Flávio Dino, a saída é o consórcio!

Em artigo, o editor do blog O Cazeinho diz que o Consórcio do Nordeste deveria liderar a chamada frente ampla proposta pelo governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB).

(Divulgação)

Os sinais de recuperação do mercado de trabalho, embora ainda muito tímidos, e longe de serem sustentáveis (vide a deterioração da balança de pagamentos, de um lado, e o fato de estarem sendo criadas apenas vagas de baixa remuneração, de outro), proporcionaram um pouco de alívio para uma equipe econômica desesperada para se livrar das pautas negativas criadas pelo presidente e seus ministros mais ideológicos.

Não é um alívio que deva durar muito, porque o festival de besteiras do governo tem produtividade e capacidade de inovação de fazer inveja às indústrias mais avançadas de Shenzhen!

As últimas trapalhadas do ministro da Educação, espalhando fake news sobre Reinaldo Azevedo, de que este teria sido demitido, quando na verdade o jornalista está com problemas de saúde, provam a tese.

Neste sentido, eu concordo com uma das sugestões de Lula em sua última entrevista, de que não devemos torcer contra a economia brasileira; mas discordo, por outro lado, de seu pedido para que Bolsonaro deixe de falar besteira. É bom que fale. Fala mais, Bolsonaro!

No momento, o besteirol que tem maior potencial de estrago, em virtude de sua importância estratégica, vem do ministério da Educação, como se pode ver pelos problemas relacionados ao Enem e a Sisu, além de uma estranha portaria que dificulta o translado de pesquisadores.

Entretanto, não me parece que a oposição esteja aproveitando todas as suas potencialidades. E aqui volto ao debate sobre a “frente ampla”, que ainda produz bastante ruído, por causa de algumas incompreensões, mas também por um motivo que me parece central: falta de objetividade.

A principal potencialidade é o Consórcio do Nordeste, que inclusive poderia ser ampliado para incluir colegas de outras regiões que estivessem insatisfeitos com o governo Bolsonaro.

Naturalmente, não faria sentido que este consórcio se constituísse como uma “frente de oposição” tradicional, sobretudo diante de um governo tão abertamente antidemocrático, que não hesita em fazer ameaças às administrações comandadas por quem ele considera, de maneira muito pouco republicana, como seus “inimigos políticos”.

Seria muito mais inteligente, todavia, que o consórcio se organizasse para realizar, coletivamente, investimentos em produção, tecnologia, informação.

Conforme defendi no artigo anterior sobre este tema, a frente ampla, que vem sendo costurada ainda meio solitariamente por Flavio Dino, precisa estar centralizada no debate sobre um projeto nacional.

Hoje a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, afirmou que o partido poderia apoiar Flavio Dino em 2022. Apesar de ser louvável que a dirigente deixe em aberto a possibilidade de uma composição que não tenha o seu próprio partido como cabeça de chapa, e que a declaração injete um pouco de ânimo no PCdoB, não é um gesto tão democrático quanto parece. Para outros partidos, como PSB, Rede, PDT, e todos aqueles mais ao centro, a afirmação soa assim: o candidato será quem a gente quiser; senão for um petista, então será fulano.

Ademais, depois das afirmações de Lula, de que o “PT não é partido de apoio”, dadas recentemente, fica difícil não ver a afirmação de Gleisi como um jogo de cena, uma dessas mentiras sinceras que se conta à militância para neutralizar um debate que não se tem interesse em fazer nesse momento.

Evidentemente, não é assim que se constrói uma frente ampla. Aliás, admito a vocês que sou muito cético em relação a qualquer movimento de “frente ampla”, “união”, que não esteja baseado na discussão de um projeto concreto, objetivo, com prazos, métodos e estratégias previamente definidos.

O consórcio de governadores do Nordeste é que deveria liderar essa frente ampla, e desenvolver, desde já, experiências locais que pudessem servir como modelos para o país: cinturões agrícolas nas cidades; fomento à pequena indústria rural;  sistemas mais avançados de controle da circulação de mercadorias, que permitissem combate mais eficaz da sonegação; investimento em projetos modernos de educação básica; investimento em pesquisa; desenvolvimento de um sistema público de comunicação regional, uma “tv nordeste” altamente profissionalizada.

Sobre esta última ideia, uma “tv nordeste”, seria a oportunidade da esquerda comprar um debate fundamental sobre comunicação pública, até porque ela terá a mesma dificuldade de governar o país a partir de 2023 (caso vença as eleições, naturalmente) que teve no passado. Uma experiência no nordeste anteciparia os problemas e soluções, neutralizando críticas que certamente emergirão, da parte de alguns meios tradicionais de comunicação. Tudo isso tem que ser pensado estrategicamente, claro. Não se pode pensar numa estratégia de comunicação, que inclua a criação de TV, como uma iniciativa que prejudicará a relação dos governos estaduais com suas respectivas mídias ou com as mídias nacionais. Para isso, será preciso elaborar um projeto de mídia pública que esteja integrado a um projeto maior de proteção à imprensa profissional brasileira, hoje muito atacada pelo extremismo conservador.

Esta me parece a única saída realmente objetiva. O consórcio não pode ser uma instituição superficial, criado apenas para gerar selfies dos governadores, ou para a materialização de projetos muito pontuais, ou para viajarem juntos. Também seria um tanto ridículo, e contraproducente, torná-lo uma coisa partidária: ele deve reunir diferentes tendências, incluindo centro e liberais, desde que todos reunidos em torno de algumas metas em comum, como a de gerar empregos de qualidade, reindustrializar o país e combater a desigualdade.

A frente ampla, por sua vez, senão estiver consolidada sobre coisas muito objetivas e concretas, terá efeito contrário ao desejado: fomentará intrigas e vaidades, ajudando a fragmentar ainda mais as forças de oposição.

Se Dino encontrar Luciano Huck, será considerado um traidor. Se encontrar Ciro, será um traidor. Se encontrar FHC, será um traidor. Se encontrar Tábata Amaral, será um traidor. Se iniciar conversas com estrangeiros, será um vendido ao capitalismo internacional. E por aí vai. Os ruídos gerados por uma militância ainda muito tensionada pela polarização e pelo extremismo do governo implodirá qualquer tentativa de Dino de levar adiante seu esforço para furar a bolha e ampliar o alcance político do debate progressista.

O autor é jornalista e editor do blog O Cafezinho.