Com recessão, golpe e Bolsonaro, indústria despenca 15% em 5 anos 

Enquanto a produção industrial no resto do mundo cresceu 10% desde 2014, a atividade nas fábricas brasileiras despencou 15% nesse período. O País está longe de recuperar o patamar industrial em que estava antes da recessão de 2015/2016. Com o golpe de 2016 contra a presidenta Dilma Rousseff (PT) e os governos entreguistas de Michel Temer (MDB) e Jair Bolsonaro (PSL), a situação se agravou: o Brasil corre o sério risco de deixar de estar entre os dez maiores países industriais do mundo.

Fábrica

O que explica a disparidade do desempenho nacional frente a países vizinhos? Na opinião de especialistas, para além dos efeitos negativos da recessão no Brasil sobre investimentos e geração de empregos, houve variados choques na atividade industrial e também problemas estruturais.

Todos esses fatores devem levar a indústria – que tem peso de cerca de 11% no Produto Interno Bruto (PIB) – a uma nova retração neste ano, influenciada também pela desaceleração global. O pico de participação da indústria no PIB foi em 1976, com 22,3% (a preços constantes de 2010).

De acordo com a economista Laura Karpuska, da BlueLine Asset, que sistematizou os dados sobre produção industrial no mundo, nos países emergentes (excluindo a China) a atividade das fábricas cresceu 8% desde 2014. Na América Latina, o desempenho foi de queda de 4% – e o destaque negativo entre os maiores países da região foi justamente o Brasil.

Laura também atribui o fraco desempenho brasileiro à queda nas exportações para a Argentina, que afeta os manufaturados. Esse fator pode ter tirado 0,7 ponto porcentual do PIB em 2017 e 2018. Também pesaram a tragédia o rompimento da barreira da Vale, em Brumadinho (MG) e a greve dos caminhoneiros, em maio do ano passado.

“À exceção da Argentina e dos problemas gravíssimos da Venezuela, a crise industrial do Brasil foi uma das mais profundas da América Latina – e a recuperação tem sido das mais frustrantes possíveis também”, reforça o economista Rafael Cagnin, do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). Vem da entidade o alerta de que o Brasil – que ocupa a nona posição entre os maiores países industriais – pode deixar, em breve, de aparecer entre os dez primeiros desse ranking.

O desempenho fraco da indústria, na avaliação de Cagnin, reflete tanto a demanda fraca quanto problemas estruturais de competitividade e produtividade, como a complexa estrutura tributária, o baixo investimento e o parque produtivo obsoleto. O economista reforça que é cada vez maior o risco de a atividade fechar 2019 com queda na produção.

Depressão

“Se a situação em que a indústria brasileira está não é uma depressão, não sei mais o que poderia ser”, afirma o economista e ex-presidente do Banco Central Affonso Celso Pastore. “A indústria nacional e a do resto do mundo seguem a mesma trajetória até 2012. Em 2013, a do Brasil começou a fraquejar e nunca mais se recuperou, enquanto a produção mundial continua crescendo e, hoje, está 40 pontos porcentuais na frente.”

Ele avalia que foi cometida uma série de erros em anos recentes – erros que criaram uma espécie de armadilha para o setor. Um exemplo: “Diversos empresários foram atrás de proteção, de recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e esqueceram de investir para aumentar a competitividade das empresas.”

Segundo o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e especialista em economia industrial, David Kupfer, não há solução de curto prazo para reverter o quadro de “anemia industrial”. “Há uma questão estrutural, de falta de competitividade, e conjuntural, de falta de dinamismo na economia, que impede a indústria de crescer.”

Para Kupfer, seria possível tentar estratégias, envolvendo empresas e política econômica, para que a indústria recuperasse mais dinamismo em um horizonte de médio a longo prazos, com resultados demorando pelo menos cinco anos para aparecer. “O que se pode pensar é em uma reformulação da política econômica atual, que abra algum espaço para investimentos.”

Para Kupfer, políticas usadas por governos anteriores – como o fomento aos chamados “campeões nacionais” e a desoneração da folha de pagamento de diferentes setores produtivos – não serviram para fortalecer a indústria, mas para tentar melhorar o ambiente macroeconômico. “Ainda assim, esses instrumentos não devem ser demonizados, apenas não foram bem utilizados à época.”