Desemprego durante a pandemia afeta trabalhador doméstico sem carteira

Trabalhadores informais domésticos e do setor privado foram maioria entre os que deixaram de trabalhar entre o primeiro e segundo trimestres de 2020.

Mais trabalhadores domésticos perderam ocupações - Foto: Filipe Castilhos/Sul21

O desemprego na pandemia afetou principalmente as ocupações mais precarizadas, indica o boletim Emprego em Pauta do mês de outubro, divulgado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Segundo o relatório, 13% dos trabalhadores ocupados no primeiro trimestre de 2020 parou de trabalhar no segundo, o equivalente a 11,9 milhões de pessoas.

Entre os que ficaram sem trabalho, 31% eram trabalhadores domésticos sem carteira assinada, enquanto 23% eram empregados no setor privado também sem carteira. Entre os trabalhadores domésticos formalizados, a proporção dos que deixaram de trabalhar foi bem menor, de 10%. Entre empregados do setor privado com carteira o percentual também foi inferior, de 8%.

A renda também foi um fator de influência. Entre os que deixaram de trabalhar, 23% ganhava até um salário mínimo e 9%, de um a três salários mínimos. Somente 3% ganhavam mais de cinco salários mínimos. O boletim faz uma análise de dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Segundo Gustavo Monteiro, economista do Dieese, os dados refletem a vulnerabilidade dos trabalhadores precarizados, que, durante uma crise, são os primeiros a serem desligados. “É mais fácil desligar quem está menos protegido. Além disso, há outras questões, como o tipo de ocupação que a pessoa tem. Se ela tem estudos, se é melhor remunerada, tem mais garantias”, ressalta.

Entre os trabalhadores por conta própria, o percentual de pessoas que ficaram sem ocupação no segundo trimestre em relação ao primeiro também foi elevado: 18%. O dado refere-se aos meses de pico da pandemia – abril, maio, junho – quando a maior parte das atividades foi suspensa, incluindo algumas típicas de autônomos, como manicure, comércio de rua, prestadores de serviços.

O boletim do Dieese destaca ainda que mais mulheres perderam a ocupação do que homens. Entre os que deixaram de trabalhar no segundo trimestre, 15% eram mulheres e 11% eram homens.. Segundo Gustavo Monteiro, a situação de grupos como o das mulheres é a mais difícil porque, assim como foram mais penalizados durante a pandemia, enfrentarão mais dificuldades para voltar.

“As mulheres perderam mais trabalho e vão ter mais dificuldade de voltar ao mercado por vários motivos. Às vezes, estão cuidando de gente doente, não têm com quem deixar os filhos, mudou a dinâmica da família [durante a pandemia]”, exemplifica. O economista ressalta ainda que trabalhador doméstico sem carteira foi a ocupação em que trabalhadores mais perderam suas vagas.

É um tipo de serviço prestado principalmente por mulheres e nem todos os postos serão reabertos. “São principalmente as diaristas. Elas vão voltar, mas vai ter muita gente que não vai mais contratar. Primeiro porque a pandemia não acabou, algumas pessoas ainda têm receio. Depois, porque gente que perdeu dinheiro, perdeu renda. As pessoas ainda estão se adaptando e talvez percebam que é melhor não contratar uma trabalhadora doméstica”, explica.

O boletim indicou também que a proporção de trabalhadores negros que perdeu ou saiu do trabalho entre o começo do ano e o período da pandemia foi maior do que a dos não negros. Cerca de 15% dos ocupados negros no início do ano estavam sem trabalho no segundo trimestre, diante de 10% dos não negros.

Por fim, os maiores percentuais de perda ou afastamento do mercado ficaram entre as parcelas da população com menor escolaridade: 22% entre quem tem menos instrução e até um ano de estudo e 18% para quem tem fundamental incompleto ou equivalente. A perda de ocupação atingiu menos quem tem curso superior completo: 6% deixaram de trabalhar com a pandemia.

Na avaliação de Gustavo Monteiro, o cenário preocupa, principalmente porque não há um plano para a reinserção dessas pessoas no mercado de trabalho. “A retomada econômica é muito incerta, na verdade, e a incerteza por si só dificulta. É uma profecia autorrealizável, há muita confusão e ninguém sabe direito o que vai acontecer”, afirma.

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