A Venezuela Bolivariana resiste!

Passaram-se mais de 20 anos desde que Hugo Chávez, eleito, em 1998, e assumiu a Presidência da Venezuela, abrindo caminho para um período de importantes vitórias das forças progressistas e anti-imperialistas do subcontinente sul-americano.

Por Raúl Carrion

Venezuela

Desde o início, as oligarquias venezuelanas – vassalas dos Estados Unidos – se insurgiram contra essa experiência transformadora e tentaram liquidá-la no seu nascedouro, utilizando todo o tipo de expedientes antidemocráticos, mas sem obter êxito.

Hoje, os Estados Unidos, OTAN, Grupo de Lima e seus satélites – coadjuvados pela oposição golpista – realizam uma ofensiva total contra a Venezuela, inclusive ameaçando com uma agressão militar.

Os monopólios midiáticos internacionais martelam diariamente que os governos bolivarianos foram e são ditatoriais e apresentam essa cruzada bandidesca contra o povo venezuelano como “defesa da democracia” e “ajuda humanitária”.

Em amplas camadas do povo e mesmo em setores da esquerda observamos uma aceitação acrítica desses ataques, ou posturas omissas e politicamente covardes, que não compreendem a importância de uma solidariedade ativa à luta do povo venezuelano.

Nesse texto busco, de forma sucinta, historiar o chamado “processo bolivariano”, mostrando principalmente o seu caráter profundamente democrático, em contraste com a postura golpista e antidemocrática da oposição e dos EUA, desde o início do processo.

Sem pretender esgotar o tema, trago informações e dados que repõem a verdade sobre a Venezuela, com o objetivo de armar a militância progressista para uma efetiva, destemida e necessária solidariedade à luta do povo venezuelano.

Antecedentes: o “Caracazo” e a rebelião de Chávez

Em 2 de fevereiro de 1989, Carlos Andrés Perez, da Ação Democrática (AD), assumiu pela segunda vez a presidência da Venezuela. No dia 16 de fevereiro, ele dirigiu-se ao país e anunciou – para surpresa geral – que havia assinado um memorando com o FMI, para obter um empréstimo de 4,5 bilhões de dólares. No dia 25 de fevereiro, sábado, ele anunciou as contrapartidas: desvalorização da moeda; redução dos gastos públicos e do crédito; aumento da gasolina em 100% e dos transportes em 30%; aumento dos gêneros de primeira necessidade; congelamento dos salários.

A reação não se fez esperar. Na segunda feira, 27 de fevereiro explodiu nas principais cidades do país uma revolta espontânea, levando às ruas de Caracas e das principais cidades dezenas de milhares de pessoas, que passaram a protestar e saquear os estabelecimentos comerciais. A repressão, feita pelo exército, foi impiedosa e estima-se em cerca de 3.000 mortos e milhares de feridos.

O “Caracazo”, como ficou conhecida essa explosão popular, expressou uma sociedade gravemente enferma, onde 70% das pessoas viviam abaixo da linha da pobreza e 30% na miséria absoluta. Pode-se dizer que ele pôs fim ao Pacto de Punto Fijo, no qual, em 1958, os três principais partidos oligárquicos de então – AD, COPEI e URD – estabeleceram um entendimento para compartilharem o poder na Venezuela, garantindo os seus interesses de classe.

Impulsionados por esses acontecimentos, três anos depois, em 4 fevereiro de 1992, jovens oficiais de tendências progressistas e nacionalistas – que em 1982 haviam criado o Movimento Bolivariano Revolucionário 200 (MBR200) – iniciaram uma rebelião militar sob a liderança do Coronel Hugo Rafael Chavez Frías, com o objetivo de “refundar e moralizar a República”, mas foram derrotados e presos. Chavez – que assumiu toda a responsabilidade pela rebelião – permaneceu por dois anos no cárcere.

Em maio de 1993, Carlos Andrés Perez foi afastado por corrupção e, posteriormente, preso. As eleições de dezembro de 1993 deram a vitória ao ex-presidente Rafael Caldeira, do COPEI. Outra grave crise financeira paralisou o crescimento, aumentou o desemprego e a pobreza e voltou a causar grandes manifestações populares, em 1996 e 1997.

A eleição de Chávez e o “processo bolivariano”

Nas eleições de dezembro de 1998, quebrando o bipartidarismo e a alternância conservadora entre o COPEI “social-cristão” e a AD “socialdemocrata”, Chavez candidatou-se e venceu com 56% dos votos válidos. O segundo colocado obteve 33% dos votos.

Comprometido com uma melhor distribuição de renda, a moralização da administração pública e a reforma do Estado, Chávez convocou em abril de 1999 um plebiscito para decidir sobre a eleição de uma Assembleia Nacional Constituinte, o que foi aprovado por 92% dos votantes. A Constituinte tomou posse em agosto de 1999. Chavez colocou, então, o seu cargo à disposição da Constituinte, que o confirmou no cargo. Posteriormente, a Constituinte aprovou seu decreto executivo reorganizando os poderes de Estado.

Em dezembro de 1999, 71% dos votantes referendaram a nova Constituição que instituiu uma Assembleia Nacional unicameral – em substituição ao Senado e à Câmara de Deputados –, reformulou o Judiciário, aumentou o mandato presidencial de 5 para 6 anos, permitiu uma reeleição consecutiva, alterou o nome do país para “República Bolivariana da Venezuela” e ampliou os direitos dos povos indígenas, entre outras decisões.

Chávez – abrindo mão do mandato para o qual havia sido eleito – convocou novas eleições para julho de 2000, inclusive para presidência do país, sendo reeleito com 57% dos votos (contra 36% do segundo colocado) para o sextiênio 2001-2007.

De imediato colocou em prática um processo de nacionalização dos setores estratégicos da economia – como a siderúrgica Sidor (85% do aço produzido) e a Petróleos de Venezuela (PDVSA). A nacionalização dessa última só foi concluída em 2007 e enfrentou uma forte resistência de seus diretivos e parte de seus trabalhadores mais privilegiados.

Através de 49 “Leis Habilitantes” autorizadas pela Constituição – espécie de Medida Provisória brasileira –, Chavez incidiu sobre diversas áreas da economia. Três delas – a Lei de Terras, a Lei de Hidrocarbonetos e a Lei de Pesca – atingiram importantes interesses econômicos e levantaram forte oposição. Em 10 de dezembro de 2001, a Fedecâmaras patronal chamou a um protesto e paralisação de um dia, com relativo êxito.

O Golpe de abril de 2002 e o “lock out” patronal contra Chávez

No início de 2002, Chavez alterou a direção da PDVSA, tentando romper com seu caráter praticamente privado, enfrentando forte oposição dos setores conservadores, que articularam uma nova paralisação para 11 de abril.

Nesse dia, Chavez foi seqüestrado por um grupo de militares e destituído da Presidência – com o apoio aberto dos partidos de oposição e dos monopólios midiáticos –, sendo colocado em seu lugar o empresário Pedro Carmona, o mais alto executivo da FEDECAMARAS. Este de imediato declarou revogadas as 49 leis habilitantes de Chávez, dissolveu a Assembleia Nacional e suspendeu as atividades do Tribunal Supremo de Justiça, com a promessa de eleições dentro de um ano.
Imediatamente os EUA – que tiveram ingerência direta no golpe – reconheceram Carmona como o “legítimo” presidente da Venezuela. Espanha e Perú fizeram o mesmo.

Menos de 72h depois, porém, o golpe cívico-militar-midiático foi derrotado pela mobilização popular e pela ação de militares fiéis à Chavez. Vitorioso, Chávez fez um chamamento à concórdia e ao diálogo.

Diante da iminente entrada em vigor, no início de 2003, da “Lei de Terras”, que aprofundava a Reforma Agrária, e da “Lei do petróleo”, que reformava a estrutura praticamente privada da PDVSA, a oposição – que ainda detinha o comando dessa empresa – e a direitista Central de Trabalhadores da Venezuela convocaram uma “greve geral” – apoiada por um lock out patronal – que paralisou por 63 dias boa parte da economia do país, inclusive a produção petrolífera, sabotando equipamentos vitais e impedindo por certo tempo o transporte do petróleo.

Mas, o “golpe petroleiro” também fracassou e o governo colocou novamente a economia e a PDVSA em funcionamento. Tudo isso, com sérios prejuízos para o país, causando a fuga de 7 bilhões de dólares e fazendo o PIB recuar 27% no 1º semestre de 2003.

Para fazer frente a essa ofensiva das forças reacionárias, o povo venezuelano precisou avançar em seu nível de organização. Multiplicaram-se os Círculos Bolivarianos e os Comitês de Terra. A direitista e corrupta Central dos Trabalhadores da Venezuela (CTV) – que apoiou o golpe de abril de 2002 – passou a enfrentar-se com a União Nacional dos Trabalhadores (UNT), criada em abril de 2003.

Derrotada nas urnas, a oposição opta pelo confronto

Em 2004, a oposição – acreditando que os problemas econômicos em que mergulhou o país, em decorrência da “paralisação petroleira”, causariam a derrota de Chávez – exigiu a realização de um Referendo Revogatório (prerrogativa constitucional colocada na Constituição por iniciativa do próprio Chávez) para decidir sobre a permanência ou não de Chávez na presidência da Venezuela. O Referendo ocorreu em agosto de 2014 e, para surpresa dos golpistas, Chávez venceu com 59% dos votos.

Alguns meses depois, nas eleições regionais e municipais de outubro de 2004, os chavistas conquistaram outra grande vitória, elegendo 20 dos 23 governos estaduais e 270 das 337 administrações municipais, inclusive a estratégica prefeitura da região metropolitana de Caracas.
Revelando o desespero da oposição, o ex-presidente socialdemocrata Carlos Andrés Pérez afirmou: “só resta a violência para derrubar Chávez. Ele deve morrer como um cachorro”.

Pouco depois, o Promotor Danilo Anderson, responsável pelas investigações sobre o golpe de abril de 2002, foi morto por um atentado a bomba, no Centro de Caracas…

Nas eleições para a Assembleia Nacional, realizadas em 4 de dezembro de 2005, a oposição – sem perspectiva de vitória e na esperança de criar um fato político de repercussão internacional – optou pelo boicote. O resultado foi uma vitória esmagadora de Chávez, que ficou com as mãos livres para aprofundar as mudanças.

Governando para os humildes

No âmbito social, o governo desenvolveu a alfabetização massiva, a atenção médica gratuita, os mercados populares, a educação secundária e a educação universitária, beneficiando 75% da população venezuelana. A Lei de Terras, promulgada em dezembro de 2001, mas bloqueada pela violência do latifúndio – que assassinou mais de 100 lideranças camponesas – começou a ser aplicada, sendo distribuídos 2,5 milhões de hectares.

O governo criou as chamadas “Missões Sociais”, a começar pela Bairro Adentro, que garantia em cada região popular da capital e do interior um médico e um ambulatório. Diante das dificuldades em conseguir médicos venezuelanos para participar desse programa, Chávez estabeleceu um convênio com Cuba, que forneceu cerca de 20 mil médicos para o Programa.

A Missão Mercal proporcionou a venda de cestas básicas a preços inferiores aos do mercado, que em alguns casos chegava a 50%. A Missão Robinson eliminou o analfabetismo no país já em 2005. E as Missões Escolas Bolivarianas, Ribas, Sucre e Universidade Bolivariana criaram programas educacionais – inclusive universitários – para os mais pobres.

No âmbito da mídia, foram incentivados meios alternativos de comunicação, tendo surgido quase 200 rádios e TV comunitárias e a rede estatal VTV tornou-se a segunda mais vista no país (antes era a última). Da mesma forma, foi criada a TELESUR com abrangência continental.

A reeleição consagradora de Chávez

Nas eleições de dezembro de 2006, Hugo Chávez foi reeleito para o sextiênio 2007-2013, com 63% dos votos válidos, contra 37% do candidato direitista. A oposição – que, sem perspectivas de vitória, havia boicotado as eleições de 2005 para a Assembleia Nacional – passou a apostar no confronto e na desestabilização do governo.

Vitorioso, Chávez anunciou, em 28 de dezembro de 2006, que a Rádio Caracas de Televisão (RCTV) – que tivera um papel fundamental no golpe de Estado de abril de 2002 –, cuja concessão findava em março de 2007, não a teria renovada. As outras três redes privadas de televisão – Venevision, Globovision e Televen –, igualmente oposicionistas, continuaram funcionando normalmente.

Derrotado em 2007, Chávez dá a volta por cima em 2008, 2009 e 2012

Em dezembro de 2007, Chávez chamou um referendo para a reforma da Constituição, mas foi derrotado por erros sectários cometidos por ele, que se refletiram em uma grande abstenção, faltando-lhe 1,4% dos votos para aprovar as mudanças. Democraticamente, Chávez respeitou a vontade popular.

Mas, nas eleições regionais e municipais de 2008, os chavistas venceram, conquistando 18 dos 23 Estados, com uma votação que superou em 1,2 milhões de votos o resultado no referendo de 2007.
E, em 2009, em um novo referendo autorizando a reeleição ilimitada para a Presidência da República, venceu com 54% dos votos.

Em junho de 2011, em pronunciamento pela TV, Chávez anunciou que sofria de câncer.
Ainda em 2012, nacionalizou 11 plataformas petrolíferas norte-americanas e estatizou diversas fábricas do México, França e Suíça.

Nas eleições de outubro de 2012, Chávez foi reeleito para o sextiênio 2013–2019, com 54% dos votos, contra 44% de seu opositor Henrique Capriles. Tendo em vista a grave enfermidade de Chávez, assumiu interinamente o seu Vice-Presidente executivo, Nicolás Maduro Moros, em dezembro de 2012.

Com a morte de Chávez, Maduro torna-se o Presidente

Com a morte de Chávez em 5 de março de 2013, Maduro tornou-se o Presidente da Venezuela. Cumprindo o disposto na Constituição, convocou imediatamente novas eleições presidenciais. Nessas, realizadas em 14 de abril de 2013, Nicolas Maduro concorreu contra cinco candidatos de oposição e venceu o pleito com 50,62% dos votos válidos.

Essas eleições foram acompanhadas por 170 organizações internacionais – dentre as quais o Carter Center – que atestaram a regularidade do pleito. Maduro assumiu, então, a Presidência do país para o sextiênio 2013-2019, fazendo um chamamento à oposição para o diálogo.

A resposta da oposição e dos Estados Unidos – percebendo que Maduro não tinha o mesmo carisma e liderança de Chávez – foi não reconhecer as eleições, negar-se a qualquer diálogo e optar pelo confronto. Passaram, então, a exigir, sem qualquer base legal, o afastamento de Nicolás Maduro. Conclamaram ações de sabotagem, ataques a prédios públicos e atos de vandalismo de “marimberos”, causando mais de 120 mortos e 1000 feridos, sempre debitados pela mídia nacional e internacional ao “ditador Maduro”.

Apesar disso, uma pesquisa realizada um anos após o início do governo Maduro revelou que 61% dos venezuelanos aprovavam a sua gestão e 70% aprovavam as suas medidas econômicas. Nicolás Maduro continuou buscando insistentemente uma negociação com a oposição, tendo feito 338 chamados ao diálogo e à paz, desde 2013, propondo um acordo mínimo de convivência democrática. Mas tudo foi em vão.

Nas eleições para a Assembleia Nacional, em dezembro de 2015 – por conta da ação desestabilizadora da oposição e das dificuldades econômicas decorrentes da forte queda dos preços do petróleo –, a oposição venceu, com 56% dos votos. O que foi acatado pelo governo bolivariano.

A Assembleia Nacional parte para o golpismo aberto

A partir de então, o centro da conspiração golpista transladou-se para a Assembleia Nacional, que passou a trabalhar pela destituição imediata de Maduro, sem esperar as eleições de 2019. A primeira tentativa foi convocar em 2016 um “referendo revogatório” – como o que haviam feito contra Chávez em 2004. A demora em obter o número necessário de assinaturas e sua posterior conferição, as denúncias de fraudes, inviabilizaram a sua realização em 2016, com o que a oposição abandonou esse caminho, pois mesmo que fossem vitoriosos, quem assumiria seria o vice-presidente.

Em janeiro de 2017, a Assembleia Nacional – alegando as disposições do artigo 233 da Constituição – declarou o “abandono do cargo” por parte de Maduro e exigiu novas eleições, ao mesmo tempo que a oposição retomava as ações violentas e os atos de vandalismo nas ruas.

O problema é que o artigo 233 da Constituição Venezuelana qualifica como “ausência absoluta” do Chefe de Estado unicamente os casos de morte, renúncia, destituição pelo Tribunal Supremo de Justiça e abandono do cargo. Como nada disso havia ocorrido, o TSJ declarou nula essa decisão da Assembleia Nacional.

E, como a Assembleia Nacional dera posse, em janeiro de 2016, a três deputados do Estado do Amazonas – impugnados pela Justiça Eleitoral por fraude eleitoral, envolvendo a compra de votos –, desobedecendo assim a decisão judicial de aguardar a conclusão das investigações, além ter desrespeitado diversas outras decisões judiciais, o TSJ declarou a Assembleia Nacional em “desacato” e suspendeu as suas funções, em 29 de março de 2017. Maduro apelou, então, para que o TSJ revisse essa decisão, com o objetivo de assegurar a estabilidade constitucional, o que acabou sendo acatado pelo TSJ já na primeira semana de abril.

A vitória chavista na Constituinte e nas eleições regionais e municipais

Diante da postura golpista da oposição, entrincheirada na Assembleia Nacional, Maduro convocou – conforme lhe facultava a Constituição – a eleição de uma Assembleia Nacional Constituinte, obviamente hierarquicamente superior à Assembleia Nacional. Essas eleições ocorreram em 30 de julho de 2017. A oposição, dividida entre boicotar ou participar da Constituinte, foi fragorosamente derrotada. Com isso, o golpismo parlamentar foi bloqueado e a Constituinte eleita – com maioria chavista – passou a ser o verdadeiro parlamento venezuelano.

Em outubro de 2017, nas eleições regionais, a maré vasante do golpismo oposicionista ficou clara e as forças chavistas venceram 18 dos 23 governos estaduais, contra apenas 5 Estados vencidos pela oposição. Já nas eleições municipais de 10 de dezembro de 2017, as forças bolivarianas venceram em 300 municípios e a oposição em apenas 35, sendo que em pelo menos metade deles o chavismo fez mais de 70% dos votos.

Nas capitais, o chavismo venceu em 22, contra apenas 1 vitória da oposição. Ao todo, a oposição perdeu 2,1 milhões de votos nessa eleição. Com isso, as forças bolivarianas reverteram a derrota que haviam sofrido em 2015, nas eleições para a Assembleia Nacional.

Como o governador eleito pela oposição no Estado de Zulia se negou a prestar juramento diante da Assembleia Nacional Constituinte (os outros 4 o fizeram), foi destituído pelo Conselho Legislativo local. Convocadas novas eleições para o Estado de Zulia, saíram vitoriosas às forças bolivarianas, que passaram a deter 19 dos 23 governos estaduais.

Os EUA impediram que os diálogos de Santo Domingo tivessem êxito

No início de 2018, Maduro fez um novo chamamento ao diálogo. Estabeleceu-se, então, a Conferência Nacional pela Paz – os chamados “Diálogos de Santo Domingo” – com a mediação do ex-presidente Espanhol José Luis Rodriguez Zapatero. Maduro aceitou o pedido das oposições para que as eleições presidenciais– previstas para dezembro de 2018 – fossem antecipadas para maio de 2018 e que a fiscalização do pleito fosse organizada pela Secretaria Geral da ONU.

Quando estava tudo pronto para a assinatura do acordo, os Estados Unidos interferiram para que tal não ocorresse e o acordo não foi firmado, gerando forte denúncia de Zapatero. Ficou claro que os EUA e a oposição abandonavam o caminho democrático e optavam pelo caminho do golpe e da ameaça de intervenção militar.

As eleições presidenciais de 2018 e a vitória de Maduro

Apesar disso, o Governo Bolivariano manteve a antecipação das eleições e as realizou no dia 20 de maio de 2018. Acompanharam o pleito mais de 150 observadores internacionais – entre eles 14 comissões eleitorais de oito países, duas missões técnicas eleitorais, o próprio Zapatero, o ex-presidente dos EUA Jimmy Carter e jornalistas de todo o mundo. Todos atestaram a correção do pleito.

Participaram dessas eleições 16 dos 19 partidos venezuelanos e inscreveram-se seis candidatos, sendo que no decorrer do processo dois desistiram. Nicolás Maduro obteve 68% dos votos válidos e os opositores tiveram 21%, 11% e 0,4% do total dos votos.

É importante dizer que as eleições presidenciais de 2018 ocorreram no mesmo sistema eleitoral de 2015, quando a oposição venceu e não contestou o processo eleitoral. Nele, o eleitor se identifica através de suas impressões digitais e após votar em uma urna digital recebe o seu voto impresso e o depositado em uma urna física, para posterior verificação.

Após o pleito foram feitas 18 auditorias, com a participação dos representantes de todos os candidatos, sendo que nenhum deles contestou o resultado das eleições. Portanto, não tem qualquer fundamento a contestação da legitimidade da eleição de Nicolás Maduro. O mais irônico é que o presidente dos EUA – que contesta a legitimidade da eleição de Maduro – obteve menos votos que sua opositora Hillary Clinton e foi eleito por apenas 27% dos eleitores estadunidenses!

Quanto aos que contestam o caráter democrático do processo bolivariano, basta dizer que desde 1998 (primeiro governo Chávez) foram realizados 25 processos eleitorais, referendos ou plebiscitos, todos eles escrupulosamente respeitados pelo governo, mesmo quando derrotado. Pergunto: em que outro país do mundo o povo foi chamado a votar tantas vezes ao longo desses 20 anos? A resposta é: em nenhum.

Da mesma forma – ao contrário do que propalam os detratores do processo bolivariano – prevalece total liberdade midiática, existindo jornais, revistas, rádios e diversas TVs de oposição, que bombardeiam diariamente o governo com ataques, calúnias e “fake news” (notícias distorcidas ou falsas). Ressalte-se que 80% da mídia é privada e que os três jornais de caráter nacional existentes são da oposição e têm mais de 90% dos leitores. E dos quatro canais nacionais de TV, três – Globovision, Venevision e Televen – são de oposição, ocupando 90% da audiência.

Para se ter uma idéia da parcialidade dessa mídia oposicionista, basta citar o relatório do insuspeito Carter Center que, avaliando a mídia venezuelana durante a campanha presidencial de 2013, diz que a Globovision cobriu nove vezes mais o candidato da oposição Henrique Capriles do que à cobertura dada a Nicolás Maduro.

A escalada dos EUA, OTAN e seus satélites contra a Venezuela

Desde então, os EUA e os seus aliado da OTAN, OEA e Pacto de Lima (articulação dos governos direitistas da América do Sul) – desrespeitando a ONU e as mais elementares normas do Direito Internacional – desencadearam uma escalada diplomática, econômica, midiática e militar contra o povo venezuelano, interferindo nos seus assuntos internos, instigando a guerra civil e ameaçando com a intervenção militar, em um retorno descarado à “diplomacia das canhoneiras”, quando as potências coloniais do passado atacavam e invadiam as nações mais fracas para saqueá-las.
Deflagraram uma cruel “guerra econômica”, derrubaram o preço internacional do petróleo, expropriaram ilegalmente bilhões de dólares de suas reservas internacionais, retiveram os pagamentos de suas vendas de petróleo, bloquearam as suas operações financeiras e o fornecimento de produtos essenciais que a população necessita – inclusive medicamentos e alimentos –, impondo à Venezuela uma séria crise.

O advogado norte-americano Alfred Zayas “Relator Especial da ONU para a Promoção de uma Ordem Internacional Democrática”, depois de uma viagem de 10 dias à Venezuela, escreveu, em agosto de 2018, um relatório afirmando que não há crise humanitária na Venezuela e sim uma “guerra econômica asfixiante,” conduzida pela oposição: “alimentos e medicamentos não são distribuídos para supermercados e farmácias, mas armazenados e depois liberados no mercado negro”. Segundo ele, esse quadro é agravado pelas sanções econômicas dos EUA, Canadá e União Europeia, que visam “causar o caos na Venezuela, à espera de que o governo caia”. Para ele, “o nível de maquiavelismo é de tirar o fôlego” e conclui equiparando as sanções à Venezuela a crimes contra a humanidade.

Segundo as autoridades venezuelanas, essa guerra econômica já causou prejuízos de mais de 30 bilhões de dólares ao país. A situação só não é mais grave porque o governo distribui mensalmente – através dos Comitês Locais de Abastecimento e Produção (CLAP) – milhões de toneladas de alimentos, a mais de 6 milhões de famílias.

Em uma ingerência descarada na Venezuela, os EUA – com o apoio da oposição – têm conclamado abertamente os militares venezuelanos a um golpe de estado e apóiam atos terroristas, como o recente atentado contra a vida do Presidente Maduro através de drones carregados com explosivos, em uma solenidade militar. Felizmente esse magnicídio foi frustrado.

A farsa da “ajuda humanitária” foi derrotada

Não tendo conseguido derrubar Maduro através dessa bárbara guerra econômica, os EUA buscaram criar um pretexto para uma intervenção militar “humanitária” na Venezuela. Para isso, convenceram o presidente da Assembleia Nacional – o desconhecido Juan Guaidó – a autoproclamar-se “presidente interino” da Venezuela. Ato contínuo os EUA, a OTAN, o Pacto de Lima (articulação de governos de direita) e países satélites o reconheceram como o “legítimo presidente da Venezuela”.

Em seguida – sob o pretexto da existência de uma “crise humanitária” na Venezuela – o impostor (em combinação com os EUA) apelou por uma “ajuda humanitária”, que deveria ingressar através das fronteiras com a Colômbia e o Brasil (e por mar), com a “proteção” de tropas estadunidenses e de seus satélites sul-americanos. Isso, sem autorização do governo venezuelano e sem a participação de entidades internacionais, como a ONU e a Cruz Vermelha.

Inicialmente – através do capitão que desgoverna o país –, o Brasil somou-se a essa provocação contra a Venezuela, mas, depois, devido uma posição mais prudente da cúpula militar, não cedeu o seu território para a entrada de tropas estadunidenses, que escoltariam a dita “ajuda”. Limitou-se a estocar em duas cidades de Roraima – Paracaima e Boa Vista – alguns mantimentos, a serem retirados por caminhões venezuelanos, a mando de Juan Guaidó. Estes, lá se encontram até hoje, sem que ninguém tenha vindo buscá-los.

Para atrair o deslocamento de parcelas da população venezuelana até a fronteira para receber essa “ajuda”, foi organizado um show milionário – bancado com recursos estadunidenses – na cidade de Cúcuta, na fronteira da Colômbia com a Venezuela.

Sem atemorizar-se, o governo Maduro denunciou a tentativa de invasão sob o disfarce de “ajuda humanitária”, fechou as fronteiras da Venezuela com a Colômbia e com o Brasil, assim como por mar, mobilizou as suas FFAA e convocou o povo venezuelano às ruas.

Na data aprazada, 23 de fevereiro, assistiu-se a um espetáculo vergonhoso: os presidentes da Colômbia, Chile, OEA e outros próceres do desmoralizado “Grupo de Lima”, na Ponte Simón Bolivar, acompanhando o auto-proclamado “presidente interino da Venezuela”, esperando a hora de sua “entrada triunfal” em território venezuelano. O que evidentemente não aconteceu. Tudo resumiu-se a atos de vandalismo de conhecidos “marimberos”, que inclusive atearam fogo aos dois caminhões da pretensa “ajuda humanitária”. Os protagonistas maiores dessa “ópera bufa” se viram obrigados, então, a retirar-se desmoralizados, “com o rabo entre as pernas”.

Enquanto o ato-show do lado colombiano foi um fracasso, do lado venezuelano uma multidão incalculável manifestou o seu apoio a Maduro e somou-se aos militares no bloqueio da fronteira. Em Caracas e em outras cidades, multidões saíram às ruas em protesto contra essa agressão.

Maduro desmascarou ainda mais essa pretensa “ajuda humanitária” ao desafiar os EUA e seus satélites a venderem à Venezuela os alimentos e remédios que estavam se negando a fornecer. Já a Rússia, China e Cuba enviaram grande quantidade de medicamentos e alimentos, em uma verdadeira ação solidária contra o desabastecimento provocado pelos EUA e pela oposição.

Dois dias depois, na reunião de Bogotá do famigerado Grupo de Lima, apesar de Mike Pence reiterar que “todas as opções estão na mesa” – em uma clara ameaça de agressão militar à Venezuela–, a porta-voz da União Européia, o Gal. Mourão (vice-Presidente brasileiro) e a maioria dos participantes descartaram qualquer ação militar contra a Venezuela. Em um final melancólico para os EUA, a declaração do Grupo de Lima afirmou: “a transição à democracia deve ser conduzida pelos próprios venezuelanos pacificamente e no marco da Constituição (…) sem uso de força.” A montanha parira um rato!

Derrotados na sua farsa, os EUA e a oposição ainda tentaram criar um fato político com o retorno do “presidente títere” à Venezuela, certos de que ele seria preso, o que geraria uma “comoção mundial” contra Maduro. Com inteligência, o governo ignorou solenemente a volta do “pau-mandado” de Trump, e o seu retorno passou despercebido em todo o planeta.

A guerra cibernética contra a Venezuela e os “apagões”

Os EUA decidiram, então, iniciar uma criminosa guerra cibernética contra a Venezuela, sabotando todo o seu sistema elétrico, causando enormes prejuízos ao país, afetando o abastecimento de água, o atendimento em hospitais, escolas, fábricas, transportes, etc.

Com isso, pretendem criar o caos na Venezuela e fortalecer a oposição – que hipocritamente culpa o governo por essa situação –, justificando a derrubada de Maduro.

A situação é complexa e técnicos da Rússia e China já se encontram na Venezuela, ajudando a restabelecer o funcionamento das centrais elétricas venezuelanas e aprendendo as tecnologias estadunidenses de guerra cibernética. O que certamente lhes será muito útil no futuro.

Essa pérfida agressão, ao mesmo tempo em que causa graves problemas ao povo venezuelano, a total falta de escrúpulos dos EUA e da oposição e pode transformar-se em um importante elemento de esclarecimento da população.

Só os ingênuos acreditam que há alguma preocupação humanitária ou com a democracia nessas agressões dos EUA e de seus aliados à Venezuela. O seu interesse central é controlar as maiores reservas petrolíferas do planeta, que se encontram na Venezuela.

Aliás, o próprio John Bolton – assessor de Segurança Nacional da Casa Branca – confessou isso, ao declarar em janeiro deste ano que “fará uma grande diferença para os Estados Unidos, economicamente, se pudéssemos ter companhias petrolíferas americanas realmente investindo e produzindo as capacidades petrolíferas na Venezuela.”

A esse interesse econômico soma-se a preocupação em retomar o controle geopolítico da Venezuela, país chave para o controle das Antilhas e do Canal do Panamá, assim como do futuro Canal da Nicarágua, que está sendo construído pelos chineses. Essa preocupação geopolítica em relação à Venezuela se acentuou principalmente depois que Chávez e Maduro estreitaram os laços econômicos e militares com a China e com a Rússia. Não por acaso, essas duas potências mundiais declararam o seu apoio à Venezuela e advertiram os EUA de que não aceitarão qualquer intervenção militar nesse país.

Deixando claro que a agressão à Venezuela faz parte de um plano maior, o mesmo Bolton – em discurso, neste ano, em Miami – deixou claro que a queda de Nicolás Maduro na Venezuela é apenas o primeiro objetivo dos EUA, ao qual se seguirão Cuba e Nicarágua, que ele denomina “a Troika da tirania”.

Tudo isso nos mostra a gravidade da situação, que inclusive pode evoluir para um conflito mundial de grandes proporções, nas fronteiras do Brasil.

Por essa razão, a luta pela paz, contra a guerra e pela autoterminação do povo venezuela é tão importante e interessa aos povos de todo o mundo.

A solidariedade internacional é uma via de duas mãos e joga um papel decisivo!

A Venezuela Resistirá!