Anvisa apresenta documentos comprovando risco da vacina Sputnik V

Diante de questionamentos, agência sanitária exibe “prints” de documentos do Instituto Gamaleya, assim como trechos de áudio dos russos confirmando informações que levaram à negativa da compra da vacina.

Imagem de documento destacada em pronunciamento da Anvisa confirmaria informação que levou à negativa de importação da vacina russa.

O presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Antônio Barra Torres, fez um pronunciamento hoje (24) por meio das redes sociais do órgão questionando críticas feitas pelos laboratórios e instituições responsáveis pelo desenvolvimento da vacina Sputnik V. O impasse estava em que a decisão havia sido tomada baseada em documentos do próprio fabricante, que foram apresentados durante o pronunciamento. Houve ainda a apresentação de partes de áudio de reunião em que os russos, supostamente, teriam confirmado a presença do adenovírus replicante.

O pedido de importação de 66 milhões de doses do imunizante foi negado na segunda-feira (26). A Anvisa apontou uma série de problemas, entre eles, a presença ou não de adenovírus com capacidade de replicação no corpo dos pacientes que receberem doses da vacina. Segundo os cientistas, deveria haver zero presença dessa característica, mas há 300 vezes mais do que isso.

Hoje pela manhã, a conta oficial dos responsáveis pela vacina no Twitter comunicou a intenção de judicializar a análise feita pela agência brasileira. “Após a admissão do regulador brasileiro Anvisa de que não testou a vacina Sputnik V, a Sputnik V está iniciando um processo judicial de difamação no Brasil contra a Anvisa por espalhar informações falsas e imprecisas intencionalmente”, diz a mensagem.

Havia o questionamento russo de que a Anvisa não testou a vacina para encontrar adenovírus replicante, portanto, estaria sendo leviana. A agência brasileira, no entanto, baseia sua análise e decisão em documentos dos próprios fabricantes. A princípio se falou que os documentos não podiam ser expostos, mas, na entrevista coletiva, foram exibidos trechos dos documentos. Com isso, agora se aguarda resposta do RDIF (fundo russo de investimento direto), responsável pela produção da vacina.

No pronunciamento, a Anvisa buscou rebater o argumento da Sputnik V e reforçar a análise realizada por sua equipe técnica, bem como a decisão de negativa da importação. O presidente da agência e o gerente-geral de Medicamentos do órgão, Gustavo Mendes, disseram que a informação da presença de adenovírus com capacidade de replicação foi admitida nos documentos entregues pelo laboratório.

“A Anvisa foi acusada de mentir, de atuar de maneira antiética e de produzir fake news sobre a identificação do adenovírus replicante em documentos que tratam da vacina Sputnik V. As informações sobre a presença de adenovírus replicantes constam dos documentos entregues à Anvisa pelo desenvolvedor da vacina Sputnik V”, disse Barra Torres.

Equipe experiente

Gustavo Mendes defendeu a equipe responsável pela análise de vacinas, que, segundo ele, tem experiência no assunto. O gerente-geral argumentou que o exame das propostas é orientado sobretudo pela avaliação acerca da segurança da vacina. Na análise, a equipe teria encontrado nos documentos, e durante testes, sinais da presença de adenovírus com possibilidade de replicação.

“A sequência da avaliação começa quando a empresa atesta que o processo de fabricação das partículas RAD5SCov2, uma das partículas importantes neste caso, pode produzir partículas replicantes, aquelas que vão se espalhar pelo corpo, o que não é esperado de uma vacina. A vacina é composta de dois tipos de adenovírus. Para um é apresentada justificativa para não replicação, para outro não”, disse Mendes.

Reunião com Instituto Gamaleya

O gerente-geral acrescentou que a detecção de adenovírus replicante ocorreu no produto acabado, e não em fases intermediárias da fabricação. O índice de presença teria sido 300 vezes superior ao maior limite permitido por uma autoridade sanitária, no caso a dos Estados Unidos (FDA, na sigla em inglês).

Mendes relatou que no dia 23 de abril foi realizada uma reunião entre a equipe técnica da Anvisa e do Instituto Gamaleya, responsável pelo desenvolvimento da vacina Sputnik V. No pronunciamento, foi exibido áudio em que os técnicos da Anvisa questionam o ponto do adenovírus replicante e por que não houve correção da questão. O áudio pode ser ouvido a partir de 11 minutos do vídeo abaixo.

O vídeo mostra o que seria a voz de representantes do instituto russo admitindo que o ajuste levaria muito tempo. No diálogo registrado, os representantes da Sputnik V se colocam à disposição para responder a questionamentos dos técnicos da Anvisa. Segundo Gustavo Mendes, a agência enviou por escrito as dúvidas, mas as respostas recebidas do Instituto Gamaleya não teriam contemplado os questionamentos.

Equipe da Sputnik V

Em sua conta no Twitter, a equipe responsável pela vacina Sputnik V interpretou o pronunciamento como uma admissão de não ter encontrado presença de adenovírus replicante no imunizante, mas que estava preocupada com o limite regulatório teórico russo para esse parâmetro.

Em entrevista coletiva a jornalistas após o pronunciamento, o diretor-presidente da Anvisa rebateu as mensagens da Sputnik V. “Não há interpretação. Está escrito e foi falado no vídeo apresentado. Não, eles apresentam documentos [sobre o] que seria o valor máximo aceitável, que é entendimento que conflita com o FDA e o que foi encontrado nas amostras, e o que foi encontrado é superior ao valor zero”, disse Barra Torres. Ele acrescentou que, se não houver mudanças na vacina, não há como autorizar seu uso no Brasil.

União Química

A União Química, empresa brasileira que firmou parceria para produção da Sputnik V, divulgou carta enviada ao presidente da Anvisa ontem (28). No documento, a farmacêutica questiona que doses da vacina foram analisadas e coloca que nenhuma vacina Sputnik V foi oficialmente fornecida à Anvisa nem por ela e nem pelo parceiro russo.

Na carta, a União Química alega que o Instituto Gamaleya negou ter encontrado qualquer presença de adenovírus replicante em qualquer lote do imunizante. A companhia considera que as afirmações da Anvisa sobre a presença de adenovírus replicante são falsas e reitera a informação de que uma subsidiária do Fundo de Investimento Direto Russo (outra instituição participante no consórcio de produção da vacina) vai entrar com processo judicial.

Sobre o assunto, Barra Torres declarou na entrevista coletiva que a agência não se utiliza de laboratório. “Houve circulação na mídia de que a Anvisa teria analisado em seus laboratórios vacina falsificada. A análise é feita em cima de documentos enviados pelo desenvolvedor. Há várias questões para além do adenovírus”, pontuou o diretor-presidente.

Repercussão

A não aprovação do imunizante pela agência sanitária brasileira causou polêmica pelo mundo, conforme outras 60 agências já tenham aprovado e importado o produto. O fabricante destacou, há pouco, reação do governo mexicano, que tratou o caso como propaganda contra a Sputnik V.

“O México não caiu no jogo de propaganda contra o Sputnik V”, disse o secretário de Relações Exteriores do México, Marcelo Ebrard, durante uma visita à Rússia. “A evidência que temos do que o Departamento de Saúde me disse antes desta viagem é que os milhões de doses administradas no México têm resultados muito bons.” Além de Sputnik V, AstraZeneca e CanSino, o México vem usando as vacinas Pfizer e Sinovac.

A União Européia, por meio do Ministério das Relações Exteriores do bloco de 27 nações, disse que parte da campanha de marketing do governo russo em favor da Sputnik V é para semear a desconfiança na Agência Europeia de Medicamentos, que também não aprovou a compra da vacina russa.

Assista na íntegra:

Com informações da Agência Brasil

Autor