“O combate à covid é o maior desafio da nossa geração”, diz Dorinaldo

O combate ao coronavírus é desafio para todo o mundo, no Amapá o responsável pela Vigilância em Saúde, Dorinaldo Malafaia conta sua experiencia através de entrevista concedida para o Portal Vermelho.

Mapa da situação epidemiológica do País de acordo com o jornal Folha de São Paulo. Disponível em: https://arte.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/2020/aceleracao-covid-no-brasil/

No mundo inteiro e também no Brasil, do Oiapoque ao Chuí, gestores públicos, assim como os cidadãos em geral, enfrentam a pandemia de covid-19 aprendendo como lidar com a nova doença.

Há quatro meses, no dia 04 abril, ocorreu o primeiro óbito no Estado do Amapá em decorrência da covid-19. De lá até aqui, foram 602 óbitos, todos muito sentidos e doloridos.

No entanto, o pico da doença, da confirmação de casos e óbitos, ficou para trás e o Amapá hoje é um dos Estados da federação que estão com os melhores índices em relação ao combate da covid-19, atingindo a classificação de baixo risco.

O Portal Vermelho entrevistou Dorinaldo Malafaia, gestor da Superintendência de Vigilância em Saúde do Estado do Amapá e dirigente do PCdoB, que afirma ter sido este o maior desafio da sua geração e da sua vida até aqui. Malafaia fez um balanço da pandemia no Amapá, no Brasil e no mundo.

Dorinaldo Malafaia concede entrevista para o Portal.

Portal Vermelho – Você é um dos responsáveis pela implementação da SVS no Amapá. Como está sendo o desafio de enfrentar a covid-19?

Dorinaldo Malafaia – O gestor ou até mesmo o cidadão que disser que tem sido simples, está faltando com a verdade. Vejamos: não há parâmetros de medição e enfrentamento de uma pandemia. A mal chamada “gripe espanhola” é de 1917, e então os parâmetros ficaram muito para trás. Temos hoje graus e níveis de complexidade de globalização muito maiores e diferentes.

O Brasil perdeu, por conta da errática presidência da república, o que tinha de mais valioso: tempo. Poderíamos ter nos preparado melhor e evitado milhares de mortes. Se pegarmos em comparativo a própria China ou outros países modelo no enfrentamento, como a Nova Zelândia, chegamos à conclusão que poderia estar sendo diferente e desperdiçamos a vantagem que tínhamos com uma sistemática militância anti-ciência por parte do poder central.

E no Amapá?

No Amapá, estamos fazendo um trabalho que conta com apoio da comunidade científica e a unidade do governo do estado em parceria com as prefeituras. Este trabalho unitário tem refletido resultados positivos, um dos melhores do país nesse momento.

Hoje somos um dos únicos estado considerados em queda. Estamos com percentuais de ocupação de leitos clínicos, de UTI e pediátricos, todos abaixo dos 40%. Os óbitos estão estáveis há semanas, assim como os casos confirmados.

O Amapá apostou na testagem, testamos muito a população, e quando foi necessário, fizemos “lockdown” que deu ao Estado as maiores taxas de isolamento social do país. Estamos colhendo os frutos agora.

Iniciou-se um processo de interiorização da pandemia. Veja, cerca de 70% da população amapaense está na capital ( Macapá).Agora alguns municípios do interior tiveram uma pequena elevação dos casos.

Nós, pela SVS, fizemos a opção de colocar as equipes em campo, em campo mesmo. Estamos indo de casa em casa. Onde há um caso notificado, nós vamos com médicos, enfermeiros e agentes de saúde ver a situação dos pacientes e seus comunicantes. Tem se demonstrado uma estratégia acertada.

Isso é importante ressaltar: o programa da SVS “de casa em casa” foi uma novidade fenomenal. É o papel que uma vigilância em saúde tem que realmente cumprir. Junto com o balanço do nosso combate à malária, sem dúvida é a marca dessa nossa experiência aqui.

E há chances de uma “segunda onda”, como já ocorreu em alguns países e há indícios em alguns estados?

Temos que ser cautelosos. Acreditamos que há essa possibilidade, sim. Por exemplo, o Amapá vinha com quedas nos índices de forma sistemática desde junho, que foi o mês do platô aqui, mas depois do início e da intensificação da reabertura do comércio, academias de ginástica, bares e restaurantes, shoppings e boa parte da vida social e econômica, os índices desaceleraram a queda, atingindo uma estabilidade.

Nossa estratégia agora é intensificar a fiscalização para que a reabertura seja consciente, com distanciamento social e medidas higiênico-sanitárias rigorosas. Pegar muito forte na utilização das máscaras também. É um trabalho difícil, mas esse está sendo nosso esforço. E, ao mínimo sinal de um retorno no crescimento, sem dúvidas iremos recomendar a volta de medidas mais agudas de isolamento social.

Mas tem novidade. Estamos elaborando uma segunda etapa nos planos de combate ao covid. Estou defendendo que uma gigantesca força social entre em ação. O Brasil tem cerca de 300 mil agentes de endemias e agentes comunitários de saúde nas prefeituras. É a hora de esses agentes entrarem em campo com mais força, em parceria com as vigilâncias em saúde dos estados. Vamos perseguir essa experiência aqui.

E pessoalmente, como tem sido chefiar a vigilância em saúde em um momento tão delicado?

Um desafio diário, aliás, um não, dezenas de desafios. O Estado acertou lá atrás, quando seguiu a modernização e o modelo da separação entre a secretaria de saúde e a criação da Superintendência de Vigilância em Saúde. Acredito que fez diferença e que a situação poderia ser realmente muito pior e calamitosa. Também as medidas da assistência ganham com isso, e no meio da pandemia o Estado conseguiu se articular para abrir muitas vagas de UTI, por exemplo.

A tarefa não acabou e, como me referi, há toda uma novidade em tudo isso. Me parece que temos que seguir vigilantes, de olho na ciência e esperar que logo possamos ter uma vacina. No mais, é seguir trabalhando.

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