Miguel Torres: Indústrias fechadas 

Temos questionado há bastante tempo a desindustrialização, a estagnação econômica, o desemprego e a redução dos direitos sociais, trabalhistas e previdenciários da classe trabalhadora. É, portanto, muito oportuna a reportagem “Número de indústrias fechadas em São Paulo é o maior em uma década”, publicada pelo jornal O Estado de S.Paulo, em 21 de julho de 2019.

Por Miguel Torres*

A matéria relata o fechamento de mais de 2 mil fábricas, entre janeiro e maio, no estado de São Paulo, o “maior polo industrial do País”, revelando a persistente crise e a falta de investimentos nos setores produtivos e na indústria, um segmento que tem potencial para gerar emprego de qualidade e girar a roda da economia.

Os governos precisam entender que sem uma forte indústria o País, as regiões, os estados e os municípios não conseguirão se desenvolver adequadamente nem distribuir renda de forma justa e igualitária.

A reforma trabalhista, a terceirização sem limites e as demais medidas neoliberais que estão aprovando ou tentando aprovar no Congresso Nacional, como a reforma da Previdência e os ataques ao movimento sindical, não resolverão a crise, o desemprego, o desalento e os riscos sociais.

Precisamos de industrialização e postos de trabalho qualificados para melhor enfrentarmos o cenário de estagnação e os atuais e futuros desafios tecnológicos e produtivos.

* Miguel Torres é presidente da Força Sindical, da CNTM e do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo e Mogi das Cruzes

Leia abaixo a matéria do Estadão:


Número de indústrias fechadas em São Paulo é o maior em uma década
Maior polo industrial do País, estado de São Paulo viu 2.325 fábricas fecharem as portas entre janeiro e maio

Por Cleide Silva, no O Estado de S. Paulo (21/07/2019)


O estado de São Paulo, maior polo industrial do País, registrou o fechamento de 2.325 indústrias de transformação e extrativas nos primeiros cinco meses do ano. O número é o mais alto para o período na última década e 12% maior que o do ano passado, segundo a Junta Comercial.

O dado indica que a fraca recuperação da economia brasileira após a recessão de 2014 a 2016 continua levando ao encolhimento do setor produtivo, deixando um rastro de fábricas desativadas e desempregados.

Entre 2014 e 2018, o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro acumulou queda de 4,2%, enquanto o da indústria de transformação em todo o País caiu 14,4%. “Significa que a produção caiu bastante e obviamente teve impacto nas empresas, com fechamento de fábricas e demissões”, diz o economista José Roberto Mendonça de Barros, da MB Associados.

Em paralelo, foram abertas de janeiro a maio 4.491 indústrias em São Paulo. Tradicionalmente há mais abertura do que baixa de fábricas, mas isso nem sempre é um indicador positivo. Para Mendonça de Barros, independentemente dos números de novas indústrias, a queda do PIB industrial mostra que houve encolhimento da produção e, provavelmente, foram fechadas empresas grandes e médias e abertas unidades de menor porte.

O presidente do Sindicato da Indústria de Calçados de Jaú, Caetano Bianco Neto, afirma que, nos últimos anos, várias empresas consideradas de grande porte para a atividade, com 300 a 400 funcionários, encerraram atividades. “Quando fecha uma grande, muitas vezes surgem outras três ou quatro micro e pequenas fabricantes, algumas inclusive abertas por ex-funcionários, mas com pouca mão de obra”, diz Bianco Neto.

O polo calçadista de Jaú, referência nacional na produção de calçados femininos, já empregou 12 mil trabalhadores em meados dos anos 2000. Hoje tem 5 mil funcionários, diz Bianco Neto. Recentemente, ele e dirigentes da indústria de calçados das vizinhas Franca e Birigui entregaram ao governador João Doria (PSDB) um plano de recuperação do setor.

No grupo das que fecharam as portas, há indústrias nacionais e multinacionais. Algumas transferiram filiais para outras unidades da mesma companhia para cortar custos e outras acabaram com a produção, deixando um contingente de desempregados, parte deles sem receber salários e indenizações.

A indústria de autopeças Indebrás, na zona oeste de São Paulo, deixou de operar em abril e colocou na rua 150 funcionários. Com salários atrasados e sem verbas rescisórias, eles ficaram acampados em frente à fábrica por 48 dias. Após acordo na Justiça do Trabalho, a empresa propôs fazer o pagamento em 18 parcelas mensais.

“O receio é que a empresa pague as primeiras parcelas e depois suspenda o pagamento, como já ocorreu em acordos anteriores fechados por outras empresas”, diz o diretor do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, Érlon Souza.

Conjuntura difícil

A situação da indústria paulista se repete em todo o País. Além do encerramento das atividades de empresas de pequeno porte, grandes grupos fecharam unidades consideradas menos produtivas e concentraram a produção em outras mais modernas, quase sempre sem levar a mão de obra.

A fabricante de pneus Pirelli anunciou em maio o fechamento da unidade de Gravataí (RS) e a demissão dos 900 funcionários. A produção de pneus de motos será unificada à de pneus para carros em Campinas (SP) onde serão geradas 300 vagas ao longo de três anos. A empresa alega necessidade de reestruturação “tendo em vista o cenário conjuntural difícil do País”.

Entre as empresas que fecharam fábricas este ano estão PepsiCo/Quaker (RS), PepsiCo/Mabel (MS), Kimberly-Clark (RS), Nestlé (RS), Malwee (SC), Britânia (BA) e Paquetá (BA). No ABC paulista, a autopeça Dura informou em janeiro que fecharia a fábrica em maio e demitiria 250 funcionários. Após greve e negociações envolvendo a prefeitura de Rio Grande da Serra e o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, a medida foi adiada.