Parecer de juristas apoia crítica do presidente da OAB a Sérgio Moro

Ação arbitrária do ministro da Justiça foi repudiada por Felipe Santa Cruz.

Manifestações de críticas estão protegidas pela liberdade de expressão. Essa é a síntese do entendimento de juristas no caso em que o ministro da Justiça, Sérgio Moro, reagiu ao pronunciamento do Ordem dos Advogados do Brasil, Felipe Santa Cruz, suas seus atos arbitrários.

Segundo matéria de Sérgio Rodas na revista Consultor Jurídico, manifestações críticas estão protegidas constitucionalmente especialmente as praticadas contra atos de autoridades públicas no exercício de suas funções. Nesse caso, a tutela da liberdade de expressão prevalece sobre a proteção do direito à honra do agente estatal.

Foi esse o entendimento dos professores de Direito Constitucional Daniel Sarmento (da Universidade do Estado do Rio de Janeiro) e Ademar Borges (do Instituto Brasiliense de Direito Público). Eles afirmam, em parecer, que Felipe Santa Cruz não cometeu crime ao criticar o ministro da Justiça, Sergio Moro.

O presidente da OAB se manifestou após o ministro anunciar a intenção de destruir as mensagens obtidas por suspeitos de hackear celulares de autoridades públicas — inclusive dele próprio —, apreendidas no âmbito da operação “spoofing”. “(Moro) usa o cargo, aniquila a independência da Polícia Federal e ainda banca o chefe da quadrilha ao dizer que sabe das conversas de autoridades que não são investigadas”, disse o advogado ao jornal Folha de S. Paulo.

Dias depois, ele ressaltou que “a crítica feita foi jurídica e institucional”, e não visou atingir a honra do ex-juiz.

O Ministério Público Federal denunciou Santa Cruz por calúnia. Por falta de justa causa, contudo, a 15ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal negou a denúncia.

Mas o MPF interpôs recurso em sentido estrito, que aguarda julgamento do Tribunal de Justiça do DF.

Em parecer encomendado pelo advogado de Santa Cruz, Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, Daniel Sarmento e Ademar Borges afirmam que o presidente da OAB não cometeu crime contra a honra do ministro ao criticar seus atos. Isso porque a liberdade de expressão, quando se trata de denunciar medidas de autoridades públicas, se sobrepõe à honra deles.

“Se determinado comportamento corresponde ao exercício legítimo de um direito fundamental, ele não pode ser criminalizado. A lei penal não pode ser interpretada e aplicada de modo incompatível com a Constituição da República. Assim, além da própria norma penal, a Constituição veda essa tentativa de criminalização, razão pela qual deve ser mantida a decisão de rejeição da denúncia apresentada contra o consulente (Santa Cruz)”, avaliam os professores.

Além disso, eles apontam que a crítica a atos de agentes estatais que contrariem a Constituição, a democracia e os direitos fundamentais é uma das atividades institucionais da OAB — como estabelece o artigo 44, I, do estatuto da entidade.

E essa função torna-se ainda mais necessária no governo Jair Bolsonaro. “O governo hostiliza e trata como inimigos os jornalistas, as ONGs, os povos indígenas e quilombolas, as universidades públicas, os artistas, as feministas, os ambientalistas, os integrantes das minorias sexuais. Os valores democráticos e emancipatórios mais caros à Constituição de 1988 estão sob forte e permanente ataque, por vezes com a colaboração de agentes do sistema de justiça”, destacam Sarmento e Borges.

“Em tempos de crise democrática, tal papel [de criticar atos de agentes estatais que contrariem a Constituição, a democracia e os direitos fundamentais] torna-se ainda mais relevante, e deve ser exercido com coragem e independência. É o que ocorreu no caso, na linha das melhores tradições da Ordem dos Advogados do Brasil”, opinam os constitucionalistas.