A violência assume novo patamar 

A violência toma conta do Brasil. No ano passado 61 mil pessoas foram assassinadas, a maioria constituída de jovens negros. No dia 14 de março foi executada a vereadora Marielle Franco, do Rio de Janeiro, elevando o patamar da barbárie.  

Marielle Franco - Divulgação

Por Domingos Miranda*

Ela era o símbolo da luta contra esta carnificina: negra, nascida na favela, socióloga, socialista, ativista dos direito humanos e quatro dias antes de sua morte denunciou a violência policial no Acari. Dos nove tiros disparados em seu carro, quatro atingiram o seu rosto e três o seu motorista, Anderson Gomes. A pergunta que todos fazem: quem ordenou este assassinato que serviu como um recado?

A tragédia brasileira é que tem muito protagonista falando em acabar com a violência e somente poucos querem extirpar a raiz do problema. A própria intervenção militar é um exemplo disso. As Forças Armadas já foram chamadas 21 vezes para enfrentar o crime no Rio, mas só uma vez conseguiu reduzir a criminalidade. Agora ficou evidente o caráter eleitoreiro desta operação para tentar elevar o índice de popularidade do presidente ilegítimo Temer. No fundo, o favelado é quem sofre as piores consequências e não os traficantes.

Até agora não se viu nenhuma prisão dos barões do tráfico, que residem nos bairros mais chiques da cidade maravilhosa. Os lucros fantásticos provenientes do comércio da droga não ficam na favela. Se não prendem os donos de helicópteros carregados de cocaína nem o político proprietário das terras onde descem aviões abarrotados de pasta base, não é agora que irão atrás de quem comanda a teia do pó no Rio. E esta grana irriga os órgãos que deveriam combater o tráfico. No ano passado, o ministro da Justiça, Torquato Jardim, disse que todos os comandos da PM no Rio estavam envolvidos com o crime. Ninguém o desmentiu.

Portanto, quando surge uma pessoa carismática, não envolvida com a rede suja da corrupção política, que obteve a quarta maior votação na Câmara de Vereadores, e começa a denunciar este estado de coisas, a sua sentença foi traçada. Marielle, quatro dias antes de morrer, apontou o dedo para o Batalhão de Irajá (41º BPM) por estar praticando violência e aterrorizando os moradores de Acari, uma comunidade da zona norte do Rio de Janeiro. A vereadora escreveu que “o 41º Batalhão é conhecido como Batalhão da Morte”. Uma semana antes, dois jovens foram encontrados mortos em um valão da comunidade.

Como ex-favelada, Marielle conhecia bem esta tática de violência dos órgãos de repressão contra os moradores dos morros. Os homens das Forças Armadas ainda não explicaram para que vieram. Entram e saem das favelas, tiram fotos dos moradores e não apresentam nenhum resultado mostrando eficiência contra o crime. Agora estão numa saia justa pois terão que esclarecer esta morte de repercussão internacional.

O caso do Rio está dentro de uma dinâmica maior, que é a articulação dos três poderes para tentar impedir a candidatura de Lula à presidência. Para isso acontecer as máscaras vão caindo e o simulacro de democracia foi para o espaço há muito tempo. A regra básica para condenar alguém no judiciário, a apresentação de provas, foi quebrada pelo juiz Sérgio Moro e pelos desembargadores do Tribunal Regional Federal de Porto Alegre. Enquanto a população volta os olhos para o Rio, os laços para levar Lula à prisão são preparados.

Muitas vezes os planos traçados pelos golpistas não saem como o programado. Basta lembrar que há 50 anos, na retomada das mobilizações populares contra a ditadura, o estudante secundarista Edson Luís de Lima Souto, de 16 anos, foi morto pela PM no restaurante Calabouço, no Rio. Isto desencadeou um acirramento dos ânimos que culminou com a Marcha dos 100 Mil, em 27 de junho de 1968. Agora, também enfrentamos uma mobilização crescente contra o golpe de 2016 e as forças democráticas buscam um candidato único para enfrentar a direita raivosa. O crescimento da revolta da população ainda não sabemos como vai se dar, mas já temos uma mártir para impulsionar esta luta. Os golpistas não passarão.

*Jornalista profissional aposentado. Atuou na imprensa alternativa durante a ditadura: jornais Uai, Movimento e Tribuna Operária.