Uma comunista em Andradas

Uma história fascinante, Nô, a clandestina resgatada viva aos 100 anos em Colinas do Tocantins

Foto: Arquivo da família

Leonor Carrato, a Nô, participante de movimentos que culminaram na reorganização do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) , faleceu na tarde desta segunda-feira (11) as 17hs, aos 100 anos na cidade de Andradas (MG). Seu corpo foi enterrado no cemitério Parque Bom Jesus, com a participação de familiares.

A partir de abril de 2020, Leonor Carrato passou a viver com familiares em Andradas. Estava morando na casa de uma sobrinha, Leila Anacleto, de 80 anos. Estava debilitada, mas alimentava-se normalmente. “Eu acho que ela veio para morrer no seio da família”, disse Leila. Não houve velório, por conta da pandemia do coronavírus. O enterro ocorreu no dia 12 de maio de 2020. Um dos dez irmãos de Nô, João, 99 anos, está vivo e mora em São Paulo-SP.

Nô foi militante política em São Paulo, separou-se da família nos anos 60, para viver na clandestinidade em Tocantins, só foi redescoberta poucas semanas atrás, quando precisou fazer exame de corpo de delito, pois usuários de drogas invadiram sua casa. Ela viveu na clandestinidade em Tocantins, até reencontrar sua família em Andradas, onde viveu por poucos dias e veio a falecer aos cem anos de idade.

Leia também: Nô, a história de uma guerrilheira a ser desvendada

Uma história fascinante, Nô, a clandestina resgatada viva aos 100 anos em Colinas do Tocantins, segundo o Jornal do Tocantins. Teve sua história revelada após uma ocorrência na 4ª Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher e Vulneráveis, em Colinas do Tocantins (TO), a 270 quilômetros de Palmas, a capital. Uma idosa havia sofrido tentativa de assalto, em sua casa, e agredida por usuários de drogas.

A agente policial que encontrou Nô, viu uma situação sub-humana, casa cheia de lixo, goteiras, poucos móveis e algumas roupas. Assim vivia a clandestina que a princípio se identificou como sendo Maria Lidia Martino, inclusive com documentos de Tocantins. Porém, os dados eram falsos. Ela surpreendeu a agente e contou a história a seguir.

Maria ou simplesmente Nô, enfrentou a ditadura e foi presa em 1967, contou ainda em suas narrativas que foi uma das fundadoras do PCdoB. Teria mudado para Goiás para fugir da ditadura. Após o golpe militar de 1964 , Maria Lídia se lembra do racha que houve dentro dos partidos que daria origem ao PCdoB (partido que ela afirma ter ajudado a fundar).

Ela disse ser ex-integrante da Aliança Libertadora Nacional (ALN), isto no ano de 1967, quando Carlos Marighela saiu do PCB e fundou o movimento. Ela teria conhecido o movimento em São Paulo. Além do ALN ela participou do Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR8 ). O MR8 continua atuando até os dias de hoje, agregado a diversas organizações políticas e sociais, como, por exemplo, sindicais e estudantis, como a UNE. O seu braço juvenil é a Juventude Revolucionária Oito de Outubro (JR-8). Parcela expressiva de seus membros ajudaram a fundar o Partido Pátria Livre (PPL), hoje incorporado ao PCdoB.*  

Ela afirmou que seu grupo foi expulso do PCB e fundou o PCdoB, movimento inspirado no comunismo chinês. “Eu não concordava com armas, nunca peguei em armas, era da inteligência.” Afirmou Nô para o Jornal de Tocantins. Ela iniciou sua vida clandestina no final dos anos 60, chegou a fugir para o litoral e chegou até a Argentina. Terminou sua vida em Goiás e depois Tocantins, já que o estado se dividiu. A guerrilheira conheceu ainda membros do Movimento de Libertação Popular (Molipo) .

 “Ontem me mandaram mensagens sobre a morte da Nô. Uma pena, cada um com sua crença, mas vejo que ela veio para cumprir a missão dela que era ficar ao lado da família depois de tantos anos, ela os reencontrou e descansou,” disse Julio Dias, secretário de organização do PCdoB de Andradas.

* O PPL é o sucedâneo do MR8 e sua incorporação ao PCdoB, definida em congresso extraordinário realizado em março de 2019, integrou a militância em uma só organização partidária, em que pese haja um processo de maior integração em curso no movimento social como nas frentes de juventude, sindical e de mulheres. (N.E)

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