Bolsonaro quer retirar direitos de grávidas em plena pandemia

A MP 936 de Bolsonaro prevê que grávidas podem ter salários e jornadas reduzidos e contratos de trabalho suspensos. Decisão pode afetar orçamento de mais de 60 mil trabalhadoras que se preparam para ter filhos

Trabalhadora grávida foto Elza Fiuza/ABr

Lideranças das mulheres alertaram para o risco que trabalhadoras grávidas correm com a Medida Provisória (MP) nº 936, editada sob o pretexto de ajudar no combate à pandemia do coronavírus (Covid 19) “preservando” os empregos, que prevê que as grávidas também podem ter redução de jornada de trabalho e salários de 25% a 70% por 90 dias, e a suspensão de contratos de trabalho por 60 dias. Somente as trabalhadoras que já estão em licença-maternidade não podem ter redução de salário ou suspensão de contrato de trabalho.

Com isso, as novas vítimas de Bolsonaro são as trabalhadoras grávidas que estão jogadas à própria sorte e na dependência da solidariedade de chefes e patrões, o que não costuma ser muito prudente. Segundo Celina Areas, secretária da Mulher Trabalhadora da Central de Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), existe a luta para excluir as trabalhadoras grávidas do texto da MP, em acordo com os deputados federais Orlando Silva (PCdoB-SP), relator da matéria, e a deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ).

“É um absurdo, no momento em que a mulher está grávida, ela poder ser demitida ou ter o contrato suspenso. Essa mulher não acha outro emprego se for demitida. Portanto, estamos tralhando para retirar a mulher grávida tanto dessa questão da redução da jornada de trabalho, quanto da redução de salário, acrescentando o direito à estabilidade, desde o momento da gravidez até 180 dias depois”, afirmou a sindicalista ao portal Vermelho.

A secretária de Movimentos Sociais do PCdoB, Liége Rocha, diz, em entrevista ao portal Vermelho, que qualquer medida que prejudique as mulheres não pode ser aceita, ainda mais aquelas que estão em vias de ter seus filhos, quando precisam ter cuidado redobrado. Ainda mais, quando elas precisam ter apoio e o reconhecimento pelo papel social da maternidade.

A dirigente afirma que não é apenas com as grávidas que Bolsonaro coloca a economia em detrimento da vida, mas em relação a todos os trabalhadores. “Agora ele diz ser o grande defensor da economia, mas no ano passado, deixou o PIB chegar a 1,1%. Por que não fez isso antes?”, critica Liége. “Numa situação de dificuldade, em vez de propiciar apoio, solidariedade e condições da mulher grávida tenha tranquilidade durante sua gestação e o parto, cria um processo que causa ansiedade, medo do que pode acontecer no futuro”.

O último dado do Ministério da Previdência, de março deste ano, mostra que pediram licença maternidade 66.425 mil mulheres, sendo 48.911, na área urbana e 17.514 da área rural. Por mês, se essa média de gravidez se mantiver, serão mais de 60 mil mulheres, com mais despesas por conta da vinda de um novo membro à família, que correm o risco de ter suspensos ou reduzidos seus salários.

O governo de Bolsonaro fez o contrário do que deveria e incluiu no decreto da pandemia que apenas as mulheres com gravidez de alto risco estão no rol do grupo que deve trabalhar em locais afastados do contato com pessoas contaminadas pela Covid-19, como os diabéticos, hipertensos, e outros. Isto significa que as demais grávidas podem se expor ao vírus. “Como Bolsonaro é contra o isolamento social, para ele, tanto grávida, quanto não grávida, não faz diferença”, disse Liége.

Como Bolsonaro já vinha atacando os direitos da grávidas, desde antes da pandemia, Liége alerta para outra consequência: “Provavelmente, ele vai querer reduzir a licença maternidade, uma conquista histórica da Constituição de 1988, feita com muita luta. Medidas Provisórias como essa, que desvalorizam a mulher grávida no mercado de trabalho são um precedente para isso”.

A resistência contra a MP

A MP está prevista para votação na próxima terça-feira (19), mas, a depender do relator deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP), deve ir a Plenário sem o item referente a essas trabalhadoras. A MP recebeu 971 emendas. Segundo Orlando, um dos focos do seu trabalho está em garantir que os acordos firmados durante a pandemia sejam por convenção coletiva e não patrão-trabalhador, como estabelece a MP do governo. 

“Concordo que o melhor seria derrotarmos essa MP. Mas, objetivamente, temos apoio de, no máximo, 130 dos 513 deputados. Precisaríamos do dobro disso pra rejeitá-la. Então, nesse caso, em especial, a Oposição entendeu que a melhor opção era articular mudanças no texto. Pois esperar que a MP caducasse também levaria muito tempo. Seriam quatro meses em que a medida da forma que está poderia causar um estrago imenso. Por isso, nossa meta é alterar o texto para proteger o trabalhador”, explicou o parlamentar.

 “Nós definimos algumas estratégias para tentar minimizar os efeitos da MP. O primeiro ponto foi ter a relatoria no nosso campo. Segundo, a participação dos sindicatos nas negociações, pois isso dá um ganho prático de melhorar as condições do acordo, pois deixa de ser uma luta individual. Estamos lutando ainda para reduzir a faixa salarial para ter convenção coletiva. Chegamos a R$ 1,8 mil, mas vamos lutar para descer mais a faixa, pois isso ajuda o trabalhador. Também estamos lutando para que o trabalhador tenha acesso ao seguro-desemprego sem condicionalidades, além da briga pela base de cálculo”, afirmou Orlando.

Mulheres no mercado de trabalho

As mulheres representarem 44,1% da força de trabalho formal no país e, apesar de serem mais escolarizadas que os homens, têm remuneração ¾ menor do que a deles. E se já não bastasse toda a discriminação que sofrem no trabalho, ao chegar em casa, são elas que dedicam 73% mais horas do que os homens nos afazeres domésticos, aponta a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD Contínua) do IBGE.

A legislação brasileira prevê que as trabalhadoras grávidas têm 120 dias de licença-maternidade e mais cinco meses de estabilidade quando voltam ao trabalho. Mas, um estudo feito pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), com 247 mil mães, mostra que 50% das mulheres são demitidas após, aproximadamente, dois anos da licença maternidade. A cada 10 mulheres, quatro não conseguem retornar ao mercado após a licença-maternidade, de acordo com a consultoria Robert Half.

Segundo o IBGE, considerando-se a rendimento médio por hora trabalhada, ainda assim, as mulheres recebem menos do que os homens (86,7%), o que pode estar relacionado com à segregação ocupacional a que as mulheres podem estar submetidas no mercado de trabalho.

O diferencial de rendimentos é maior na categoria ensino superior completo ou mais, na qual o rendimento das mulheres equivalia a 63,4% do que os homens recebiam, em 2016. A proporção em ocupações por tempo parcial (até 30 horas semanais) é maior entre as mulheres (28,2%) do que entre os homens (14,1%).

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