Diálogos Internacionais pela Democracia condenam o golpe no Brasil

Cerca de 80 representantes de partidos e organizações políticas europeias e latino-americanas, reunidas em Porta Alegre nesta segunda-feira (22), ergueram alto a bandeira da democracia e prestaram solidariedade ao ex-presidente Lula. O presidente da Fundação Maurício Grabois Renato Rabelo analisou o papel do julgamento de Lula no contexto do golpe de estado brasileiro.

Diálogos internacionais Porto Alegre - Foto: Ireno Jardim/Frente Brasil Popular

Durante a abertura do evento Diálogos Internacionais Sobre Democracia realizado pelas fundações Maurício Grabois e Perseu Abramo, na sede da Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras em Instituições Financeiras do Rio Grande do Sul (Fetrafi), em Porto Alegre, o presidente da fundação de estudos e pesquisas do PCdoB, Renato Rabelo, afirmou que uma possível condenação do ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva pelo TRF4, é a consumação do golpe iniciado com a deposição da presidenta Dilma, em 2016. Segundo ele, o Brasil vive hoje um estado de exceção e “condenar Lula é consolidar o golpe”.

Rabelo explicou que integrantes do Judiciário querem inviabilizar politicamente Lula para continuarem a política entreguista que vem sendo executada pelo grupo que está no poder. “O judiciário se transformou hoje em um poder de ação política. Passou a ser uma espécie de governo paralelo". "Por isso", explica ele, "a luta mais importante do momento é a defesa da democracia”.

A falta de legitimidade do atual governo e dos interessados nesta política de desmonte do estado Brasileiro faz com que eles temam as eleições previstas pela Constituição para este ano. “Eles fogem das decisões do povo, como o diabo foge da cruz” afirmou.

O seminário contou com a presença de cerca de 80 lideranças políticas e de trabalhadores da Europa e América Latina, todos em defesa da democracia e contra o processo de retrocesso existente na América Latina incentivado pelos Estados Unidos da América do Norte.

“A Fundação Mauricio Grabois, que é uma fundação do PCdoB, junto com a fundação Perseu Abramo do PT, estamos neste encontro internacionalista, com a presença de líderes políticos do mundo inteiro, fundações, centrais sindicais, movimentos sociais. Porque é necessário enfrentar esta política de retomada do imperialismo. Em andamento no mundo inteiro”, explicou Rabelo.

Ele lembrou ainda que é da essência da direita no Brasil jogar com a luta contra a corrupção. "A luta contra a corrupção" é uma espécie de instrumento deles para tentar desmoralizar a esquerda. Isso é antigo, vem desde Carlos Lacerda. E hoje aparece com novas roupas, inventadas pelas corporações do estado hoje estão dando um jeito de entregar o país”.

A presidente do PT, senadora Gleise Hofmann, do Paraná, também falou na abertura do evento referendando as palavras de Renato Rabelo e, em seu discurso afirmou que Temer e sua quadrilha estão desmontando todas as políticas sociais, criadas nos últimos anos e o povo brasileiro tem que resistir a isso, talvez até com uma greve geral. Saudou aos representantes argentinos e lembrou a garra com que lutaram contra a reforma da previdência naquele País.

Gleisi afirmou que condenar Lula sem provas será uma violência contra ele, contra a democracia e contra o povo brasileiro. “O Brasil não vai aceitar passivamente outra decisão que não seja declarar Lula inocente. O TRF-4 tem a oportunidade de mostrar isenção e fazer Justiça pela primeira vez neste processo.”

Ela disse que a sentença de primeira instância com a qual Sérgio Moro condenou Lula é “surreal pois nem crime tem” lembrou a sentença que o TRF4 prolatou absolvendo José Vaccari, justamente por não ser baseada em provas e sim em indícios relatados por delatores. Ela concluiu afirmando que se Lula for condenado “ não aceitaremos esta sentença e o manteremos candidato”.

Dilma

A presidenta eleita Dilma Rousseff foi muito aplaudida ao traçar um raio-x do golpe por que passa o país, dividindo-o em três atos, sendo o último a tentativa de afastar artificialmente o ex-presidente Lula da disputa eleitoral de outubro deste ano.

“O Golpe não é um ato único. O ato inaugural foi o impeachment. Criminalizou-se a política fiscal do meu governo, chamando nosso modelo anticíclico contra a crise de ‘gastança’. Depois quando tomaram o poder, imprimiram um projeto completamente neoliberal que havia sido derrotado por quatro vezes consecutivas nas urnas. Finalmente, agora, com o uso do lawfare, utilizando processos jurídicos para vencer o inimigo, querem tirar Lula do processo eleitoral, porque sabem que não produziram nenhum candidato para concorrer com Lula”, resumiu a presidenta.

Juizes em lugar dos militares

“As juntas militares foram substituídas por juntas civis, formadas por banqueiros ao lado de magistrados e promotores, em uma onda reacionária orquestrada pela imprensa dominante”, avalia o português Antonio Avelãs Nunes, professor da Universidade de Coimbra.

Para Francisco Cafiero, vice-presidente da Coppal (Conferência Permanente de Partidos Políticos da América Latina), a democracia está sendo “golpeada” em diversos países do continente e o Brasil é o “epicentro” deste processo.

“Enfrentamos a dicotomia de defender o Estado de bem estar social ou deixar avançar a agenda do capital financeiro internacional. O que se busca com o impedimento de Lula concorrer, com a perseguição a Cristina Kirchner, é fazer prevalecer o modelo neoliberal que extingue direitos, que foi derrotado nas urnas”.

Já o ex-ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, afirmou que esta nova onda conservadora e golpista veio em um momento em que “estávamos consolidando uma integração da região, com a criação da União Sul-Americana de Nações (Unasul), com uma escola de Defesa na América do Sul. Isso está sendo interrompido em todo o continente.”

Segundo o secretário-geral da Confederação Sindical das Américas, Victor Baez, em outros países, acontecerá o mesmo que está ocorrendo agora aqui. “O Brasil foi uma potência regional que apresentou ‘problemas’ para o sistema, como a iniciativa dos Brics, a Unasul e o apoio à integração regional do continente”, disse ele.

“Lula é o símbolo. Qual é o outro grande líder de esquerda no mundo? Não tem. Ele não pode ser condenado, não apresentaram provas. Se for condenado, será a prova de que o capitalismo e a democracia são antagônicos”, concluiu.

Na mesma linha de raciocínio, o ex-ministro do Desenvolvimento Agrário Miguel Rossetto disse que “a sociedade brasileira viveu com Lula um novo país. É isso que a população está querendo de volta. Por isso haverá uma caminhada amanhã [23, terça] em Porto Alegre, em direção à legalidade e à Constituição, estará lotada e será um sucesso.”

O ex-ministro encerrou falando sobre o “clima” que se formou às vésperas do dia 24, quando o TRF-4 vai julgar a sentença de Moro no caso do Triplex da OAS: “Chegamos ao dia 24 com uma unidade de compromisso democrático impressionante no país. Está claro que esse processo jurídico contra Lula não se sustenta. O lado da Justiça só admite a anulação da sentença de Moro e a liberdade para que o povo possa escolher o seu presidente da República.”

Marita Gonzales, da Confederação Geral dos Trabalhadores a Argentina, lembrou que o Mercosul tinha um projeto regional democrático de participação social, mas, na medida em que governos de matriz conservadora foram assumindo o poder nos países do bloco, se tornou quase apenas um tratado de livre comércio. “Com isso, estamos perdendo um grande projeto de restauração e soberania regional”, destacou a sindicalista.

Já Victor Baez, da Confederação Sindical das Américas, destacou o processo de judicialização da política, que ocorre no Brasil, mas não só no Brasil. “A direita brasileira e de outros países do continente está reagindo contra a democratização fazendo uso de métodos judiciais, atacando nos tribunais aqueles que não seriam vencidos nas urnas”.

Para o italiano Marco Consolo, do Partido da Esquerda Europeia, o que se assiste no caso de Lula é “um julgamento sem nenhuma imparcialidade, comandado pela mídia, baseado em delações premiadas sem credibilidade e com o objetivo claro de chegar à condenação definitiva do ex-presidente Lula a tempo de impedir sua participação nas eleições”.

Consolo sugeriu ainda a criação de um comitê internacional de juristas em defesa de lula. “Nós nos comprometemos a realizar ações no Parlamento Europeu e nos congressos nacionais para denunciar esta farsa jurídico-midiática que acontece aqui”.

Oscar Labordi, da Frente Transversal da Argentina, apontou o caráter internacional que possui esta onda conservadora que tenta sufocar as forças democráticas e progressistas. “O que hoje sofre Lula e a presidenta eleita, também já sofreu Manuel Zelaya, em Honduras, e Fernando Lugo, no Paraguai.

Maria Alejandra Braz, dirigente do Partido Socialista da Venezuela, manteve o tom dos outros discursos. “Com a morte do Chávez (Hugo Chávez, ex-presidente da Venezuela) começa todo um processo de recolonização, de maneira sutil. Não há como ter democracia se não há conquistas sociais. Não podemos deixar que as corporações passem à frente do homem. Não podemos abaixar a cabeça e deixar que acabem com o ser humano e a natureza.”

Jesus Gallego Garcia, da União Geral dos Trabalhadores, na Espanha, também destacou a importância de Lula e da defesa da democracia para os trabalhadores. “Lula não é importante apenas para o Brasil ou América Latina, é importante para o mundo. Se ele for presidente, os trabalhadores e trabalhadoras espanhóis estarão melhor. O Brasil se converteu num capital econômico e democrático do mundo”, encerrou, antes de puxar um coro de “Fora Temer”.

Raul Sendic, ex-vice-presidente do Uruguai, falou sobre as novas demandas das classes médias e sobre as tentativas de destruição dos laços de solidariedade entre trabalhadores. “Mais do que reduzir o estado e privatizar, as corporações querem é destruir a mística que une os setores progressistas”, disse.