Justiça manda Universal ressarcir fiéis manipulados por pastor

Decisão da 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul manteve a sentença que declarou nula uma doação de R$ 19.980 feita por um casal de fiéis à igreja

Os desembargadores da 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul decidiram, por unanimidade, manter sentença que declarou nula uma doação de R$ 19.980 feita por um casal de fiéis à Igreja Universal do Reino de Deus. A Justiça condenou a entidade a devolver o montante com correção monetária a contar da data do repasse – dezembro de 2016 – além de juros de mora.

Segundo os autos, o fiel, aposentado e auxiliar de produção, vendeu seu único carro por R$ 18 mil e entregou o dinheiro à Universal com mais R$ 1.980 – valor referente à sua aposentadoria. Na ocasião, os desembargadores analisaram recurso interposto pela igreja contra decisão de primeira instância que entendeu que a doação “comprometeu a subsistência dos autores, impossibilitando que desenvolvessem suas vidas de forma regular”.

À Justiça o homem alegou que sempre frequentou a Igreja “em busca de orientações espirituais e conforto diante da difícil situação financeira”. Disse ainda que a doação ocorreu “sob forte influência do pastor ao prometer milagres na vida dos autores, induzindo-os a erro”.

Na decisão de primeira instância, o juiz Anderson Royer, da 3ª Vara Cível de Três Lagoas, registra que o casal alegou “ter sido vítima de lavagem cerebral supostamente realizada pelos pastores”, uma vez que a doação não ocorreu de “maneira espontânea, mas induzida, através da coação moral”.

No entanto, o magistrado considerou que não havia provas para comprovar “indubitavelmente” tais alegações. Royer entendeu que a ausência do valor doado “comprometeu a subsistência” do casal, “impossibilitando que desenvolvessem suas vidas de forma regular. Não obstante, frisa-se que os autores são pessoas idosas, cuja ausência do veículo debilita, consideravelmente, o desempenho de suas atividades diárias”.

A Igreja Universal do Reino de Deus recorreu da decisão de primeira instância alegando que “é vedado ao Judiciário embaraçar a liberdade de liturgia religiosa” e que estava amparada pelo exercício da liberdade de organização religiosa. A igreja argumentou que dízimo e oferta eclesiásticos “não podem ser confundidos com doação”.

Mas, ao analisar o caso, o desembargador Alexandre Bastos, relator, considerou que a sentença de primeiro grau bem demonstrou que a doação verbal somente poderia ter sido realizada se versando sobre bem móvel e de pequeno valor, “o que não ocorreu na presente hipótese, por se tratar de veículo no valor de R$ 19.980,00, de forma que é inválido o negócio jurídico”.

“A venda do único automóvel e doação da aposentadoria, diante das condições pessoais demonstradas com extrato bancário (fl. 13), valor de benefício previdenciário (fl. 59), entre outros dados pessoais (fls. 18/19), são suficientes para concluir que levaram ao comprometimento da subsistência dos apelados, razão pela qual foi bem aplicada a regra prevista no art. 548 do CC”, registrou ainda o desembargador.

O magistrado também pontou, quanto à alegação de embaraço à liberdade de liturgia religiosa, “que não há nenhuma norma legal que garanta à entidade religiosa, independentemente da fé professada, qualquer tipo de isenção apenas pelo fato de lidar com a espiritualidade”.

“De se registrar que o mesmo teto constitucional que abriga e protege a liberdade religiosa, também é o que protege o cidadão e seu conjunto de direitos,sobretudo aqueles que impliquem na sua própria subsistência, a sua liberdade e igualdade, e a integridade e moralidade nas relações a que se submete”, concluiu o desembargador.

Com informações do Estadão

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