Para MPF, intervenção é grave ameaça aos direitos humanos

Em nota conjunta da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) e a Câmara Criminal do Ministério Público Federal (MPF), os órgãos criticam a intervenção federal no Rio de Janeiro, decretada por Michel Temer, apontando que o decreto possui várias inconstitucionalidades.

Fuzileiros Navais favela do Rio intervenção - Fernando Frazão/Agência Brasil

A nota frisa que o interventor nomeado por Temer, o general Walter Souza Braga Netto, deve respeitar as leis estaduais e submeter-se às regulações e regimentos civis, e não militares, durante a vigência do decreto.

"A intervenção federal no Poder Executivo estadual é, por definição constitucional, de natureza civil e não pode um decreto instituir uma intervenção militar, sob pena de responsabilidade do próprio Presidente da República que o emitiu", destaca os procuradores, lembrando que este também é o entendimento do Conselho de Direitos Humanos da ONU, da Corte Interamericana de Direitos Humanos e do Tribunal Europeu de Direitos Humanos.

Os órgãos apontam que, contrariando a legislação, o decreto não esclarece quais as medidas serão adotadas, qual a autonomia de sua ação, quais serão os poderes estaduais limitados, formas de controle.

"O decreto ressente-se de vícios que, se não sanados, podem representar graves violações à ordem constitucional e, sobretudo, aos direitos humanos", reforça a nota.

Em outro trecho da nota, as instituições rechaçam a as declarações dos ministros da Justiça, Torquato Jardim, da Defesa, Raul Jungmann (PPS), sobre a conduta das forças de repressão nas operações junto a comunidades.

Em entrevista ao Correio Brasiliense, Torquato Jardim disse que é muito difícil prevenir a letalidade em uma região com 700 favelas e 1,1 milhão de habitantes. "Você vê uma criança bonitinha, de 12 anos de idade, entrando em uma escola pública, não sabe o que ela vai fazer depois da escola", afirmou.

Jungmann, por sua vez, ao falar sobre a atuação dos soldados na segurança, disse que o Rio está em guerra e as forças militares atuarão como se estivessem num conflito.

"Essas declarações são de extrema gravidade, pois podem produzir o efeito de estimular subordinados a praticarem abusos e violações aos direitos humanos, atingindo de modo severo a população do Rio de Janeiro, que historicamente suporta a violência em geral e a violência estatal em particular. A intervenção não pode ser realizada à margem dos direitos fundamentais", defenderam os procuradores.

"Guerra se declara ao inimigo externo. No âmbito interno, o Estado não tem amigos ou inimigos. Combate o crime dentro dos marcos constitucionais e legais que lhe são impostos."

A nota também repudia a proposta aventada pelo governo de mandados de busca e apreensão coletivos, o que não tem previsão na legislação brasileira, lembrando o período sombria da ditadura militar. Tal medida autorizaria as Forças Armadas a invadir qualquer moradia ou estabelecimento dentro uma determinada área.

"Tal procedimento é ilegal, uma vez que o Código de Processo Penal determina a quem deve se dirigir a ordem judicial. Mandados em branco, conferindo salvo conduto para prender, apreender e ingressar em domicílios, atentam contra inúmeras garantias individuais", salientaram os procuradores.