Caso de Lula mostrará se democracia no país é real ou apenas retórica

Em entrevista, o advogado Cristiano Zanin Martins, advogado de Lula, disse que prefere acreditar que o Brasil não vai usar as mesmas desculpas da ditadura", respondeu Zanin, caso o Brasil não aceite a manifestação do Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU).

Cristiano Zanin - Rovena Rosa/Agência Brasil

Zanin entende que há tempo para o Brasil cumprir a decisão da ONU, mas Juca insiste: depois de tudo o que fizeram desde o impeachment de Dilma Rousseff em 2016, vão "entregar" tudo na "boca do gol", permitindo que Lula se candidate – e provavelmente vença, como indicam as pesquisas?

"Todo mundo vai ter de assumir a responsabilidade pelo que está acontecendo", responde o advogado. "O Brasil terá uma responsabilidade internacional por isso." A questão, diz ele, é saber se há uma democracia vigente no país ou apenas "um discurso retórico de democracia".

Questionado sobre as possíveis consequências desse caso para o Direito brasileiro e sobre questionamentos do próprio Itamaraty a respeito do cumprimento de uma determinação das Nações Unidas, Zanin disse que "ninguém pode ser contra a Operação Lava Jato ou o combate à corrupção", disse com a ressalva de que é preciso, em qualquer situação, respeitar o devido processo legal. Não é o que acontece nessa questão.

"Como pode a ONU servir de base para condenar, mas não pode ter seus tratados considerados quando são favoráveis à defesa?", pergunta o advogado de Lula.

Desde o começo, acrescenta Zanin, a defesa demonstrou as diversas violações contidas no processo judicial do ex-presidente. Cita exemplos como a condução coercitiva (em março de 2016), a divulgação de conversas telefônicas e até grampos ilegais, o que aconteceu no "principal ramal" do escritório de advocacia que ele integra, "para monitorar e mapear a estratégia de defesa". Tudo foi apresentado ao Judiciário, chegando ao Supremo Tribunal Federal, até se constatar "que não havia possibilidade de o presidente Lula receber um tratamento justo, imparcial e independente" no Brasil.

A opção pela ONU, em vez da Organização dos Estados Americanos (OEA) ocorreu por duas razões, basicamente, explica o advogado: pela celeridade e pela possibilidade de o ex-presidente fazer diretamente sua defesa. No segundo caso, isso só poderia ocorrer após manifestação do Ministério Público.

Zanin disse ainda que agora se aguarda uma manifestação pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre pedidos de impugnação da candidatura de Lula como candidato a presidente pelo PT. Ele observa que a decisão da ONU determina três itens, basicamente: que não se impeça a candidatura, que se permita acesso adequado de Lula à imprensa e também às pessoas de seu partido e da coligação.

Em maio, diz o advogado, o Comitê de Direitos Humanos da ONU já havia dito que o Brasil não poderia criar "nenhuma situação irreversível" ao direito de o ex-presidente ser candidato. A determinação recente, avalia, é um desdobramento daquela manifestação. O colegiado se pronunciou para garantir um direito. "Ainda vamos ter o julgamento final", observa Zanin, prevendo que isso aconteça no início do ano que vem.

Trata-se de um processo "marcado por várias nulidades", ressalta. "Como pode alguém ser condenado pela prática de ato indeterminado?", questiona o advogado, para quem cada vez mais há uma percepção clara, sobretudo no meio jurídico, da existência de várias violações e irregularidades.

Ele dá um exemplo que se tornou inclusive alvo de ironias nas redes sociais. "Nunca vamos esquecer do famoso PowerPoint, que chocou a comunidade jurídica internacional", lembra Zanin, ao citar episódio envolvendo o procurador Delton Dallagnol, que em entrevista coletiva em fevereiro de 2017 "explicava" as relações de Lula com um esquema de corrupção na Petrobras, tratando o ex-presidente como culpado antes mesmo do processo. "Acredito que aos poucos essa percepção (sobre violações no processo) só vai aumentar."