Bolsonaro e Guedes ignoram causas do tombo das bolsas

Ministro da Economia responde ao agravamento da crise internacional com a promessa de que o Brasil tem “dinâmica própria” e estará salvo com a aplicação do seu programa.

Há uma combinação de fatores que permite prognósticos pessimistas para a economia brasileira. A crise global, agora agravada substancialmente pelo choque entre a Rússia e a Arábia Saudita no âmbito da Organização dos Produtores de Petróleo (Opep), é determinante, mas, em vez de enfrentá-la, o governo Bolsonaro adota medidas para agravar os seus efeitos.

Além da instabilidade política, com o presidente e seus auxiliares diretos criando crises em série – uma usina de hostilidades aos demais Poderes da República, à imprensa e às organizações sociais –, o rumo do programa do ministro da Economia, Paulo Guedes, já mostrou que ele leva o país para a catástrofe. O povo sente, diretamente, as consequências do desemprego em massa, do subemprego, dos cortes em investimentos sociais e do abandono da infraestrutura.

O coronavírus é um agravante, que atinge fortemente a economia mundial, mas o comportamento do governo é o mais relevante. O momento seria de mobilizar as energias do país, buscar reunir forças com a cooperação entre os Poderes da República e as organizações representativas da sociedade para criar um ambiente de busca de iniciativas e enfrentar a gravidade do momento.

Mas uma política dessa magnitude não faz parte da ideologia do governo Bolsonaro. Um dos seus principais pilares de sustentação, o programa de Paulo Guedes, segue à risca os mandamentos do mercado financeiro. O primeiro deles, o da estabilidade do pagamento de juros da dívida pública, determina todos os demais passos do governo.

O resulto são previsões cada vez mais pessimistas em relação ao desempenho da economia. Há até diagnósticos de retração do Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre. O Banco Central (BC), por sua vez, vive o dilema entre a necessária redução dos juros e a disparada do dólar, já próximo dos R$ 5.

Fuga de dólares

Em meio ao turbilhão que sacode as bolsas mundo afora, Guedes reafirmou que a melhor resposta é a aplicação do seu programa. Nada de medidas adicionais, de alguma ação de emergência. “Não está na hora de ninguém pedir privilégio, pedir aumento, pedir facilidade”, sentenciou. Segundo ele, o Brasil não será afetado pelo “aprofundamento” da crise internacional, por ter “dinâmica própria” e estar vivendo “uma reaceleração da atividade” econômica.

Para o ministro, as “reformas” neoliberais são a panaceia contra todos os males, internos e externos, até o coronavírus. “O mundo está realmente em um momento crítico. O coronavírus está sendo a gota d’água porque o mundo já estava desacelerando”, afirmou. Com sua reiterada tese de que está acabando com “o paraíso dos rentistas”, Guedes justificou a alta do dólar como uma suposta correção do “populismo cambial”.

Segundo o ministro, “por muito tempo, o Brasil ficou com os juros muito alto e o câmbio falsificado lá em baixo, exatamente porque tinha reservas e colocava o juro na lua”. Como fechar essa equação, ele não disse. O dilema do BC, já manifestado em informações de bastidores que circulam na mídia, é o de conter a fuga de dólares e ao mesmo tempo manter o juro em queda – condição alegada por Guedes para estabilizar e reduzir o pagamento de juros da dívida pública.

Sobre as reservas cambiais, essenciais para dar alguma segurança ao país em caso de ataque especulativo, o governo anuncia que elas continuarão a ser queimadas para tentar segurar a cotação do real. “Vamos continuar fazendo (intervenções no câmbio) no montante que for necessário enquanto entendermos que o mercado não está funcionando de modo regular”, disse Bruno Serra, diretor do BC.

Em declaração à agência Reuters, ele afirmou que o BC tem a política monetária como ferramenta para conter efeitos da crise externa. “O cenário tem evoluído muito rápido. A gente vai precisar se debruçar sobre o assunto e avaliar a melhor forma” na reunião do Copom deste mês, afirmou.

O BC elevou a US$ 3 bilhões a oferta líquida de dólar à vista em leilão nesta segunda-feira (9), ante valor inicialmente programado de US$ 1 bilhão, depois de na semana passada ter posto no mercado US$ 5 bilhões. Sem perspectivas de reversão da disparada da moeda norte-americana, a tendência é a de aceleração da queima das reservas, que cresce desde o ano passado.

Quedas históricas

Ao contrário do que diz Paulo Guedes, o Brasil, fragilizado por essa política econômica, tende a ser ainda mais castigado pelo agravamento da crise internacional. O confronto entre a Arábia Saudita e a Rússia em torno da produção de petróleo pode se desdobrar em lances cada vez mais dramáticos.

O aumento da oferta de petróleo e a queda da procura, decorrência do agravamento da crise internacional, cria um resultado que pode ser explosivo. Além de cortar algo como US$ 8 no preço de venda do barril para a Europa e para os Estados Unidos, e em cerca de US$ 6 de venda para os mercados asiáticos, a Arábia Saudita anuncia aumento das exportações em 800 mil barris diários.

Segundo nota de análise da Schroders – empresa multinacional britânica do mercado financeiro –, divulgada nesta segunda-feira (9), a estratégia poderá custar aos sauditas cerca de US$ 120 bilhões.

A nota informa que as cotações atuais são muito inferiores àquilo que está previsto nos orçamentos do Estado dos diversos países da OPEP, que terão de revê-los, gerando uma “instabilidade significativa”. O reflexo já começou a ser sentido com a perda do valor de mercado das petrolíferas, que está empurrando as bolsas para quedas históricas. 

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