Veja revela testemunhas que colocam em xeque imparcialidade de Moro

Reportagem da revista Veja deste final de semana revela as duas testemunhas que aparecem no diálogo pouco republicano entre o então juiz Sérgio Moro e o procurador Deltan Dallagnol, revelado pelo The Intercept Brasil, no caso em que o atual ministro da Justiça instruiu Dallgnol a procurar uma pessoa que incriminaria o ex-presidente Lula.

Por Iram Alfaia

Foto: Pedro França/Agência Senado

São o técnico em contabilidade Nilton Aparecido Alves e o empresário Mário César Neves, ambos de Campo Grande (MS). A reportagem ouviu do último que o Ministério Público procurou o técnico.

“O pessoal do Ministério Público me ligou, não sei mais o nome da pessoa, mas ela queria saber quem era o Nilton, que serviços ele prestava e como poderia encontrá-lo”, contou o empresário.

No diálogo mais comprometedor até agora, Moro aparece claramente sugerindo testemunhas para a incriminar o ex-presidente, o que fere frontalmente o Código de Processo Penal (CPP) e a ética da magistratura.

Só para lembrar:

Moro: Então. Seguinte. Fonte me informou que a pessoa do contato estaria incomodado por ter sido a ela solicitada a lavratura de minutas de escrituras para transferências de propriedade de um dos filhos do ex-Presidente. Aparentemente a pessoa estaria disposta a prestar a informação. Estou então repassando. A fonte é séria.

Dallgnol: Obrigado!! Faremos contato.

Moro: E seriam dezenas de imóveis.

Às 18h08min08s, depois de se comunicar com “a pessoa do contato”, o procurador enviou uma mensagem a Moro:

Dallagnol: Liguei e ele arriou. Disse que não tem nada a falar etc… quando dei uma pressionada, desligou na minha cara… Estou pensando em fazer uma intimação oficial até, com base em notícia apócrifa.

Moro: Estranho, pois ele é quem teria alertado as pessoas que me comunicaram. Melhor formalizar então.

Moro: Supostamente teria comentado com (SUPRIMIDO) que por sua vez repassou a informação até chegar aqui.

Dallagnol: Posso indicar a fonte intermediária?

Moro: Agora já estou na dúvida.

Moro: Talvez seja melhor vcs falarem com este (SUPRIMIDO) primeiro.

Dallagnol: ok

Dallagnol: Ok, obrigado, vou ligar.

Reportagem

No diálogo, Moro se refere a Nilton Aparecido como a pessoa que fora instada “a lavrar escrituras de transferências de propriedade de um dos filhos do ex-presidente”.

Segundo a revista, ele tem um escritório no centro de Campo Grande e ao ser abordado foi evasivo: “Não sei por que meu nome está nessa história. Alguém deve ter falado alguma coisa errada”, disse. Questionado sobre as informações que teria do filho do ex-presidente e se havia prestado depoimento à Lava Jato, o técnico “encerrou a conversa dizendo que não iria declarar mais nada”.

Veja ainda revela que o técnico é conhecido no seu estado por fazer negócios fraudulentos relacionados a terra. “Agentes do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) em Mato Grosso do Sul fizeram uma operação de busca e apreensão na casa de Nilton e recolheram escrituras, agendas, extratos bancários e pen drives. Mas essa investigação não tem relação com a da Procuradoria da República no Paraná”, revela a reportagem.

O homem que ouviu a história do técnico é o empresário Mário César Neves, dono de um posto de gasolina. “Ele confirmou que, na época, em dezembro de 2015, um representante do Ministério Público Federal entrara em contato para pedir-lhe informações sobre o técnico em contabilidade Nilton Aparecido.

Mário César disse à revista que repassou ao Ministério Público o telefone de Nilton. “Eu soube que o Nilton foi chamado para prestar depoimento logo depois dessa ligação para mim”, diz o empresário, que acrescentou que soube disso por meio de funcionários do escritório de Nilton, que trabalha para ele há mais de quinze anos.

“Se for verdade, a situação de Moro complica-se ainda mais do ponto de vista jurídico. A comprovação de que o Ministério Público, de fato, não apenas ouvia, mas seguia suas orientações, reforça a tese de que, quando magistrado, Moro abandonou a posição de imparcialidade para instruir um dos lados da ação, algo considerado ilegal pelo Código de Processo Penal”, diz um trecho da reportagem.