Brumadinho: a lógica financeira de um desastre

Há alguns dias, sobre Brumadinho, publiquei nas redes sociais que não era perito, mas uma barragem só rompe inesperadamente por explosão ou grande impacto.

Por Jorge Gregory*

Vale Brumadinho - Fotomontagem: BR247

Na verdade, ainda que não seja perito, em minha formação tenho curso técnico em edificações e outro em desenho arquitetônico, além de ter cursado até o quarto ano de engenharia química, de forma que, do ponto de vista técnico, posso fazer a afirmação acima com alguma base de conhecimento. Em entrevista a uma rede de televisão, uma engenheira que se apresentou como perita na área, afirmou que a questão é matemática e física e que nenhuma barragem amanhece e decide: “hoje eu vou desabar!”. Opinião esta, de uma especialista, que corrobora minha opinião.

Tal afirmação significa que, seja qual for a causa, não sendo ela uma explosão ou grande impacto (aqui incluindo abalo sísmico), os sinais de risco de rompimento ou desabamento de uma barragem começa a se apresentar com significativo espaço de tempo. Outro aspecto importante é que os sinais de desabamento eminente, em especial neste caso onde as imagens mostram que o rompimento se deu pela base, começam a aparecer no mínimo horas antes, de forma que há tempo suficiente para providenciar evacuação para preservar vidas. Portanto, podemos afirmar com absoluta segurança que ou a Vale e os engenheiros que monitoravam a barragem eram incompetentes e não perceberam os riscos, ou tentaram esconde-los.

O que as investigações e reportagens estão confirmando é que os sinais de alto risco de rompimento já se apresentavam há meses e eram de conhecimento da Vale. O que tais investigações também demonstram é que a empresa, ao invés de tomar a atitude de deixar a população sob alerta de risco e suspender as atividades para tomar as providências corretas, optou por manter o assunto sob sigilo e fazer um monte de gambiarras para tentar reverter o processo.

O que as investigações também estão comprovando é que havia monitoramento e que dois dias antes do rompimento já apareciam sinais de que o mesmo era eminente. Ou seja, havia tempo necessário para que a direção da empresa determinasse a evacuação e provavelmente, ainda que o desastre ambiental não fosse evitado, não teríamos nenhuma morte.

Como entender tal atitude da empresa? Para tanto, não basta o conhecimento básico de física mecânica. É necessário termos um conhecimento mínimo também da mecânica do mercado financeiro.

Quando um investidor compra ações (torna-se sócio) de uma determinada empresa por um valor X, espera vende-las por 2X em um determinado tempo, ou anualmente participar das distribuições de lucros. Quando esta valorização não se confirma ou há evidências de que a empresa vá ter prejuízos, estes investidores correm para as bolsas e tentam se livrar destas ações e o preço das mesmas começam a cair.

Por sua vez, quando há grande procura por suas ações, pois as mesmas estão em valorização, a empresa se capitaliza. Quando seus acionistas entram em pânico e começam a se livrar das ações, a mesma deixa de receber injeções de recursos, de forma que o jogo financeiro é, na quase totalidade dos casos, muito mais rentável e importante que a produção propriamente dita.

Isto posto, fica claro que o simples fato da existência de um laudo que apresentasse explicitamente o risco de rompimento, ou qualquer atitude da empresa que evidenciasse este risco, como por exemplo emitir um alerta de sobreaviso aos funcionários e moradores da região, poderia levar pânico aos investidores e o valor da Vale despencaria nas bolsas de valores. Assim, entre priorizar medidas de segurança para preservar vidas e o meio ambiente ou evitar que suas ações despencassem, os executivos da Vale, com seus cursinhos de emebiei, deliberadamente escolheram por preservar o valor das ações, optando por fazer gambiarras que escondessem o perigo, ainda que isto apresentasse o risco de um desastre ambiental e centenas de mortes.

Infelizmente tais executivos, incluindo o sr. Schvartsman, provavelmente ficarão impunes pois, afinal, o Deus Mercado a tudo perdoa.