Quarentena ainda “vai levar, no mínimo, dois meses, dois meses e meio”

Sylvio Provenzano, do Hospital Federal dos Servidores do Estado do Rio, defende manutenção das medidas restritivas para combater a pandemia do novo coronavírus

Em meio à escalada de casos de Covid-19, o relaxamento da quarentena, com a retomada das atividades, é um risco, avalia o médico Sylvio Provenzano, chefe do Serviço de Clínica Médica do Hospital Federal dos Servidores do Estado do Rio. “Ainda vai levar, no mínimo, dois meses, dois meses e meio – isso se os números sorrirem. Se continuarem como estão, vai ser mais difícil”, afirma.

Aos 63 anos, Provenzano integra os comitês científicos da prefeitura e do governo estadual. Formado pela UFRJ, é especialista em clínica médica e endocrinologia. Deixou a presidência do Conselho Regional de Medicina do Rio no último dia 31. Em entrevista à revista Época, ele defende as medidas restritivas adotadas em meio à pandemia do novo coronavírus.

Época: É o momento de começar a reabertura das cidades?
Sylvio Provenzano: Acho complicado. Ainda existem problemas a serem resolvidos. Se for liberar, é preciso saber quais atividades seriam contempladas. É importante que o Estado tenha participação na tarefa de conscientizar a população. Pertencentes a grupos de risco, por exemplo, não devem sair de casa. Os transportes públicos devem ser evitados em momentos de pico. Por isso, deve haver um escalonamento dos horários das atividades liberadas. Sem isso, é inviável. Não se pode permitir que o funcionário de uma atividade comece no mesmo momento que outros. Trens, BRTs e metrôs podem ser onde o vírus vai se propagar. E aí se dará um passo para a frente e terão de ser dados 20 passos para trás.

Época: A OMS listou seis critérios para suspender a quarentena. O Brasil cumpre todos eles?
SP: Não. Mas o que estamos vendo são planos escalonados para sair da quarentena. Não é “acabou a quarentena”. Ainda vai levar, no mínimo, dois meses, dois meses e meio. Isso se os números sorrirem. Se continuarem como estão, vai ser mais difícil. Por isso, neste momento, acho temerária a abertura. Temos um percentual grande de leitos ocupados e de novos casos surgindo. Testamos muito mais gente, é verdade, mas estamos apenas combatendo uma subnotificação que existia. A transmissão, eu não diria que está descontrolada, mas está presente. Quando as pessoas deixarem suas casas, haverá um risco maior de transmissão. E temos de lembrar que para muitas pessoas a doença é assintomática. Por isso tudo, qualquer liberação deve ser feita com muita cautela.

Época: O que sabemos sobre tratamento já é suficiente para a abertura de algumas atividades?
SP: O tratamento ainda é um assunto polêmico. Ele não está estabelecido. Há quem defenda a hidroxicloroquina e outro coquetel. Estamos em um caminho em que as perguntas se encontram em maior número do que as respostas. Essa é uma doença que surgiu no último dia do ano passado. Se malária tem 4 mil anos e ainda morre gente, imagina pela doença da qual ainda estamos conhecendo o ciclo biológico. Ela sofre muitas mutações? Será que teremos vacina? Qual opção melhor de tratamento? Ainda precisamos de mais estudos para essas respostas.

Época: A retomada dos restaurantes está atrelada à existência de uma vacina?
SP: Quando tivermos um tratamento definitivamente comprovado ou a doença estiver praticamente zerada. Para as pessoas no grupo de risco, ir a restaurante só no ano que vem. Por enquanto, só delivery.

Época: Qual seria o sinal de alerta para o retorno da quarentena?
SP: Um aumento de casos e de ocupação de leitos de UTI. Aí tem de retroceder. Na Croácia, o futebol voltou, mas um clube surgiu com 26 infectados. Acabou o campeonato. É por isso que eu digo que a abertura tem de ser feita com muito critério. Com atividades com o risco mínimo e as pessoas muito bem orientadas sobre como se comportar. Se após 15 dias os números mostrarem que não houve esse aumento, pode dar mais um passinho. Tem de ser gradativo.

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