso ter verba para cumpri-las: “A área de educação foi vista como grande oportunidade de poupar recursos durante a pandemia, uma vez que não havia aulas presenciais. Boa parte dos municípios terão de refazer contratos, como os de transporte escolar”.

O enfrentamento às dificuldades que podem surgir, ele pontua, deve carregar algum grau de improviso. “É o momento de tentar essa janela para retomar as atividades presenciais, mas a tendência é que o retorno reflita a falta de planejamento e de investimentos observados na pandemia como um todo”, acrescenta.

O que não se sabe ainda é se haverá por aqui uma disseminação acelerada da variante Delta do novo coronavírus, o que pode novamente interromper a retomada. Estudos divulgados nos Estados Unidos indicam que, embora tenham menos probabilidade de contrair a nova variante, as pessoas vacinadas têm a mesma capacidade de transmitir o vírus do que as não vacinadas.

“Não há evidências de que houve um aumento de contaminações por Covid-19 nos Estados que já reabriram as escolas. Mas essas experiências ocorreram durante meses de retrocesso da doença”, afirma Grisa. Estados como São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo já permitem 100% dos alunos no esquema presencial. Mas, na prática, isso só é viável por meio de rodízio.

Nas escolas paulistas, um dos critérios é o distanciamento mínimo de um metro entre os alunos, o que não é possível em todas as instituições de ensino por causa da estrutura física. Na rede capixaba, a liberação total foi autorizada em 26 de julho, mas ainda em esquema intercalado. A diferença é que o rodízio passou de semanal para diário.

Com informações do Valor Econômico