Dirigentes de diversos países condenam uso político da justiça

 O evento ¨Diálogos Internacionais sobre Democracia¨, promovido pelas fundações Perseu Abramo, do PT, e Mauricio Grabois, do PCdoB, reuniu centenas de participantes de diversos países, principalmente da América do Sul. A iniciativa visa dar visibilidade ao crescente apoio internacional ao ex-presidente e contra o uso político da justiça no Brasil.  Manifestantes de 31 países já se posicionaram condenando a tentativa de impedir Lula de concorrer.

poa - Ireno Jardim

Três mesas distintas foram montadas ao longo desta segunda-feira com convidados de diversos países. O ex-chanceler do Brasil no governo Lula, Celso Amorim, ressaltou a solidariedade internacional que o ex-presidente está recebendo e que vir ao Rio Grande do Sul é emocionante "porque faz lembrar a legalidade contra o golpe de 64". Amorim considera que há uma ação determinada para subjugar toda a região: "estamos acéfalos, não temos liderança nos países para defender a região e os direitos dos trabalhadores".

Já o ex-vice-presidente do Uruguai, Raul Sendic, afirmou que o Brasil e os outros países da América do Sul estão vivendo um momento histórico: "não está em jogo só o futuro de Lula, mas do Brasil e dos países da América do Sul." Sendic disse que a população do Uruguai acompanha o desenrolar do julgamento de Lula. A Frente Ampla governa o Uruguai desde 1990 e, segundo Sendic, a população pobre no país passou de 38% para 9%.

Após a manhã de muitos aplausos a Dilma Rousseff, a tarde dos Diálogos Internacionais sobre Democracia, no lotado Auditório da Fetrafi, Centro de Porto Alegre, foi de discursos em defesa da união latino-americana e dos trabalhadores em geral. Jesus Gallego Garcia, da União Geral dos Trabalhadores, na Espanha, foi enfático: “O Brasil se converteu num capital econômico e democrático do mundo”. Já o ministro de Relações Exteriores do governo Lula, Celso Amorim, destacou a importância de os países latino-americanos atuarem em conjunto: “O Brasil está interessado na integração da América Latina porque hoje vivemos num mundo de grandes blocos, a China, os Estados Unidos. O Brasil sozinho não é um bloco, mas a América Latina é”, disse. Aplaudido em pé ao final da segunda mesa-redonda da tarde, ele terminou seu discurso com um trecho do Hino Nacional que depois foi repetido pela plateia: “Ou ficar a Pátria livre, ou morrer pelo Brasil.” Antes de ser acusado de insuflar agressões, esclareceu que o morrer seria de fome ou de vergonha, não pela violência.

Foram duas rodadas de discursos. Na primeira, o professor da Universidade de Coimbra e membro do Partido Comunista português António Avelãs Nunes foi o primeiro a falar. “A democracia brasileira vive momentos muitos difíceis, que exigem a ação do povo. Matar a fome de 40 milhões de pessoas (citando a realização do governo Lula) foi uma vitória não só do Brasil, mas do mundo inteiro”. Ao final, conquistou aplausos ao citar Geraldo Vandré – “quem sabe faz a hora, não espera acontecer” -, e Chico Buarque – “quem espera nunca alcança” e “amanhã vai ser outro dia”.

Em seguida, a jovem senadora argentina Ana Claudia Almirón lembrou que a condenação de Lula e outros atentados à democracia brasileira têm reflexos em toda a América Latina. “Precisamos nos manter unidos, organizados e solidários. A única força que lhes pode calar (referindo-se aos golpistas) são as ruas”. José Oviedo, do PLD da República Dominicana, lembrou os anos de ditadura no Brasil e terminou seu discurso com um sonoro “Eleição sem Lula é fraude.”.

Adolfo Fito Aguirre, da Central de Trabalhadores da Argentina, disse estar impressionado com a “força, organização e potência” dos movimentos sociais no Brasil. “Não vamos retroceder, não vamos aceitar essa etapa de retirada de direitos. Temos muita riqueza, pouca população, diferente da Ásia, que tem muita população e pouca riqueza. Temos uma responsabilidade histórica de discutir mundialmente. Precisamos de uma democracia não só para as eleições, mas para consolidar os direitos humanos fundamentais”, disse.

A segunda mesa, com o auditório cada vez mais lotado e muita gente sentada no chão, iniciou-se com Julia Argentina Perié, do Partido Solidário, da Argentina. “A perseguição aos dirigentes políticos e sindicais e a politização do poder Judiciário fizeram com que recuperar direitos seja uma questão cotidiana em nossos países. Viemos estender nossa mão solidária porque estamos convencidos da inocência do nosso companheiro Lula, não vamos descansar enquanto não deixarem ele participar das eleições.”

Roberto Baradel, da Central de Trabalhadores da Argentina, acentuou a transcendência que a luta em defesa de Lula e da democracia brasileira tem para a causa dos trabalhadores latino-americanos. “Se não deixarem Lula ser presidente, as corporações que distribuem miséria ao povo vão continuar governando. Temos que continuar lutando, pensar nos companheiros que morreram. Não temos medo, não temos preço, temos dignidade”, declarou, sob aplausos.
Maria Alejandra Braz, dirigente do Partido Socialista da Venezuela, manteve o tom dos outros discursos. “Com a morte do Chávez (Hugo Chávez, ex-presidente da Venezuela) começa todo um processo de recolonização, de maneira sutil. Não há como ter democracia se não há conquistas sociais. Não podemos deixar que as corporações passem à frente do homem. Não podemos abaixar a cabeça e deixar que acabem com o ser humano e a natureza.”

Jesus Gallego Garcia, da União Geral dos Trabalhadores, na Espanha, também destacou a importância de Lula e da defesa da democracia para os trabalhadores. “Lula não é importante apenas para o Brasil ou América Latina, é importante para o mundo. Se ele for presidente, os trabalhadores e trabalhadoras espanhóis estarão melhor. O Brasil se converteu num capital econômico e democrático do mundo”, encerrou, antes de puxar um coro de “Fora Temer”.

Raul Sendic, ex-vice-presidente do Uruguai, falou sobre as novas demandas das classes médias e sobre as tentativas de destruição dos laços de solidariedade entre trabalhadores. “Mais do que reduzir o estado e privatizar, as corporações querem é destruir a mística que une os setores progressistas”, disse. O final da tarde dos Diálogos ficou por conta de Celso Amorim, que iniciou sua fala respondendo a uma pergunta que tem ouvido muito nos últimos tempos. Seria uma conspiração das grandes potências e corporações o que está acontecendo na América Latina? “Vou citar um humorista, que dizia: ‘O fato de eu ser paranoico não quer dizer que eu não esteja sendo perseguido’. Não pode ser apenas coincidência tudo o que está acontecendo: atacaram nossa energia nuclear, investimento nas forças armas, direitos dos trabalhadores e acesso à saúde. Estão destruindo o Brasil.”