Interrupção de vacina da JnJ questiona vetores de adenovírus humano

Johnson and Johnson interrompe o ensaio da vacina para Covid-19 após doença inexplicada. Russos argumentam que adenovírus humanos de sua Sputnik V são mais seguros que outras vacinas.

Vacina desenvolvida em Cuba - Foto: Ismael Francisco/Cubadebate.

O ensaio da vacina para Covid-19 da Johnson & Johnson foi interrompido após uma doença inexplicada em um voluntário. Dois dos seis testes de vacinas no Brasil estão agora suspensos. Diferente da vacina da Astrazeneca, em parceria com a Universidade de Oxford, que tem plataforma baseada em adenovírus do chimpanzé e também teve testes interrompidos, esta foi baseada em adenovírus humano.

A Sputnik V, desenvolvida pelo Instituto Gamaleya da Rússia, e a vacina do laboratório Cansino desenvolvida na China também têm plataforma baseada em adenovirus humano. Enquanto a vacina russa utiliza os adenovirus Ad5 e Ad26, a vacina da J&J usa apenas o adenovírus Ad26 e a vacina da Cansino usa o Ad5. Os russos alegam que a utilização dos dois espectros mais distantes da mutação do adenovírus permite uma imunidade por mais tempo, enquanto as outras duas, podem ter imunidade menor.

Outro argumento do RDIF, o fundo russo que financia a Sputnik V, é que os adenovírus humanos são mais seguros e testados há 30 anos, sem efeitos colaterais graves ou carcinogenia. O representante do RDIF, Kirill Dmitriev, tem reiterado repetidamente que as vacinas baseadas em adenovírus de chimpanzé e mRNA são experimentais e não têm garantia de efeitos nocivos no longo prazo. Até o momento, o representantes da vacina russa não se manifestaram sobre o assunto.

Doença inexplicada

O ensaio clínico de Fase 3 foi temporariamente interrompido na segunda-feira, de acordo com a empresa. Não se sabe se a doença não identificada está relacionada à vacina, mas os protocolos clínicos exigem uma pausa enquanto ela é investigada.

A vacina JNJ-78436735 da Johnson & Johnson é um dos ensaios de vacina da Covid-19 em grande escala em estágio final em andamento em vários países. Outro ensaio, executado pela AstraZeneca, foi interrompido em 8 de setembro depois que um segundo participante foi diagnosticado com uma condição neurológica.

A Johnson & Johnson disse na segunda-feira que interrompeu a dosagem adicional em seu ensaio enquanto a doença do participante é analisada e avaliada por um Conselho de Monitoramento de Segurança de Dados independente, bem como pelos médicos clínicos e de segurança da empresa.

Em qualquer estudo do tamanho do da Johnson & Johnson, que incluirá até 60.000 pessoas quando estiver totalmente inscrito, alguns eventos adversos são esperados entre os participantes. Esses estudos têm diretrizes claras e pré-especificadas que dizem quais eventos desencadeariam um desligamento.

O Comitê de Monitoramento de Segurança de Dados independente, que supervisiona o teste, revisará o que aconteceu e decidirá se é seguro retomar o teste.

Confidencialidade

A Johnson & Johnson não informou qual era a doença nem onde o participante morava.

“Devemos respeitar a privacidade desse participante. Também estamos aprendendo mais sobre a doença desse participante e é importante ter todos os fatos antes de compartilhar informações adicionais”, disse a empresa. Os participantes começaram a se inscrever no teste em 23 de setembro.

A vacina foi desenvolvida pela Janssen Research & Development, uma subsidiária da Johnson & Johnson. É vetorizada por um vírus inofensivo chamado Adenovírus 26, um vírus humano incomum na natureza, então a maioria das pessoas não desenvolveu imunidade a ele.

O julgamento do AstraZeneca com 30.000 pessoas está em espera desde 8 de setembro, cerca de uma semana após o lançamento. Um participante de um estudo semelhante da AstraZeneca no Reino Unido desenvolveu uma condição neurológica grave que pode ter sido causada pela vacina, então a AstraZeneca suspendeu todos os seus testes da vacina COVID-19 em todo o mundo enquanto o caso podia ser investigado.

Vacinas em testes de Fase 3

Vetor Adenovirus de macaco

AstraZeneca/Oxford (Reino Unido)

A vacina contra a COVID-19 desenvolvida pela Universidade de Oxford, no Reino Unido, em parceria com a farmacêutica AstraZeneca, utiliza a plataforma vetor-viral não replicante. Para isso, é usado um adenovírus, encontrado em chipanzés, conhecido por chamado ChAdOx1. Esse adenovírus é editado geneticamente e tem incluído, em seu material genético, a proteína spike do novo coronavírus.

Na fase 3, os testes com duas doses acontecem também no Brasil com 10 mil pessoas, coordenados pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Recentemente, o estudo clínico foi pausado brevemente para investigar um suposto efeito adverso grave, mas já foi retomado no Reino Unido, embora não nos EUA.

Vetor Adenovírus humano

Sinovac (China)

A empresa chinesa Sinovac desenvolve o seu imunizante, conhecido como Coronavac, a partir de fragmentos do coronavírus inativados (quando o vírus está “morto”) com duas doses do imunizante. Atualmente, a vacina tem autorização de uso emergencial apenas na China. No Brasil, os estudos de fase três foram ampliados para 13 mil voluntários, incluindo quem já teve infecção prévia pelo coronavírus e idosos. No total, 16 centros de pesquisa brasileiros estão envolvidos no estudo clínico nacional, liderado pelo Instituto Butantan, em São Paulo.

Johnson & Johnson (EUA)

A candidata da farmacêutica da Johnson & Johnson, a Janssen, adota uma plataforma vetor-viral não replicante. Na fórmula contra a COVID-19, o adenovírus Ad26 é modificado para não se replicar mais e é editado para carregar a proteína spike do coronavírus. A previsão é que os testes de fase 3 englobem 60 mil participantes que deverão receber, por enquanto, uma única dose do imunizante. No Brasil, os testes serão realizados em 7 mil brasileiros.

Vacina Sputnik V (Rússia)

O Instituto de Pesquisa Gamaleya, parte do Ministério da Saúde da Rússia, desenvolveu uma potencial vacina que atua de forma dupla na proteção contra o coronavírus, a partir da plataforma de vetor-viral não replicante, em duas doses. Para garantir uma imunidade mais duradoura, os pesquisadores apostam no uso combinado de dois tipos diferentes de vetores de adenovírus (rAd26 e rAd5), ambos conhecidos por causar um resfriado comum em humanos. Na Sputnik V, os dois vírus são editados geneticamente e têm incluído no material genético a proteína spike do coronavírus.

No país de origem, a vacina composta por dois adenovírus humanos editados já tem autorização de uso emergencial. No Brasil, tanto o governo do Paraná quanto o da Bahia já firmaram parceria de cooperação técnica e científica para iniciar os testes, mas ainda aguardam aprovação da Anvisa.
Além desta fórmula, a Rússia fala em uma segunda vacina contra a COVID-19, em testes, com humanos. No entanto, nenhum detalhe ou estudo científico foi publicado.

CanSino (China)

A farmacêutica chinesa CanSino Biologics desenvolveu uma vacina baseada em um adenovírus humano, conhecido como Ad5, em parceria com o Instituto de Biologia da Academia de Ciências Médicas Militares do país. Além de não ser replicante, esse vírus é editado e recebe parte do material genético do coronavírus. A fórmula já recebeu aprovação emergencial de uso na China.

Vetor Vírus Inativado

Sinopharm (China)

A farmacêutica chinesa Sinopharm testa uma potencial vacina com o coronavírus inativado (morto), desenvolvida pelo Instituto de Produtos Biológicos de Pequim. Nos Emirados Árabes Unidos, o imunizante já recebeu aprovação emergencial de uso, direcionada para os profissionais de saúde do país.

Vacina de Wuhan (China)

Na China, o Instituto de Produtos Biológicos de Wuhan — localizada na província considerada como o primeiro epicentro do coronavírus no mundo — desenvolveu uma vacina com vírus inativado (“morto”). A pesquisa é liderada pela estatal chinesa Sinopharm e o imunizante já recebeu autorização de uso emergencial também nos Emirados Árabes Unidos.

Vetor mRNA

Pfizer (EUA)

Desenvolvida pela farmacêutica norte-americana Pfizer com a empresa de biotecnologia alemã BioNTech, a potencial vacina contra a COVID-19 depende de duas doses. O imunizante carrega um RNA mensageiro que estimula o organismo a produzir uma proteína específica do coronavírus. Depois de produzida, o sistema imunológico pode reconhecer ela como um antígeno e, assim, cria imunidade contra a doença. No Brasil, o Centro Paulista de Investigação Clínica (CEPIC) teste a vacina em duas mil pessoas.

Novavax (EUA)

Desenvolvido pela farmacêutica norte-americana Novavax, a vacina NVX-CoV22373 deverá ser distribuída em duas doses para promover a imunização do paciente. Em andamento, o estudo clínico de fase 3 envolve 10 mil voluntários entre 18 e 84 anos, no Reino Unido. Em breve, testes também devem começar nos EUA.

Quanto ao seu funcionamento, o imunizante carrega proteínas S do coronavírus, anexados em partículas microscópicas, que podem desencadear uma resposta imunológica no organismo. Além disso, também conta com uma substância que estimula as células imunológicas do paciente, o adjuvante Matrix-M.

Moderna e NIH (EUA)

A farmacêutica norte-americana Moderna trabalha em uma vacina com RNA mensageiro, de forma similar ao potencial imunizante da Pfizer, para a produção de proteínas virais do coronavírus no corpo humano, depois de duas doses. A pesquisa tem parceria com o National Institutes of Health (NIH), o maior centro de pesquisa biomédico dos EUA.

Vacina BCG (Austrália)

Responsável por prevenir formas graves de tuberculose, a vacina BCG tem efeitos contra a COVID-19 investigados por pesquisadores australianos. Atualmente, o Instituto de Pesquisa Infantil Murdoch investiga se o imunizante, conhecido oficialmente pelo nome de Bacillus Calmette-Guerin (BCG), protege parcialmente contra o coronavírus. No Brasil, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) deve iniciar um teste com três mil profissionais da saúde com o imunizante, assim que houver liberação de pesquisa pela Anvisa.

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