STF decide se Constituição prevalece no caso da prisão em 2ª instância

O Supremo Tribunal Federal (STF) continua nesta quinta-feira (24) o julgamento das Ações Declaratórias Constitucionais (ADcs) da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), do PCdoB e do Patriota, que pedem a constitucionalidade do artigo 238 do Código do Processo Penal (CPP) pelo qual “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, ou seja, contra a prisão após a condenação em segunda instância.

Por Iram Alfaia

(Foto: Felipe Sampaio/STF)

O julgamento terá impacto na vida de 4,8 mil presos, inclusive na situação do o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, condenado em segundo instância, sem provas, no processo do Tríplex do Guarujá (SP).

O presidente do STF, Dias Toffoli, suspendeu a sessão desta quarta-feira (23) quando o placar estava em 3 a 1 a favor da prisão após condenação em segunda instância. Votaram nesse sentido: Alexandre de Moraes, Edson Fachin e Luís Roberto Barroso.

O ministro relator Marcos Aurélio de Mello, que votou pela procedência das ações, diz não haver espaço para interpretação do artigo 283 do CPP, que tem respaldo no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição.

"A harmonia, com a Constituição de 1988, do artigo 283 do Código de Processo Penal é completa, considerado o alcance do princípio da não culpabilidade, inexistente campo para tergiversações, que podem levar ao retrocesso constitucional, cultural em seu sentido maior", afirmou o relator no seu voto.

Segundo o relator a exceção corre por conta da aplicação do artigo 312 do CCP pelo qual estabelece a prisão preventiva para garantir a ordem pública, econômica, por conveniência da instrução criminal.

“O princípio da não culpabilidade é garantido na lei maior. A constitucionalidade do artigo 283 não comportar questionamento, consiste em clausula pétrea, cuja núcleo essencial nem mesmo pode ser constituinte derivado”, advertiu.

“É impossível devolver a liberdade perdida ao cidadão”, disse o ministro, para quem não se pode inverter a ordem natural da coisa, isto é, primeiro apurar para depois prender.

Votos divergentes

Os votos contrários ao entendimento do relator não foram novidades, uma vez que eles já haviam manifestado suas posições.

Alexandre de Moraes, o primeiro a julgar após o relator, votou pela possibilidade de prisão após a condenação em 2ª instância. "Saliento que essas alterações de posicionamento, 24 anos com a posição atual, 7 anos com a posição do trânsito em julgado, não produziram nenhum impacto significativo no sistema penitenciário nacional".

Segundo ele, não se pode afastar a efetividade da tutela judicial dadas pelos juízos de 1ª e 2ª instância, que são os juízes naturais da causa, de cognição plena. “Não se pode transformar esses tribunais em tribunais de mera passagem".

Edson Fachin, o terceiro a votar, considerou a interpretação do artigo 283 do CPP inconstitucional, abrindo o placar para 2 a 1 contra o pedido feito nas ADCs.

"Inviável sustentar que toda e qualquer prisão só pode ter seu cumprimento iniciado quando o último recurso da última Corte constitucional tenha sido examinado", disse ao votar também pela possibilidade de prisão em segunda instância.

O placar foi alterado para 3 a 1 com o voto de Luís Roberto Barroso. Antes, ele apresentou dados do Departamento Penitenciário Nacional dando conta de que a possiblidade de prisão após a condenação em segunda instância diminuiu o índice de encarceramento no país.

De 2009 a 2016, o entendimento do STF era pela prisão só após o trânsito em julgado. "Entre 2009 e 2016, a média de crescimento do encarceramento foi de 6,25%. E após 2016, quando volta a possibilidade de execução após condenação em 2º grau, a média foi de 1,46%", disse Barroso.