O populismo e a direita vencem as eleições na Itália, mas sem maioria

Mesmo na véspera das eleições de domingo (4), o resultado ainda era nebuloso: as sondagens não conseguiram dizer ao certo quem sairia vencedor do conturbado panorama político italiano; contudo, uma coisa era certa, e se concretizou: ninguém obteve a maioria necessária para governar sozinho

Por Alessandra Monterastelli *

eleições na Itália - The Times

As eleições tiveram 73% de participação dos eleitores, cerca de dois pontos percentuais a menos do que em 2013. O populista Movimento 5 Estrelas (M5E) surpreendeu as expectativas dos analistas (que argumentavam que o partido “antissistema” não se sustentaria), conquistando 32,6% dos votos, sendo a maioria do seu eleitorado no sul da Itália (região predominantemente rural). O Partido Democrático (PD) de Metteo Renzi, como o esperado, teve uma enorme baixa, com 18,7% dos votos. O partido de direita de Berlusconi, Força Itália (FI) que segundo as sondagens de véspera teria a maioria dos votos, ficou atrás da extrema-direita, a Liga Norte de Matteo Salvini, que cresceu com 17,4% dos votos (algo esperado, mas não por isso menos preocupante). Berlusconi teve 14% dos votos, e está aliado a Salvini, portanto, permanece na frente com a Liga: a coalizão de direita supera o M5E. A coalizão de centro-esquerda Livres e Iguais (LeU) obteve 3,4%, enquanto a lista Poder para o Povo, composta pelo Partido da Refundação Comunista, obteve 1,1% dos votos.

Apesar da vitória do M5E, a coalizão de direita (união entre FI e a Liga) está em maioria tanto na câmara dos deputados quanto no senado, representando o pensamento anti-europa e anti-união europeia. Isso significará uma clara guinada à direita na aprovação de leis nos próximos anos, com projetos conservadores para a população e, dada a discussão central da imigração em um país que é o principal porto dos refugiados, provavelmente estes últimos sofrerão nas mãos de um Estado onde a extrema-direita xenófoba tem voz e o partido mais votado (M5E) tenta se abster do assunto o máximo possível. Sobre os conservadores de Berlusconi, não há dúvidas: ele afirmou com todas as letras que, quanto aos imigrantes, é necessário “manda-los de volta para casa”. Se no final de 2017 já foi divulgado pela imprensa de que o governo italiano estaria fazendo alianças com a guarda-costeira líbia para capturar as embarcações de refugiados em mar e leva-los de volta, sob péssimas condições, para a costa africana, imagina-se como será a atitude do Estado italiano quanto à imigração e acolhimento dessas pessoas de agora em diante.


Foto: vitória dos partidos por região 
Amarelo: Movimento 5 Estrelas
Azul: coalizão de direita (Liga Norte e Força Itália)
Vermelho: Partido Democratico + pequenos partidos de esquerda

A esquerda e o centro-esquerda, no geral, conquistaram pouco espaço na câmara e no senado para conseguir fazer um contraponto de peso à direita. Obtiveram maioria dos votos apenas na região da Toscana e de Trentino. A maior derrota foi para o PD. O partido de centro-esquerda aderiu a diversas medidas neoliberais (como a "Lei do Emprego" flexível, reformas e medidas de educação neoliberal que obrigam os italianos em idade escolar a trabalhar em estágios não remunerados) que causaram o descontentamento geral dos italianos, especialmente somando-se à crise econômica e ao desemprego; além disso, não soube lidar bem com a questão migratória, não fazendo as reformas necessárias para acolher melhor os refugiados. A população demonstrou sua decepção com o centro-esquerda nas urnas.

A extrema-direita e os conservadores de Berlusconi obtiveram a maioria dos votos do norte da Itália. Isso em um contexto de tensão: em fevereiro, um ex-militante da Liga e simpatizante da extrema-direita atirou em 6 africanos. Se nas eleições da Alemanha que ocorreram em setembro de 2017 já houve espanto por parte da comunidade europeia devido aos 12% dos votos da Alternativa para a Alemanha (extrema-direita), a Itália, agora, causa ainda mais receio; o preocupante avanço da direita fascista na Europa, que ameaça ativamente o Estado de Direito, é inegável.

O grande vencedor foi o M5E, com Luigi Di Maio. Fruto da crise e agremiação populista, se beneficiou do colapso da esquerda e da crise econômica para se estabelecer como “voz dos excluídos”. Aparentemente, deu certo. Com seu discurso anti-partidarismo conquistou o voto dos descontentes e dos desempregados, especialmente os jovens.


Luigi Di Maio, líder do M5E, e Matteo Salvini, lider do Liga 

Como escreveu a revista italiana L’Espresso, pouco depois da divulgação dos resultados: “aquilo que diferencia o Movimento italiano dos populistas europeus é a impossibilidade de inseri-lo nas tradicionais categorias de direita ou esquerda. De direita nas políticas de segurança e de esquerda na economia, o M5E quer governar com todos, para não precisar escolher uma identidade. Parece uma história nova, mas é velha, no país do transformismo”.

O único caminho possível: alianças

Apesar do sucesso do M5E e da direita, nenhum partido ou coalizão conquistou a maioria necessária para governar, nem na câmara (316) nem no Senado (158). A impossibilidade de formar um governo no primeiro momento e de governar sem alianças já era esperado por todas as sondagens e analistas políticos, e é o que causa receio nos italianos: a instabilidade, que no início de 2018 levou ao adiamento das eleições. Sem essa maioria, portanto, alianças serão necessárias.

“Di Maio e Salvini possuem as cartas no baralho, a centralidade que na política defini as posições de força. Di Maio pode se aliar a Liga, mas também com o PD. Salvini pode continuar com Berlusconi, pacto que vê como favorito, mas pode também partir para uma aliança com o M5E. Berlusconi e Renzi são aqueles que não tem nenhuma carta na manga”, escreveu L’Espresso, referindo-se à possibilidade (ou não) de uma aliança entre o M5E e a Liga e a falta de escolha do PD e do FI, partidos tradicionais na política italiana e os grandes perdedores da eleição de domingo. Para a revista, existem apenas duas saídas, igualmente dramáticos, para a crise política: isolar o M5E (caso estes não fechem alianças com ninguém) e assim impossibilitar o seu caminho para a normalidade institucional, ou o nascimento de uma maioria composta pelo M5E + Liga, pacto que “provocaria a ruptura entre Itália e Europa, o crescimento da especulação financeira e outros desastres”.