Pandemia vai deixar 45 milhões de desempregados, diz George Mavrikos

Ao Vermelho, secretário-geral da FSM diz que “esta é uma luta de vida ou morte pela saúde, pelo direito ao trabalho decente e pela liberdade sindical dos trabalhadores de todo o mundo”

A pandemia causada pelo advento do coronavírus demonstra, mais uma vez, as debilidades do sistema capitalista. Para o secretário-geral da Federação Sindical Mundial (FSM), o grego George Mavrikos, as grandes corporações e o sistema financeiro pretendem repetir a estratégia de outras crises e impor aos trabalhadores de todo o mundo o ônus da recessão que se avizinha. “Não há vacina para as mazelas do capitalismo”, denuncia.

Conforme Mavrikos, 45 milhões de pessoas devem perder seus empregos. Em entrevista ao Portal Vermelho, o secretário-geral analisa, desde Atenas (onde está localizada a sede da FSM), o impacto que a pandemia pode causar à economia e à classe trabalhadora mundial. Com a dimensão que a crise ganha a cada dia, o dirigente sindical é taxativo: “Esta é uma luta de vida ou morte pela saúde, pelo direito ao trabalho decente e pela liberdade sindical dos trabalhadores de todo o mundo”.

Confira os principais trechos da entrevista:

Portal Vermelho: A pandemia do coronavírus já atingiu mais de 1,2 milhão de pessoas e deixou mais de 70 mil mortos. Até o momento, que tipo de balanço é possível fazer em termos de danos à classe trabalhadora de todo o mundo?

GM: A pandemia causada pelo coronavírus revelou mais uma vez a “nudez” do sistema capitalista. Foi demonstrado novamente e abertamente que grupos empresariais, governos e corporações transnacionais deixam de lado sem rodeios a vida humana e a segurança do povo trabalhador perante seus lucros.

Como Federação Sindical Mundial – entidade que reúne 100 milhões de trabalhadores em 130 países ao redor do mundo –, enfatizamos repetidamente que, em todas as crises, sejam guerras, catástrofes naturais ou crises capitalistas, são os trabalhadores e o povo simples os que pagam. Os capitalistas querem que a mesma coisa aconteça em tempos de pandemia. Portanto, é verdade que as consequências da pandemia têm atingido acima de tudo a classe operária mundial.

Embora o balanço mundial ainda não possa ser feito, das mortes registradas até o momento, é verdade que a maioria das vítimas não são os grandes industriais ou os banqueiros. São os estratos populares, que não têm o mesmo acesso aos serviços de saúde que os capitalistas – são eles que não podem se isolar em seus palácios ou em suas residências de luxo.

Embora as avaliações da Organização Internacional do Trabalho falem de 24,7 milhões de empregos que podem ser perdidos em todo o mundo em meio à crise do coronavírus, nossas avaliações, de acordo com as comunicações que coletamos de todos os continentes até o momento, nos levam ao número de 45 milhões de desempregados. Portanto, percebemos que esta é uma luta de vida ou morte pela saúde, o direito ao trabalho decente e às liberdades sindicais dos trabalhadores em todo o mundo.

Portal Vermelho: Em diversos países, há uma grande pressão para que os trabalhadores voltem a seus postos de trabalho, mesmo diante do risco que isso pode trazer à saúde. Muitos temem o desemprego. Qual papel devem ter os sindicatos neste momento?

GM: Em vários países, como Estados Unidos, Brasil, Reino Unido, Suécia e outros países da Europa, há fenômenos em que seus governos insistem para que todas as empresas trabalhem, afirmando que medidas de proteção não são necessárias. Para eles, a economia é tudo, a vida e a saúde dos trabalhadores não são nada. É claro que, por trás dessas declarações, esconde-se o desejo de explorar e espremer até a última gota do trabalhador. Ao mesmo tempo, anunciam pacotes de bilhões de dólares a serem entregues aos monopólios de seus países. As prioridades do capitalismo também demonstram sua natureza desumana.

Os sindicatos classistas – aqueles que estão na linha de frente da luta contra a exploração e suas causas – devem seguir adiante, tomar iniciativas para que os trabalhadores permaneçam fortes na pandemia, para que ninguém se sinta sozinho. Agora, precisamos exigir medidas de proteção eficazes para a vida e a saúde dos trabalhadores – recrutamento de pessoal em serviços de saúde, infraestruturas e serviços de saúde públicos, abrangentes, universais e gratuitos para toda a população, sem nenhuma atividade comercial, inclusive no setor farmacêutico.

Além disso, é de particular importância incluir na agenda das reivindicações a abolição da patente industrial para qualquer vacina, a fim de que ela se torne um bem de toda a humanidade. Não devemos esquecer ao mesmo tempo a necessidade de os sindicatos estarem atentos aos direitos e liberdades sindicais, pois, para os empregadores, essas circunstâncias são uma oportunidade para a limitação dessas conquistas populares.

Portal Vermelho: Hoje, os Estados Unidos já surgem como o principal epicentro do coronavírus no mundo, mesmo sendo o país mais rico e poderoso do Planeta. Lá não há saúde para todos, tampouco materiais de proteção aos trabalhadores do setor da saúde. De que maneira essas contradições podem fortalecer a luta da classe trabalhadora não apenas nos EUA, mas em outras regiões?

GM: A realidade é que a maior economia do planeta, os EUA, não quer nem pode atender às necessidades de sua população em máscaras, ventiladores e aparatos médicos. Todos nós vimos as fotos vergonhosas, tiradas num estacionamento de Las Vegas, no qual pessoas sem abrigo se amontoaram como animais por motivos de isolamento, enquanto até agora mais de 10 mil pessoas perderam a vida no país. Muito recentemente, os EUA foram forçados a pedir ajuda à República Popular da China e à Federação Russa, solicitando suprimentos médicos.

A situação no sistema de saúde norte-americano é trágica e perigosa para os estratos populares. Nos hospitais, nada é de graça. Você deve pagar por tudo e, de fato, a preços muito altos para todos, sem exceções. São 28 milhões de pessoas sem seguro, 33 milhões de pessoas com segurança precária, 8 milhões de pessoas que, apesar de pagarem seus impostos, não possuem documentos de legitimidade, enquanto os desempregados, idosos e pessoas de baixa renda recebem assistência básica somente se for aprovada a solicitude que eles devem apresentar.

Além disso, menciona-se que 18% dos trabalhadores nos EUA perderam seu trabalho ou parte de seu horário após o surto de coronavírus. Portanto, está nas mãos dos trabalhadores dos EUA como eles intensificarão sua luta, acrescentando sua voz à da FSM, inserindo em sua agenda as demandas do movimento sindical classista mundial. Simultaneamente, é urgente que a pressão dentro dos EUA também aumente contra as sanções econômicas impostas a muitos países.

Portal Vermelho: As fragilidades de diversas economias e de seus sistemas de saúde põem em evidência, mais uma vez, a debilidade do neoliberalismo e do sistema capitalista. Como consequência da crise de 2008, vimos aumentar a desigualdade e a exploração em todo o mundo. Que medidas devem ser tomadas para que o mundo supere a crise do coronavírus sem repetir os mesmos erros?

GM: É uma realidade a debilidade do capitalismo mundial para encontrar uma saída para a pandemia. Nesta crise, assim como em 2008, duas éticas, duas percepções diferentes entram em conflito. Por um lado, existe a ética dos proprietários de capital que induz fenômenos como na França, onde apenas em lares de terceira idade 1.416 pessoas morreram de coronavírus porque o sistema as considera como custo. Ou fenômenos como o da Grã-Bretanha, na qual se ordenou que os médicos do hospital não curassem pessoas com mais de 75 anos residentes em centros de idosos.

Por outro lado, é possível ver a postura da classe operária que, mesmo nessas circunstâncias, mostra sua solidariedade: dos heróis médicos cubanos que chegaram à Itália, no calor da batalha, para lutar contra a pandemia, até o trabalhador simples, que permanece forte e não aceita viver como escravo do século 21. A grande família sindical classista da FSM está e estará aqui, estendendo sua mão para quem pedir.

O importante é que a classe operária não se torne “imune” às medidas tomadas por seus inimigos em tempos de pandemia. Ela deve estar preparada para sua grande luta contra a exploração, seja em meio à crise, seja sem ela. Para o movimento sindical militante, a luta diária pela sobrevivência decente dos estratos populares em todos os cantos do globo tem uma prioridade essencial.

Hoje, a tecnologia, a ciência e o conhecimento técnico oferecem a possibilidade de satisfazer diretamente todas as necessidades contemporâneas de todos os trabalhadores. Como nunca será encontrada uma vacina que humanize o capitalismo, é urgente fortalecer nossa luta comum pela emancipação da nossa classe e pela abolição do sistema da exploração social.

Um comentario para "Pandemia vai deixar 45 milhões de desempregados, diz George Mavrikos"

  1. Francisco José Sousa e Silva disse:

    Muito boa a matéria. Nosso Secretário Geral faz uma importante síntese do pensamento sindical classista sobre a crise do capitalismo no contexto da Pandemia da Covid19. A FSM se mantém firme no propósito de denunciar as “mazelas” do sistema capitalista e o momento impõe de fato que seja exposta a contradição do sistema e do estado mínimo ultraliberal, desumano e antissocial. Esperamos que após esse momento a classe trabalhadora possa rever posições e realinhar a luta em prol de uma sociedade mais solidária, justa, com distribuição de renda e garantia de direitos.

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