A costela de Adão
A desigualdade de gênero começou nos primórdios da civilização patriarcal judaica-cristã, com aquela estorinha de que Eva foi criada da costela de Adão e, portanto, não passaríamos de um “puxadinho” do Homem, ser supremo.
Publicado 07/03/2020 20:12 | Editado 08/03/2020 23:06

Respaldados pela Bíblia, integralmente escrita por homens, com o intuito subliminar de reforçar a narrativa da mulher submissa às vontades do marido, para agradar a Deus e garantir seu lugar no Reino dos Céus.
Esses valores misóginos foram repassados por séculos e uma geração antes da minha, poucos ousavam questioná-los. Minha mãe nunca trabalhou. Era “Rainha do Lar” com orgulho e mérito. Cuidava do marido e de cinco filhos. Modelo irretocável da “bela, recatada e do lar” ambicionado pelas suas contemporâneas.
Nessa época, a mulher tinha sua identidade mutilada. Nascia filha de Dr. Fulano de Tal e se fosse “bem-comportada”, seria promovida a esposa de Dr. Sicrano de Tal.
Com uma cidadania usurpada e a sua sexualidade patrulhada exaustivamente, era obrigada a casar virgem ou seria devolvida como “objeto com avaria” para a desonrada família de origem. Daí para a prostituição era um passo, porque a família também a rejeitava. Ninguém arriscava romper o hímen ou a tradição.
Mero “depósito de esperma”, sem direito a orgasmos, em relações sexuais restritas ao orifício tombado pelo matrimônio, usado de preferência, para a finalidade reprodutiva. Afinal, uma esposa estéril era “inútil” do ponto de vista religioso e social. Para uma mulher escolher voluntariamente não ter filhos era impensável, corria o risco de ser confinada em manicômio como desajustada e imprópria para consumo.
O Estado se autoproclamava dono de seu útero. A Igreja, proprietária de sua alma e responsável por doutriná-la para reprimir ostensivamente desejos malignos que a conduzissem ao pecado e, consequentemente, a condenassem ao fogo do inferno.
A garota crescia ouvindo: “feche as pernas”; “não use roupa curta”; “não fale palavrão”; “fale baixo”; “não dê gargalhada alta”; “não chame atenção”; “nada de decote”; “não dance sensualmente”; “não fique bêbada”; “não saia sozinha”; “não seja promíscua”; em resumo não seja livre ou libertina como uma maldita Geni a envergonhar toda a família.
Não me surpreende nesse contexto que a garota cresça acreditando que a culpa por qualquer violência sexual que sofre, será sempre dela. Porque isso foi massificado em cada frase repressora que ouviu ao longo da vida. A culpabilização da vítima de estupro no Brasil é um dos crimes mais hediondos e cruéis que uma sociedade pode permitir, e uma gravíssima violação de direitos humanos.
Vejo, estarrecida e indignada, nas redes sociais vítimas de feminicídios sofrendo linchamento moral e tendo seu “currículo sexual” exposto de forma obscena para justificar a impunidade do agressor. Detalhe: parte significativa desses comentários asquerosos são feitos por mulheres de todas as faixas etárias. Empatia e sororidade são princípios raros na atualidade.
Quando escrevi em 1995 um artigo na revista Veja, intitulado “Ex-mulher virou profissão”, não o fiz para defender macho escroto e pai irresponsável que não paga pensão, mas para dizer à mulher que ela é capaz e não precisa de macho para financiar seu sonho da maternidade.
Nesses quase 35 anos como jornalista escrevendo e atuando em jornais, revistas, rádio e televisão, nas aulas que dei como professora de Comunicação Social na UFMA e, principalmente, como militante aguerrida do feminismo sempre bati na tecla da educação da nova geração com novos paradigmas.
A fórmula surrada que vem sendo ressuscitada pela ministra fascista Damares não deu certo. Menina não pode crescer acreditando que é uma princesa e que somente um “príncipe” poderá completa=á-la e legitimá-la socialmente.
Essa máxima de “menino veste azul” e menina hoje, além de vestir, compulsoriamente, tem que ter a “xoxota rosa” é doentia. O Brasil é o país onde mais se faz cirurgia plástica no mundo e a cirurgia de rejuvenescimento vaginal é uma das mais procuradas na atualidade.
A necessidade de aceitação e de se enquadrar em um padrão irreal têm levado milhares de adolescentes a desenvolver bulimia, anorexia, ansiedade, depressão e todo tipo de transtorno mental, gerando um grave problema de saúde pública.
O suicídio já é a segunda causa de morte de jovens. O jogo é bruto. O mundo está hostil. Machista. Misógino. Intolerante. Ou nos humanizamos ou vamos condenar eternamente nossas mulheres a morrer e nossos machos a matar. Não por sua índole ruim, mas pelo condicionamento cultural de reagirem com violência quando são contrariados.
O macho é adestrado pelo pai a dar porrada e a nunca demonstrar fragilidade. Para não passar recibo de “viado” vale tudo. Parece até o antipetismo atual. O “anti-viado” desumaniza e brutaliza os meninos, os transforma em machos agressores e numa real ameaça às companheiras e à sociedade.
Sei que não posso criar meu filho numa bolha onde os meus princípios permaneçam irretocados e sem influência nociva da sociedade que o cerca. Mas tenho esperanças de que meus netos Franscisco e Maria possam dar o start a uma geração mais humana e menos hipócrita. Essa esperança se renova todos os dias em atitudes simples.
Minha filha Ludmilla bota Maria para dormir cantando a música da banda Francisco El Hombre, intitulada “Triste, louca ou má” cujo refrão diz “um homem não te define, tua carne não te define, tua casa não te define, você é seu próprio lar” e prossegue num hino feminista: “ela desatinou, desatou nós, vai viver só”. A música resume minha biografia e ensina Maricotinha que ela é livre, digna e não precisa de homem para ser visibilizada, respeitada ou empoderada.
Por um Brasil com mais Ludmillas, onde Marias sejam criadas com autoestima, amor e respeito, é o que desejo a todas nós neste 8 de março de 2020.
Por ter havido uma citação ao livro do Gênesis, sinto-me levado a fazer um breve comentário ao texto em que concordo e defendo plenamente as argumentações. O Livro do Gênesis foi escrito por vários grupos, uns sacerdotais, outros patriarcais. Interessante notar que antes da passagem da costela de Adão, já se havia citado da criação do homem e da mulher. Os primeiros a escreve este livro colocaram ambos ao mesmo tempo na criação. Isto significa, que a luta pelos direitos das mulheres eram já naquele tempo, objeto de discussão, que refletiu-se nesta dupla caracterização da criação.
Concordo em.parte.mas.esta.gierra não leva a nada.
O que se tem.que fazer é se respeitar mutuamente independente de.genero.
Mas uma.verdade.nao pode ficar omissa.
A desconstrução da.masculinidade pelas mídias tem.sido exagerada e qto.a.isto tem.que se.fazer uma.reflexao.
Hoje principalmente.é o DIA INTERNACIONAL DO HOMEM e nada, nada.foi comentado pelas mídias.
Uma.total.omissão.