Estudo previa, há dois meses, gravidade da pandemia de Covid-19

Cientista político no Paraná já alertava autoridades em artigo escrito em janeiro deste ano, afirmando que crise pandêmica seria grave no Brasil e que o Carnaval seria o vetor do contágio.

Diante de muita polêmica e desentendimento entre autoridades (presidente de um lado, governadores, congresso, cientistas e o mundo do outro) do que fazer diante da crise gerada pela pandemia causada pelo novo coronavírus COVID-19, ocorre um cabo de guerra que pode causar mais mortes do que o previsto por inabilidade gerencial, interesses político-econômicos e incapacidade do governo em entender as vozes da ciência dos mais diversos setores.

Numa crise como essa, não são apenas os médicos que têm algo a dizer, mas também biólogos, matemáticos, físicos, sociólogos, psicólogos, geógrafos, economistas, cientistas políticos, estatísticos, entre muitos outros, devido às muitas dimensões da crise.

Mas se as decisões são tomadas por mero interesse econômico, ou eleitoreiro, o presidente estaria equivocado ao não conseguir interpretar a realidade e as muitas facetas da crise. Diversos colunistas políticos como Reinaldo Azevedo vêm afirmando que Bolsonaro está preocupado com a meta fiscal visando as eleições de 2022, mas não se preocupa com o povo.

O ex ministro da fazenda Maílson da Nóbrega chegou a afirmar em entrevista para a Rede Globo, que “Em primeiro lugar, está o objetivo de salvar vidas; em segundo lugar, de pôr dinheiro nas mãos das pessoas, particularmente as de renda mais baixa, as menos favorecidas. Em terceiro lugar, salvar as empresas de uma quebra. Esse é o objetivo terceiro. O primeiro é salvar vidas. O presidente parece dar a impressão de que ele prefere contar os mortos do que contar os desempregados”.

Economistas como Paulo Gala já haviam apontado em 29 de fevereiro que a crise pandêmica do coronavírus, que só está começando, já havia igualado a quinta maior crise das bolsas no mundo na história, algo que pelas implicações e pela duração, pode chegar a superar a crise econômica de 1929.

Na mesma linha dos anteriores, que conseguem ver a complexidade da situação, está o ex-conselheiro nacional de cultura e cientista político Manoel Neto, que antes do biólogo Atila Iamarino (comentarista da pandemia nas redes), previu mesmo não sendo da área de saúde, situações que os setores governamentais não deram conta de observar. E até por isso, dentro de seu próprio campo de estudos, conseguiu um fato digno de nota: acertar até as datas em que ocorreriam os casos e ampliação da crise, (acentuação da curva de crescimento de linear para progressão geométrica), bem como localizar o provável vetor de transmissão (o Carnaval) e a falta de ação em que o governo federal entraria.

Muito já foi dito sobre isso nos últimos dias, mas o cientista político publicou tudo isso, com pouco mais de 2 meses de antecedência, prevendo a explosão da crise, tentando alertar a mídia e os governos. O artigo chegou a ser publicado por canais independentes. Uma versão integral, com 28 páginas foi disponibilizada na plataforma Medium, que inclui gráficos e fontes confiáveis, como uma pesquisa de Hong Kong publicada na revista científica The Lancet, pesquisas de inteligência artificial financiadas pela Microsoft e da famosa instituição de pesquisas médicas Johns Hopkins dos EUA. O que o cientista político fez foi analisar os dados e localizar indicadores, dando explicações e previsões que se concretizaram, num tempo em que não só Bolsonaro negava os riscos da pandemia, como até mesmo o famoso médico Drauzio Varella insistia na tese da histeria (ao menos o médico mudou de opinião).

Até o momento, com base nas pesquisas de mídia e artigos publicados no Brasil, é possível afirmar, que apenas a bióloga Ana Luiza Saviolli e o cientista político Manoel Neto estavam nadando contra a maré, alertando da necessidade de medidas preventivas radicais, que após dois meses até a data de escrita deste artigo, não tinham ainda sido tomadas pelo governo.

Questionado sobre não ser do setor de saúde, e de como conseguiu antecipar o que acabou por se concretizar, Manoel respondeu que analise de ambiente, cenários, leitura e interpretação de tabelas, cálculos, em diversos fenômenos são passíveis de previsão, e que existindo fontes confiáveis de informação, profissionais como matemáticos, estatísticos, cientistas políticos, entre outros, podem dar apoio em problemas de outros setores. Ele complementa, afirmando que ouvir os técnicos é essencial, ainda mais num caso relacionado a sáude pública. Primeiro os clínicos, epidemiologistas, biólogos e gestores, mas os dados precisam ser processados e analisados. Em seguida entra o papel dos técnicos de outros campos do conhecimento.

O artigo de 28 páginas apresenta o cálculo de que a progressão geométrica dos contágios do Brasil poderia seguir os mesmos números da China e confirma que na atualidade (ainda que o caso da Itália ainda não tinha ocorrido quando ele escreveu seu artigo) o Brasil seguirá a mesma tendência. Afirma ainda sobre sua intenção com o artigo que “Isso não se dá por questões da prática clínica, nem se pretende passar por cima da opinião dos profissionais de saúde, mas é um reforço aos dados que eles dispõem, ajudando a entender as tendências para tomadas de decisão”. No cálculo, o estudo de 30 de janeiro deste ano explica que:

“No começo de janeiro a pandemia iniciou seu ciclo de multiplicação. Lembrem-se que todos os dados até agora são meramente indicativos do passado. Pois o que é atualizado na data atual representa o estágio em que a doença estava há 3 semanas. Explico: O tempo da incubação é de 14 dias, pacientes demoram em média 3 dias para procurar um médico, outros 3 para ter um diagnóstico e mais 1 dia para ser incluído nos sistemas de controle e avanço da doença.”, completando, diz, que “no Brasil, essa tendência se agrava, pois pela norma do Ministério da Saúde que oculta casos entre a papelada que dificulta a ação dos médicos, não são liberados kits de exames, só para determinados casos, ou para quem pagou em clinicas particulares. Ana Luiza Saviolli e Átila Iamarino também notificam isso. Os números do Brasil seriam fora da realidade”, segundo ele.

A situação se agrava, pois o vírus, é silencioso e infecta muito mais pessoas em silêncio antes que se manifestem sintomas, como antecipou, o que foi posteriormente confirmado pelas analise do biólogos Atila Iamarino e Ana Luiza Saviolli. Ainda no artigo de 30 de janeiro, o pesquisador acerta novamente ao demonstrar o comportamento matemático do avanço da pandemia, ao somar dados próprios, com os da The Lancet e outros, para concluir qual número provável de casos estaria realmente ocorrendo, se os casos que sabemos na atualidade são retratos de 21 dias no passado? Segundo ele, sem medidas restritivas e confinamento obrigatório da população, a taxa de crescimento na curva de progressão geométrica pode ser até 35 vezes maior na data em que se calcula, isso com relação aos casos já registrados com sintomas.

No artigo, os números prováveis de contágios são maiores do que aqueles divulgados de casos já identificados. Ele rebate essa questão, afirmando, que não é possível saber ainda quantos casos são, pois a maior parte não é identificada, conforme diversos estudos pelo mundo já atestaram, restando apenas indicadores e pesquisas futuras, bem como modelos de projeção matemática, que podem apresentar previsões, que não são números absolutos, mas prováveis, e com certeza, são muito maiores do que os que são divulgados, já que a revista Science, indica que 86% das infecções não são diagnosticadas e que 79% das transmissões tiveram origem em pessoas assintomáticas.

Ainda segundo o estudo, o vetor de contágio do caso no Brasil seria o carnaval. Segundo ele, no mundo todos grandes eventos foram cancelados (até as Olimpíadas de Tókio), e onde não foi, o vírus se espalhou. Um exemplo foi o carnaval de New Orleans, cidade com maior número de casos do coronavírus nos EUA depois de Nova York. Não seria diferente com o Brasil com quase 2 milhões de turistas no carnaval em plena pandemia, conforme a previsão que se concretiza:

“Vamos entender o carnaval como vetor de transmissão do vírus no Brasil, (…) Vamos lembrar que o carnaval no Brasil será de 22 até 25 de fevereiro. Considerando que no Brasil o diagnóstico é atrasado (…) teremos um surto de coronavírus provavelmente entre 19 e 26 de março, com exponencial ascendente na semana seguinte” afirmando no artigo, que seria fator decisivo a “data de retorno dos turistas de carnaval para suas cidades natal, quando vão espalhar a doença para seus parentes, familiares, colegas de trabalho e comunidade.”

Neste dado estarrecedor apresentado com antecedência no artigo, até na data foi acertada, pois a curva de crescimento do coronavírus no Brasil passou de linear para geométrica em 19 de março, conforme previsto, subindo de 77 casos (em 11/03), para 98 (13/03), mas saltando para 621 (19/03), chegando em mais de 2.598 casos (26/03), atestando a tendência apresentada 2 meses antes no artigo do pesquisador.

Outro fator revelador nesse estudo foi a previsão de que o governo não tomaria medidas efetivas, comparado ao resto do mundo. No capitulo “Fatores de Tomada de Decisão”, o autor aponta medidas preventivas que o Brasil deveria ter tomado desde a metade de fevereiro, como cancelar voos das regiões contaminadas e o carnaval. O texto também acerta ao demonstrar que o Brasil terá problemas pelo norte ideológico do governo, que poderá abandonar o povo como tem demonstrado em atrasos e posições antipáticas e irresponsáveis, como o pedido do presidente de que as pessoas voltem ao trabalho, nesse sentido o estudo antecipava a crise, afirmando:

“Os investimento, são o grande problema em todos os sentidos, pois com o corte dos recursos e investimentos com a emenda 98, de onde o governo vai tirar recursos, para conter a crise, manter operações, pessoal, remédios, atualização de estruturas dos postos de saúde e hospitais por um período de ao menos 6, talvez 10 meses? E a retomada de investimentos após este período para recuperação da economia, como será feita, após os prejuízos locais, mediante crise global que afetará indiretamente todas as nações? Como fazer esses investimentos em uma economia ultraliberal, que visa desonerar o Estado do máximo de responsabilidades com o povo?”, complementando em seguida sua previsão que acabou se confirmando relacionado a postura do presidente frente a população:

“As medidas preventivas só não serão feitas se este governo estiver mais preocupado com a guerra cultural (…) Nesse sentido, se o governo não tomar medidas preventivas, estaríamos confirmando que o que está no comando da nação, seriam as estratégias típicas da escola de Chicago, numa doutrina do choque, onde a economia da desgraça é a estratégia de integração vertical, com previsão de lucro nas mortes, desemprego, desmobilização social, eliminação de inimigos, morte de pessoas que não são economicamente viáveis para o Estado, bem como ampliação de lucros para setores empresariais com os efeitos dessa catástrofe social (…) bem como manter controle social pelo pânico, o que também lota as igrejas. Mas ninguém imaginaria que este governo seria capaz de promover algo como a necropolítica contra o seu próprio povo numa situação de pandemia global. Alguém teria coragem de ser tão perverso e ao mesmo tempo tão irresponsável?”, questiona o artigo.

Segundo o cientista político, a ampliação da crise e ausência de medidas governamentais vai ampliar a pandemia, colocar a economia em situação ainda pior, por agravar diversos aspectos da vida social e infraestrutura, causando ampliação consistente da duração da crise, que segundo ele, será mais impactada no Brasil, do que qualquer nação do mundo, por falta de gestão do conflito, e que não será pior ainda, porque 26 governadores e alguns prefeitos estão tomando medidas de lockout (confinamento coletivo) para impedir o avanço da pandemia, mas que sem investimentos de proteção social, fundos de reservas assistenciais, planos de logística de distribuição de alimentos, remédios, energia e materiais básicos para o confinamento, teremos no Brasil uma catástrofe humanitária sem precedentes.

O estudo está datado no que se sabia em 30 de janeiro de 2020 sobre o coronavírus, mas tem fatores diferenciais de analise que estão se comprovando, e por este motivo é relevante a leitura, até para entender como o coronavírus chegou ao Brasil, e como pode ter se espalhado, com confirmação em 26 de março pelo Ministério da Saúde em todos os estados do Brasil de forma tão rápida. Segundo o cientista político, isso pode ter se dado por causa do turismo e do carnaval, e o governo sabia, mas não tomou as providências.

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Fonte: Cultura930