Médico francês admite que cloroquina não reduz óbitos e internações

Didier Raoult, defensor do medicamento no tratamento da Covid, afirmou pela primeira vez que remédio não evita óbitos ou internações. Bolsonaro ainda insiste em “tratamento precoce”.

O médico francês Didier Raoult | Foto: Christophe Simon/AFP

O microbiologista francês Didier Raoult, que anunciou a hidroxicloroquina como possível tratamento de Covid-19 em um estudo publicado no ano passado, admitiu que o medicamento não reduz mortalidade ou agravamento da doença. Em carta assinada por toda sua equipe no Centro Nacional de Informações sobre Biotecnologia, da França, Raoult finalmente confirmou a ineficácia da substância na redução de óbitos e internações.

“As necessidades de oxigenoterapia, a transferência para UTI e o óbito não diferiram significativamente entre os pacientes que receberam hidroxicloroquina com ou sem azitromicina e os controles feitos apenas com tratamento padrão”, escreveu Raoult em nota, de acordo com o jornal Le Figaro.

O estudo de março de 2020 que alçou a hidroxicloroquina ao centro do debate foi realizado com apenas 42 pessoas, no qual Raoult defendeu que a substância deveria ser aplicada junto com azitromicina no início dos sintomas para evitar o agravamento da doença.

O estudo não foi bem aceito pela comunidade científica e Organização Mundial da Saúde (OMS), que alegaram que estava fora dos protocolos exigidos.

O pesquisador ainda defende que a hidroxicloroquina pode ser útil no combate à Covid-19. Na carta, Raoult afirma que o tempo de internação de pacientes que foram tratados com hidroxicloroquina e azitromicina foi menor.

“Também calculamos o tempo de internação, que pareceu ser significativamente menor em pacientes tratados apenas com hidroxicloroquina ou com hidroxicloroquina e azitromicina, do que nos controles”, escreveu Raoult.

Outros estudos já indicaram que não há melhora no quadro de saúde na adoção desses medicamentos. Um ensaio clínico da Universidade de Oxford, na Inglaterra, concluiu que a hidroxicloroquina “não tem nenhum efeito benéfico” no combate à doença e outro estudo, feito pelo Angers University Hospital em uma amostra de 250 pacientes, chegou a mesma conclusão.

Bolsonaro e ministério da Saúde

No Brasil, o governo comprou a teoria de Didier Raoult e insiste em um “tratamento precoce” contra a Covid-19. Sem apresentar nenhum estudo, o ministério da Saúde recomenda o uso das substâncias e chegou a distribuir o remédio nos postos de saúde em Amazonas, como uma medida de prevenção à crise que se instaurou.

Recentemente, o ministério lançou um aplicativo para incentivar o uso dos medicamentos. No Twitter, o post orientando a população a procurar “tratamento precoce” foi taxado como “informações enganosas e potencialmente prejudiciais relacionadas à COVID-19.”

O presidente Jair Bolsonaro foi um dos principais apoiadores do medicamento. Em junho do ano passado, o Brasil recebeu cerca de 2 milhões de doses dos EUA e os militares foram instruídos a produzir mais de três milhões de comprimidos.

Mesmo que tenha admitido recentemente que a hidroxicloroquina não tenha efeito comprovado no combate à Covid-19, Bolsonaro afirma que não há nenhum efeito colateral, e por isso, pode ser tomada sem nenhum prejuízo.

Presidente Jair Bolsonaro mostra uma caixa do remédio Hidroxicloroquina – Carolina Antunes/PR

É verdade que a cloroquina e a hidroxicloroquina são medicamentos utilizados há anos para o tratamento da malária e doenças autoimunes. Mas, segundo a nota da Sociedade Brasileira de Arritmias Cardíacas (Sobrac), o remédio pode ocasionar alterações cardíacas. “A cloroquina tanto pode ter efeito antiarrítmico quanto provocar o surgimento de arritmias graves.” A bula do remédio também recomenda cautela com pacientes com doenças hepáticas ou renais e com problemas cardíacos, gastrointestinais e neurológicos.

A Agencia Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), ao aprovar o uso emergencial da vacina no domingo (17), afirmou que não há tratamentos efetivos contra a Covid. Além da Anvisa, a Sociedade Brasileira de Infectologia “não recomenda tratamento precoce para COVID-19 com qualquer medicamento”.

Foto: Reprodução/Twitter

Órgãos internacionais também reprovam o uso da hidroxicloroquina e outras substâncias, entre elas a Sociedade de Infectologia dos EUA (IDSA) e da Europa (ESCMID), Instituto Nacional de Saúde dos EUA (NIH) Centos Norte-Americanos de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) e Organização Mundial da Saúde (OMS).

Mesmo assim, Bolsonaro insiste no “tratamento precoce”. Em um vídeo compartilhado via o aplicativo telegram por seu filho e vereador do Rio de Janeiro, Carlos Bolsonaro (Republicanos), o presidente Jair Bolsonaro defende novamente os medicamentos no início dos sintomas.

“Não desistam do tratamento precoce. Não desistam, tá? A vacina é para quem não pegou ainda. E esta vacina que está aí é 50% de eficácia. Ou seja, se jogar uma moedinha para cima, é 50% de eficácia. Então, está liberada a aplicação no Brasil”, afirmou.

Em outra passagem, Bolsonaro defendeu que a CoronaVac é uma vacina do Brasil, mas questionou a segurança do imunizante. “No que depender de mim, não será obrigatória. É uma vacina emergencial, 50% de eficácia. É algo que ninguém sabe ainda se teremos efeitos colaterais ou não”.

Com informações de Época, Folha de S.Paulo e Piauí

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