Andréa Oliveira: Quero ser um alto elogio

.

Antes tinha pavor da morte, ao mesmo tempo em que todos diziam, é a única certeza que temos, sempre a achei antinatural. Há muito tempo, eu ainda entrando na adolescência, li um livro em que num tal planeta, acho que chamado Fargo, as pessoas escolhiam quando queriam dormir para sempre. Nele, a turista pergunta, como então alguém vai escolher isso? E responderam a ela. Quando você é criança sua mãe diz, tá na hora de ir dormir, mas você quer ficar acordada, brincando. Adulta, cansada do dia de trabalho e afazeres deita e dorme com tal enorme prazer, um dos maiores. Desde que li isso já tanto tempo acho que a morte ideal seria essa. Você fica aqui o tempo que quiser, até chegar o dia em que diz aos amigos e amores, agora vou dormir para sempre. Adorei tudo, me diverti, amei e agora só quero repousar. Acho a morte absurda, principalmente se for trágica. Acho um diagnóstico de morte algo inconcebível. O médico, coitado, dizer: você tem três meses de vida.

Brecht dizia, não me digam que isso é natural, diante dos acontecimentos do dia. Digo isso sobre morrer. Não me digam isso é natural. Mas ela existe e eu, mesmo quase irracionalmente querendo nega-la, não posso. Existem as leis do universo? Morrer é uma das certezas dela. Sinto vontade de me tacar no chão qual criança na loja de brinquedos. Revoltada. Morrer é ruim demais. Dói muito. Morrer é o amor que chora. Ai, como dói o amor que chora. Tentando nos acalmar Cecília Meireles escreveu sobre morrer: “que bom, nem é preciso respirar”

Mas, como dizia, impossível negar a morte. Fato. Agora façamos um trato. Banaliza-la, aí já é demais. Que cada morto tenha o direito a sua célebre frase: era uma boa pessoa. Porque nessa vida, o que levamos de mais alto elogio é esse. Sermos boas pessoas.

Andréa Oliveira – Jornalista, secretária estadual de Cultura do Partido Comunista do Brasil – PCdoB.