Antonieta Trindade: Por políticas públicas permanentes para a Cultura 

Há pouco menos de dois meses no cargo de secretária estadual de Cultura, Antonieta Trindade, militante e dirigente do PCdoB em Pernambuco, concedeu entrevista à Folha de Pernambuco na qual fala sobre os avanços do setor no estado no que se refere à criação de políticas públicas permanentes voltadas para a Cultura. “São políticas de Estado e não de governo”, faz questão de destacar. Ela também antecipa pontos do balanço de atividades da secretaria nos últimos quatro anos. 

Antonieta Trindade: Em defesa de políticas públicas permanentes para a Cultura - Kleyvson Santos/Folha de Pernambuco

Antonieta assumiu o cargo em substituição a Marcelino Granja, atual presidente do PCdoB-PE, que se afastou para dedicar-se às questões do partido neste período eleitoral. Antes, ela ocupou o cargo de vice-presidente da Fundarpe, órgão executor da política cultural do estado.

Leia abaixo a entrevista.

Como a sua trajetória se funde com a da Secult-PE e quais avanços pode perceber nos últimos quatro anos?

Faço parte de um time que se formou desde o início da gestão, em 2015. Desde essa época, tenho acompanhado a gestão de dentro e tentado contribuir com ela. Comecei como gerente geral de articulação com as instituições de ensino e a partir de 2016 passei a vice-presidente da Fundarpe. A maior marca desta gestão foram os avanços na democratização da participação efetiva dos artistas, produtores e vários segmentos da cultura, na formulação de projetos e ações da secretaria. Destaco o projeto Outras Palavras, que atingiu 17.095 alunos de 584 escolas públicas estaduais, levando a cultura e materializando aquilo que está no programa de governo, que é a integração entre cultura e educação.

Destaco ainda a criação da Lei do Sistema de Incentivo à Cultura, que deve entrar em vigor em 2019 e vai trazer mais possibilidades de financiamento artístico. Essa lei é fruto de quase dois anos de reuniões no estado inteiro. Além do Fundo Pernambucano de Incentivo à Cultura (Funcultura), teremos dois mecanismos novos de incentivo, o Mecenato Cultural de Pernambuco, que é feito diretamente com as empresas, e o Credicultura, que trabalha por meio de empréstimos para microprojetos, com valores menores. Isso já está sancionado, só falta regulamentar. O sistema é importantíssimo porque amplia o financiamento e garante diretrizes, o que dá lastro a uma estrutura que já existia. Agora, as políticas são lei, são permanentes, independentemente de quem esteja no poder.

Fale um pouco mais sobre as ações estruturadoras da atual gestão.

Fomos bastante questionados pelo fato de termos interrompido a produção do Pernambuco Nação Cultural, em 2015. Não havia mais condições dele existir por conta da necessidade de nos ocuparmos das políticas estruturadoras. Mas, foi uma experiência importante, inclusive do ponto de vista da formação, pois ajudou a consolidar nossa relação nas várias Regiões do estado. Hoje temos interlocutores capacitados e elegemos as comissões setoriais. Temos três conselhos no estado, o Conselho Estadual de Política Cultural, o Conselho Estadual de Preservação e Patrimônio Cultural, e o Conselho Consultivo do Audiovisual de Pernambuco.

Também aconteceu a eleição das comissões setoriais relacionadas às várias linguagens artísticas. Em março fizemos a Conferência Estadual de Cultura prevista para acontecer de quatro em quatro anos, mas que os outros estados abandonaram porque o governo federal, após o presidente Temer assumir, descontinuou as políticas que vinham sendo construídas coletivamente. Entendemos que Pernambuco é soberano e deveria manter sua conferência, porque ela integra algo mais amplo, permanente e necessário. E foi um sucesso, houve muita participação. Antes dela aconteceram diversas plenárias nos vários municípios e Regiões.

Um dos eventos promovidos pela secretaria, o Festival de Inverno de Garanhuns, foi alvo de polêmica no mês de julho, por conta de uma peça que trazia uma atriz transexual representando Jesus Cristo, que acabou sendo retirada da grade oficial. Que balanço faz do festival?

Infelizmente, houve um uso político desse episódio. O fato é que o FIG tem avançado bastante na sua programação. Normalmente, as pessoas levam em consideração apenas o que acontece no palco principal, o Mestre Dominguinhos. Mas, o FIG é um festival nacional, com múltiplas atividades, inclusive de formação. Traz apresentações de teatro, de circo, de cinema, de literatura e ações educativas. Por isso, consideramos que foi um sucesso, já que conseguimos, em meio a essa crise e enfrentando a dificuldade de orçamento, manter e até aprimorar o nível do festival.

Nossa perspectiva é dar continuidade ao FIG e a outros eventos, como o Festival de Cinema de Triunfo, cada vez mais exitoso. O Cine Teatro Guarany, prédio histórico do Sertão, foi readequado. Houve um fortalecimento do cinema de rua e o nosso Cinema São Luiz ganhou som digital, avançando não só em sua programação, mas sediando vários eventos importantes de nosso estado.

Que avanços podem ser apontados nas atividades de cultura em Pernambuco?

Desde 2015, apenas no incentivo às ações culturais, a Secretaria de Cultura (Secult) investiu R$ 308,2 milhões, distribuídos entre o Funcultura Geral e o Funcultura Audiovisual, o Festival de Inverno de Garanhuns, os subsídios a ciclos festivos e outras atividades, como os cinco prêmios de produção cultural e as bolsas mensais que são concedidas a indivíduos e grupos que são considerados patrimônios vivos de Pernambuco.

Avançamos muito nas políticas dos editais e fortalecemos a participação de artistas nos ciclos pernambucanos. Agora, as inscrições são feitas através de editais e não contemplam apenas artistas pernambucanos, mas damos preferência aos artistas daquele ciclo, para garantir que quem é do forró, por exemplo, seja prioridade no São João. Também estabelecemos políticas que valorizam a participação das mulheres, dos negros e de pessoas com necessidades especiais. As pontuações são diferenciadas e ajudam a promover o acesso.

E criamos o Sistema Estadual de Patrimônio Imaterial, uma oportunidade muito bacana para debater, conhecer e reconhecer nossos valores. Antes não havia critérios estabelecidos para isso. Em novembro, sai o resultado do Funcultura Geral e da Música, e em dezembro vamos lançar os editais do próximo Funcultura e do prêmio Palhaço Cascudo. Ele é voltado para o fomento das atividades circenses e se junta a outros quatro prêmios de cultura, em outras linguagens como teatro, literatura, fotografia, preservação de patrimônio, cultura popular e dramaturgia.

Muita coisa foi feita, e outras precisam ser consolidadas na próxima gestão. Mas, acho que um elemento que nós podemos ressaltar que alcançamos é o fato de que ampliamos consideravelmente a participação da sociedade civil na elaboração e decisão sobre as políticas públicas no âmbito da cultura.

Publicado originalmente na Folha de Pernambuco edição de 05/10/2018.