Serviço Público:Juíza contesta Boechat que defende fim da estabilidade

Na opinião da Juíza do Trabalho, Valdete Souto Severo, a aplicação de critérios subjetivos previstos no Projeto de Lei do Senado (PLS) 116/2017 podem facilitar a perseguição ao trabalhador do serviço público. O projeto foi aprovado na quarta-feira (4) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado e acaba com o fim da estabilidade do servidor público. Aquele que não obtiver nota favorável na avaliação de desempenho proposta será demitido.

Por Railídia Carvalho

Valdete Souto Severo, juiza do trabalho RS - Maia Rubim/Sul21

O argumento da magistrada foi endereçado ao jornalista Ricardo Boechat, que nesta quinta-feira (5) defendeu o PLS em programa de rádio. “Caro Boechat, em um país com tantos desempregados e miseráveis, com tão alta concentração de renda, deveríamos estar batalhando para estender aos empregados da iniciativa privada o direito de não serem despedidos, senão pelo cometimento de falta grave como, repito, já é possível hoje, pela legislação vigente, em relação aos servidores públicos”.

Segundo Valdete, que é juíza do trabalho em Porto Alegre (RS) e Doutora em Direito do Trabalho pela USP “a proteção contra a despedida que é direito dos servidores, atende ao interesse público, pois evita (ou tende a evitar) que esses trabalhadores atuem pressionados pelo medo da perda do trabalho, permite que se qualifiquem ao longo do tempo e lhes dá a tranquilidade para bem exercer seu mister”.

A Lei 8112, atualmente vigente, permite a demissão do servidor que não desempenhar bem suas funções (artigos 127 e seguintes). “Então, nesse aspecto, não há novidade. Os servidores também já são avaliados periodicamente. A novidade é inserir critério subjetivo para o que será considerado “mau desempenho”, a fim de facilitar a demissão”, completou em texto no perfil do facebook.

Assédio Moral

Ela afirmou que o uso de critérios subjetivos facilita o assédio moral e a ameaça da perda do emprego. “Permite que o administrador descarte, inclusive, o servidor que com ele não compactua em termos de ideologia política, por exemplo”.

A Juíza lembrou ao jornalista que a realidade atual do trabalhador do serviço público é de “sucateamento das instituições públicas, parcelamento de salários e perseguição política”. Na opinião dela, “os serviços públicos mal prestados” não são motivados pela estabilidade do servidor. “Se isso fosse verdade, os serviços de telefonia, já privatizados, seriam eficientes. Não são”, completou.

Vadelte argumentou: “Temos estruturas deficitárias, demandas em quantidade maior do que a capacidade de atendimento e tantos outros fatores que teriam de ser considerados e que impedem a análise simplista que joga a culpa sob os ombros dos servidores”.

Ataque aos direitos mínimos

Valdete desconstrói a visão negativa que a mídia passa sobre servidores públicos. “Servidores não tem privilégios, tem direitos! Direitos que deveriam ser estendidos à iniciativa privada, e não suprimidos”, defendeu.

Ela reitera que o discurso “liberal que está rifando direitos mínimos” no Brasil precisa ser combatido. “O mesmo já ocorreu com a reforma trabalhista, que sob falsos argumentos precariza ainda mais as condições de quem trabalha no Brasil, prejudicando com isso não apenas o trabalhador e sua família, mas também o próprio mercado interno, porque reduz consumo; o próprio estado, porque suprime base de arrecadação para a previdência”.

Na opinião da Juíza, todos perdem com a retirada de direitos. “Retirar proteção para o trabalhador servidor (que na realidade do estado que o senador Lazier representa está tendo seus salários parcelados), privatizar, retirar direitos trabalhistas, é criar instabilidade”.

Mais retrocesso

Valdete questionou: “Será que não retrocedemos o suficiente com a reforma trabalhista? Chega de retirar direitos sociais! O que conseguiremos com isso será a potencialização da miséria, da violência urbana, das doenças ligadas à instabilidade da vida contemporânea”.

Ela citou ainda que o PLS foi rejeitado na Consulta Pública realizada pelo site do Senado. Mais de 100 mil pessoas votaram contra a iniciativa, que foi apoiada por 34. 820 internautas. “Esse discurso de retirada de direitos não promove avanço, não irá qualificar a prestação do serviço público. E não atende ao anseio da sociedade”, ressaltou.

A Juíza finalizou o post pedindo ao jornalista que refletisse sobre a defesa do que ela chamou de “projeto nefasto”. Por te considerar um dos melhores comunicadores da atualidade no Brasil, te peço que reflita acerca da defesa desse projeto nefasto, cuja “propaganda” é já enganosa, pois distorce a realidade vigente. E cujas consequências atingirão, inclusive, o cidadão que busca tais serviços”.