Luta dos trabalhadores em 1968: Resistência que serve de exemplo

A greve dos trabalhadores de Contagem (MG) em 1968 foi a primeira que enfrentou a ditadura militar desde o golpe de 1964, destacou ao Portal Vermelho Carolina Maria Ruy. Ela é coordenadora do Centro de Memória Sindical e editora da revista “1968 e os trabalhadores”, que será lançada nesta quinta-feira (30) em São Paulo. A publicação dá visibilidade à luta dos trabalhadores no período em que o movimento estudantil e comportamental dominavam a cena.

Por Railídia Carvalho

Jarbas Passarinho durante a greve em Contagem

“O movimento de Contagem foi uma revelação que aos poucos foi se mostrando ter sido um movimento muito forte, com muita gente. Teve caráter reivindicativo, denúncia do custo de vida, luta por melhores salários mas também teve uma conotação política”, contou Carolina.

Na opinião da jornalista (foto), a revista veio tirar da invisibilidade a resistência do movimento sindical. “Há o interesse da mídia da elite de promover mais esse lado comportamental, destacando a rebeldia, que também tem importância, mas que não afeta diretamente a produção e as leis trabalhistas como as greves”.

João Carlos Gonçalves, o Juruna, secretário-geral da Força Sindical destacou como legado de 1968 a demonstração de poder dos trabalhadores nos locais de trabalho. Nos comitês sindicais e nas comissões de fábrica foram gestadas as greves de Contagem e Osasco, retratadas na revista através de dirigentes como os metalúrgicos Vital Nolasco e José Ibrahin.

“Da maneira como está estruturado o movimento sindical no Brasil ele nasce fora do ambiente de trabalho”, comparou Juruna. Ele lamentou que os comitês sindicais ainda não estejam consolidados no país. Segundo o dirigente, não existem nem 50 empresas no Brasil que tenham comitês nos locais de trabalho. Daí a importância de se reviver a história do movimento sindical em 68.

Na opinião de Carolina, os legados deixados pelas greves no período da ditadura alimentaram a trajetória ascendente do movimento sindical até a retomada com o movimento grevista no ABC paulista em 1978, culminando na Conferência Nacional da Classe Trabalhadora (Conclat) em 1981 e criando as condições para a criação das organizações e centrais sindicais.

“Após o impacto da reforma trabalhista, que quebrou as pernas do movimento sindical o desafio é a retomada. Para muitos o que aconteceu na ditadura, que foi terrível, não foi pior do que o cenário atual. Divulgar a luta e a resistência dos trabalhadores através da revista pode servir de lição para essa retomada”, finalizou Carolina.

Além de depoimento e entrevista com Ibrahin e Vital Nolasco, a revista entrevistou João Guilherme Vargas, Luiz Gonzaga Belluzzo e José Dirceu. Há também depoimentos de José Luiz Del Roio e Raimundo Rodrigues Pereira. Confirmaram presença no lançamento da revista José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil do governo Lula, e Aldo Rebelo, chefe da Casa Civil do governo de São Paulo.

A revista 1968 e os trabalhadores é a segunda publicação da série Memória Sindical de iniciativa do Centro de Memória Sindical com apoio das centrais sindicais brasileiras. Em outubro do ano passado, o Centro de Memória lançou a publicação "100 anos da primeira greve geral do Brasil".

SERVIÇO  

Lançamento : Revista “1968 e os trabalhadores”
Data: 30 de agosto, 5ª feira
Horário: 17h30
Local: Hotel Leques Brasil
Endereço: Rua São Joaquim, nº 216
Bairro: Liberdade – SP

Vital Nolasco

Confira abaixo trecho da entrevista com o dirigente metalúrgico Vital Nolasco (foto), que participou no ano de 1968 em Contagem (MG) da greve, em abril, e da campanha salarial, em outubro. Ambos os movimentos desafiavam a autoridade da ditadura militar. Em 1968, Vital tinha 21 anos. “Foi um movimento e tanto”, declarou ao jornalista André Cintra:

"André – Qual era a expectativa com a greve?

Vital – Havia a idealização de que a gente ia botar a ditadura abaixo. Tanto que, quando estava no auge da greve, lembro que entrei todo feliz na sala da Conceição, que era a secretária-geral, e falei: “Ô, Conceição, dessa vez a gente vai botar a ditadura abaixo”. Porque era corrente, né? Nas organizações, na JOC, no movimento sindical, todos achávamos que deveríamos aproveitar toda aquela mobilização para botar abaixo a ditadura. Agora, claro que os operários, a grande massa, não tinham essa expectativa. Queriam mesmo era o aumento.

André – Havia também temores?

Vital – Não rapaz, vou te dizer o seguinte: naquela época era todo mundo “porra louca” (risos). A gente queria “botar pra quebrar”. Tanto que a aceitação dos 10% foi sob a condição de que a gente já começasse a preparar a greve de outubro.

André – Vocês esperavam que o Jarbas Passarinho se pronunciasse sobre a greve em rede nacional?

Vital – Não. Na realidade o Jarbas Passarinho era um cara muito ousado e corajoso. Não era qualquer um que entrava em uma assembleia sindical representando o patronato e a ditadura. E ele foi. Foi e falou um monte de besteira.

André – Chegou a intimidar?

Vital – Não. Pelo contrário: tocou mais fogo na canjica. Cresceu o movimento.

André – E depois?

Vital – Aí a polícia começou a reprimir.

André – Qual foi seu sentimento em relação à greve?

Vital – Foi um sentimento de vitória. Apesar de não termos conseguido os 25% de aumento, e nem termos derrubado a ditadura, porque aquilo era um sonho. Só pelo fato de a greve ter se expandido e ter confrontado a ditadura foi um movimento e tanto, entendeu? …"   A entrevista completa está na revista "1968 e os trabalhadores".