Regra de Temer para conteúdo local desagrada trabalhadores e indústria

A política de conteúdo local permanece em pauta na Câmara dos Deputados. Participantes da audiência na Câmara sobre projeto de lei (PL 7401/17) que estabelece a política de conteúdo local para as atividades de exploração e produção de petróleo, afirmaram que alterar as regras da política não significa reduzir os percentuais como quer o governo de Michel Temer. Sindicalistas defenderam proteção á indústria nacional do petróleo.

audiencia sobre PL de Davidson magalhães sobre conteúdo local novembro 2017 - PCdoB na Câmara

A proposta que foi debatida no final de novembro também se refere à exploração de gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos, aplicável aos regimes de concessão e de partilha. De autoria do deputado Davidson Magalhães (PCdoB-BA). ela ainda será votada na Comissão de Minas e Energia. Depois, será analisada pelas comissões de Finanças e Tributação; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.

Pelo projeto, o percentual médio global do conteúdo local na etapa do desenvolvimento da produção deve ser de, no mínimo, 50%; para a fase de exploração, de pelo menos 30%. Nova política de exploração definida pelo governo reduziu os percentuais de participação da indústria nacional no processo.

No debate promovido pela Comissão de Minas e Emergia, a coordenadora de Conteúdo Local da Agência Nacional de Petróleo, Daniela Godoy, disse que as regras precisaram ser alteradas porque os processos eram demasiados rígidos em relação aos percentuais, o que acabava acarretando uma série de problemas na fase de exploração.

Ela explicou que as alterações foram sugeridas pelo Conselho Nacional de Política Energética em análise com os ministérios envolvidos e o Tribunal de Contas da União. "Nós saímos daquelas exigências de quase 70 itens de compromisso para exigências no nível global no caso da exploração e para macrogrupos no caso de desenvolvimento da exploração”, explicou.

Segundo Daniela, foram fixados novos percentuais de compromisso. “Agora não dá para pedir dispensa de cumprimento, tem que cumprir. Foram mantidas a multa e a certificação de terceira parte como já estava no modelo anterior", disse.

Revisão de percentuais

Para o representante da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Idarilho Nascimento, as alterações são necessárias, mas só após um estudo e com a separação de bens e serviços.

"Nós estamos de acordo com a flexibilização das regras, mas isso não necessariamente significa a redução dos percentuais. Estamos de acordo que eles sejam revistos. Há percentuais que são excessivos, há outros inatingíveis, mas tem que ser feito algo coerente, que seja mapeado, estudado e detalhado."

Coordenador-geral da Federação Única dos Petroleiros, José Maria Rangel afirmou que, se não houver um mecanismo eficiente de proteção à indústria nacional ligada ao petróleo, muitas pessoas serão prejudicadas e o futuro do País ficará comprometido.

"Nós temos exemplos vitoriosos, como o da Noruega. Assim que o país descobriu petróleo, criou uma política de conteúdo local que só teve fim em 1992. Aqui, não há paciência para que as coisas aconteçam. A lei da partilha era de 2010 e já foi mudada sem nem ter sido testada, porque o campo de Libra [pré-sal no litoral do Rio] não entrou em produção ainda."

Conflito de interesses

Para Davidson Magalhães (PCdoB-BA), a audiência deixou bem claro que, em relação ao conteúdo local, existe um conflito de interesses entre as empresas estrangeiras e a indústria nacional. "Nós precisamos ter uma política realista que leve em consideração as condições das nossas empresas, mas também o seu desenvolvimento."

Defesa da indústria nacional

Marcelino da Rocha, presidente da FITMETAL, participou da audiência e ressaltou a importância do Ciclo de Debates, promovido pela Federação, que tem percorrido o Brasil para discutir alternativas para a reindustrialização, colocando o país novamente na rota do desenvolvimento. Ao final do “Ciclo de Debates”, que terá a sua décima etapa em 7 de dezembro em São Luís (MA), será elaborado um documento com a indicação das possibilidades e potencialidades para a retomada da produção nacional

Em sua fala, Marcelino lamentou a situação na qual a indústria brasileira chegou e responsabiliza o Estado brasileiro pelo atual momento.

“É lamentável chegarmos em uma situação tão degradante, pois nenhum país do mundo se desenvolveu sem o investimento forte do Estado. Recentemente o presidente Obama ofereceu quase 100 bilhões de reais [Entre 2008 e 2009, a GM recebeu mais de US$ 28 bilhões de dólares] para não deixar acontecer a falência da GM. Nesse ano o presidente francês nacionalizou os estaleiros para preservar a indústria nacional na disputa contra os italianos e chineses. Enquanto isso no Brasil estamos caminhando na contramão na história”, disse.

Segundo o presidente da FITMETAL, “não existe desenvolvimento sem indústria forte”. Portanto é fundamental insistir no debate da reindustrialização, pois o país perdeu, ao longo das décadas, a participação da indústria na composição do Produto Interno Bruto.

“Dos quase 30% de participação da indústria do PIB em meados da década de 80, em 2015, no último levantamento, chegamos em torno de 11%. A verificação de 2017, provavelmente, vai estar abaixo de 10% de participação”, projeta.

Este cenário de caos da indústria, para Marcelino, ‘combina’ com as ‘reformas’ propostas pelo governo Temer, que emprega medidas de austeridade justificadas com base no caos que ele mesmo ajudou a criar.

“Temos hoje milhares de trabalhadores da indústria naval do Rio de Janeiro sem receber verbas rescisórias, algumas demissões aconteceram a mais de quatro anos. Temos trabalhadores no Rio Grande do Sul também sem o pagamento de rescisão, e o pior: sem perspectiva. A situação da indústria brasileira combina muito com essa ‘ilha de fantasia’ que estamos vivendo hoje no Brasil: com uma previsão de ‘reforma’ da Previdência, com 14 milhões de desempregados e sem a perspectiva de um novo emprego, com os que estão empregados temerosos em perder o emprego, sem perspectiva de aposentadoria por causa da rotatividade da mão de obra, sem contar os aposentados que poderão receber salários inferiores ao piso do salário mínimo nacional”, criticou.