Proteção de Dados é vitória da privacidade e derrota da desinformação

Segundo a jornalista Renata Mielli, a Lei Geral da Proteção de Dados é derrota de Bolsonaro e contribui para limitar o uso de dados pessoais por redes sociais para direcionar conteúdo de extrema direita.

A jornalista Renata Mielli comenta a aprovação da entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados.

Governo Bolsonaro é derrotado com a aprovação da Lei Geral de Proteção de Dados, que passa a vigorar antes do prazo desejado pelo Executivo. Relatada na Câmara pelo deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP), a lei dificulta a exploração comercial e inadequada sobre dados dos cidadãos brasileiros. Denúncias na imprensa apontavam para uso indevido de dados pessoais tanto por empresas, no uso comercial sem autorização, quanto pelo governo, na elaboração de dossiês financeiros e ideológicos com fins não revelados.

A coordenadora do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) e secretária-geral do Centro de Mídia Alternativa Barão de Itararé, Renata Mielli, comemorou a aprovação da lei, surpresa com o resultado, até melhor do que o esperado, já que se tinha expectativa de adiar até o fim do ano a vigência, que acabou ficando para este setembro, logo após a sanção presidencial.

Em entrevista ao portal Vermelho, ela diz que a LGPD é uma conquista importante da sociedade, discutida durante anos. “Com a maestria que o deputado Orlando relatou a lei, ela foi aprovada por unanimidade na Câmara e no Senado, ainda no governo Temer. Imagina a ginástica pra aprovar uma legislação de direitos num contexto tão difícil”, diz ela, referindo-se ao governo golpista e regressivo de Michel Temer.

Aprovada em 2018, a Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.709, de 2018) sofreu modificações com as novas regras para o auxílio emergencial e o adiamento da vigência, prevista inicialmente para agosto de 2020, por medida provisória editada pelo governo federal (MPV 959/2020). Era uma vacacio legis (prazo de adaptação legal) para as empresas e o setor público se adaptarem às novas exigências. “Foi um jabuti [uma emenda estranha à Medida Provisória] que não tem nada a ver com o auxílio emergencial, mas que foi usado pelo governo para adiar a vigência da lei”, criticou.

A MP 959/2020, adiando a entrada em vigor de partes da legislação de 2018 para maio de 2021, continua em vigência até que as modificações aprovadas pelo Senado sejam sancionadas pelo presidente Jair Bolsonaro, o que deve acontecer até 11 de setembro. 

A lei abrange dados de e-commerce, bancos, redes sociais, hospitais, setor público e privado. A lei está vigente desde agosto de 2018 para a criação da Autoridade Nacional para Proteção de Dados, mas a parte das penalidades administrativas foi prorrogado para agosto de 2021. Agora, ainda em setembro, devem entrar em vigor os direitos dos titulares e os deveres dos controladores de dados, empresas (e agentes públicos) que detêm as informações de seus clientes, consumidores e usuários. 

Assim como a Lei de Proteção aos Direitos do Consumidor, a LGPD deve criar uma cultura forte de consciência dos direitos sobre as informações pessoais dos cidadãos que não existe hoje. Trata-se de uma legislação sólida e consistente que abriga e resguarda esses direitos, como passou a existir com os consumidores que não sabiam que podiam exigir seus direitos. 

Os efeitos cotidianos da falta dessa legislação é que as pessoas são importunadas por empresas que detém seus dados e telefones pessoais, que podem ser usados, inclusive para ilícitos ou usos maliciosos. As empresas detentoras dos dados passam a ter obrigações de proteção dos dados, para que não sejam capturados ou comercializados ou usados de forma indevida ou não autorizada pela própria empresa. 

A legislação atinge empresas transnacionais que usem dados do território e de cidadãos brasileiros, como o Facebook, mas seus efeitos diminuem caso o usuário aceite termos de uso dos dados quando se inscreve nessas plataformas. Para isso, é importante ler os termos de privacidade dessas empresas, antes de se inscrever. Do mesmo modo, práticas comuns de marketing que vêm sendo usadas pelas empresas a partir de perfilamento dos usuários de internet terão que ser revistos. 

Renata destaca a importância dessa lei também para o combate à desinformação, na medida em que as redes sociais utilizam dados pessoas de seus usuários para difundir conteúdo ideológico e informativo específico para cada perfil. O impulsionamento pago em redes sociais para difusão de mensagens de grupos de extrema direita direciona esse conteúdo para perfis conservadores de usuários, que passam a se organizar em torno de opiniões radicalizadas, fake news e informação descontextualizada. 

“Essa foi uma vitória importante na proteção de dados, porque é baseado em dados pessoais que as indústrias da desinformação e do discurso do ódio constroem o discurso para direcionar para os usuários das redes sociais”, disse a jornalista, que também atua na elaboração e defesa de uma legislação de combate à desinformação, também relatada na Câmara pelo deputado Orlando Silva. Assim, segundo ela, ter regras para o uso dos dados pessoais é uma forma de atacar a desinformação e as fake news.

Lei de Acesso à Informação já tratava desse controle sobre os bancos de dados no setor público, mas agora o âmbito está sendo estendido de forma maior e mais rigorosa. Já no setor público, a questão da autorização do usuário perde força, se comparada ao setor privado, embora se crie regras mais claras para o acesso dos dados por agentes do governo.

Veja Renata Mielli comentando a aprovação da LGPD entre 3m8s-8m25s:

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