PSDB tucanou autocrítica e diz que crise é culpa do modelo político

Diante do desgaste político e da perda do posto de paladino do combate à corrupção, o PSDB veiculou o seu programa de rádio e TV, nesta quinta-feira (17), uma peça publicitária que tenta fazer mea culpa do fracasso do golpe com o governo de Michel Temer.

Por Dayane Santos

Propaganda PSDB - Reprodução

“É hora de pensar o Brasil”, foi a palavra de ordem da propaganda, que inicia como uma suposta "autocrítica" da legenda que diz que o “PSDB errou”, mas sem apontar os erros, diz que quem pensa no país “deve ser capaz de rever as suas ações e posições” e que tudo isso deve ser feito “sem guerra, sem ódio e sem medo”.

Tudo não passou de discurso, pois a propaganda que diz fazer autocrítica, exibe uma série de imagens de parlamentares da oposição em debates no Congresso Nacional, sugerindo que estes são os responsáveis pela instabilidade política e pelo clima de rancor e intolerância.

Em toda a edição, apenas um tucano aparece – e de costas – o senador Ataídes Oliveira (TO), em discussão durante sessão no parlamento. Para quem diz que faz autocrítica, não passou de mero factoide.

“O PSDB não assume erro nenhum, até porque seus erros estão exatamente na venda desse país. Em todos os processos de privatização sob judice, mas nenhuma CPI instalada, apesar da solicitação de vários parlamentares da oposição à época de Fernando Henrique, como também em toda a votação de retirada de direitos dos trabalhadores brasileiros, que não encontraram no PSDB qualquer apoio”, destacou a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ).

Para o também deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), o programa tucano tentou se decolar da política tradicional com uma mea culpa e uma proposta para tirar o Brasil da crise através do parlamentarismo. "Errou nessas duas mensagens", disse ele.

"Não conseguiu passar a ideia de modernidade porque seu compromisso é conservador. Ao utilizar personagens populares e nenhum quadro partidário soou artificial nas palavras. Admitiu que o PSDB errou e limitou-se a dizer que cedeu ao fisiologismo. É verdade, os tucanos são complacentes com a velha política do clientelismo, mas não se explicaram porque apoiam Michel Temer, porque votaram contra os trabalhadores na reforma trabalhista e que pretendem votar contra o povo na reforma da Previdência", reforçou o deputado comunista.

Discurso de ódio

O PSDB encabeçou o golpe. Defendeu que queria ver a “Dilma sangrar” (declaração do candidato a vice na chapa derrotada de Aécio Neves e atual ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes); 48 horas após o final a apuração pediu a recontagem dos votos, insinuando uma fraude eleitoral; e insuflou a campanha da antipolítica e ódio, diz agora que é preciso recorrer a política para enfrentar a crise.

“Quem mais estimulou o ódio e a intolerância foi o PSDB, que ao final de 2014, como não conseguiu ganhar a eleição, jogou os votos dos brasileiros no lixo, provocou o ódio e a intolerância, estimulando o crescimento da onda fascista. Apostou na queda de uma presidenta eleita, sem crime de responsabilidade. E agora dizem em sua propaganda que a presidenta não concluiu o seu mandato como se isso fosse algo provocado fora do PSDB”, frisou Jandira Feghali, ressaltando que os líderes da sigla não apareceram no programa.

“O programa escondeu seus líderes porque está difícil mostrar a cara de lideranças, tendo uma boa parte acusada de corrupção e ilícitos”, declarou a parlamentar.

Pensou no mercado

O mote usado agora: “É hora de pensar o Brasil”, foi descartado pelos tucanos quando estavam na oposição ao governo da presidenta Dilma. O inconformismo da derrota nas urnas e a ânsia de chegar ao poder para atender aos seus interesses, prevaleceram na pauta de prioridades da legenda.

Escolheram o caminho da judicialização da política, insuflando setores do Judiciário a impedir o avanço das forças progressistas por meio de arbitrariedades e “investigações” espetacularizadas pela grande mídia. Ganharam o palanque e os holofotes da imprensa e acreditaram que Temer faria o trabalho sujo da agenda de reformas, como a trabalhista e da Previdência, para chegarem em 2018 como a alternativa de “salvação nacional”.

Para eles, o script estava montado, bastando somente seguir o roteiro e ficar em cima do muro até 2018. Mas a realidade dos fatos levou o muro abaixo. Como foram alvos de seu próprio veneno, tendo o seu principal representante, o senador Aécio Neves, flagrado em gravações nada republicanas com um empresário da JBS e com o flagrante da mala de dinheiro, e como o governo Temer está mergulhando e denúncias e a política econômica aprofunda a recessão e o desemprego, os tucanos tentam encontrar uma saída para justificar o seu golpismo.

Fisiologismo tucano

Outro ponto da propaganda que chama a atenção é o que a sigla se diz arrependida por aceitar o fisiologismo como natural da política.

“O PSDB sabe que é hora de aceitar os seus erros. Acabamos aceitando como natural o fisiologismo, que é a troca de favores individuais em detrimento da verdadeira necessidade do cidadão brasileiro”, diz a propaganda, seguindo de uma crítica ao que chama de “presidencialismo de cooptação”.

A peça usou uma animação em que um bonequinho vestido com a faixa presidencial entrega blocos a deputados, representados por figurinhas com cifrões no lugar dos olhos. Há pouco tempo, tal conduta foi tema de discursos raivosos e acalorados de representantes tucanos contra seus adversários políticos.

A propaganda ainda acusa o governo, que chegou ao poder graças à sustentação tucana, de praticar fisiologia e diz que Temer enfrenta “grandes dificuldades para governar e unir os brasileiros”. E mais. Diz que Temer está “sem força para governar e sem apoio popular”.

“Fala de benesses e processos de governo e dificuldade quando eles continuam fazendo parte do governo [Temer]. Faz a crítica do ‘presidencialismo de coalizão’, quando a legenda constitui como um dos aliados de um governo, votando e mamando nas tetas do governo. É de uma incoerência total e absoluta”, argumenta a deputada Jandira.

Racha vira abismo

Esse trecho da propaganda desencadeou nova grave crise no ninho tucano. Ministros e deputados criticaram o presidente interino, Tasso Jereissati (PSDB-CE), o responsável pela peça, e já pedem a sua deposição do posto.

O racha se transformou num abismo. E o partido que se diz a voz de unificação do país, não consegue ter coesão interna.

Aloysio Nunes foi um dos primeiros a se pronunciar. Por meio das redes sociais, disse que o programa é uma “crítica vulgar” e que deve ter levado o PT às gargalhadas.

Aloysio ainda tentou justificar a permanência no governo Temer, dizendo que os cargos "não foram negociados por baixo do pano, por fisiologismo ou apego aos cifrões”.

Em nota, o ministro das Cidades, Bruno Araújo (PSDB-PE), classificou a a publicidade como injusta com a “história do partido”, que teria optado por um caminho de “recuperação do país”.

O deputado Marcus Pestana (PSDB-MG) decreto que Tasso “não une mais o partido”.

Parlamentarismo

Além disso, os tucanos admitem que a crise política contaminou todas a s instituições e a crise de credibilidade é generalizada. Porém, dizem que a culpa não foi do seu discurso da antipolítica e do golpe, mas do sistema presidencialista. Diz ainda que não basta mudar os governantes, mas que é preciso mudar a maneira de governar e defendem que o sistema parlamentarista é o mais adequado.

Para Jandira, o discurso em defesa do parlamentarismo é “puro oportunismo”.

“Levantar a bandeira do parlamentarismo oportunisticamente não é aceitável. Não se trata de levantar uma questão programática, mas de oportunismo político, no momento em que se levanta a proposta de antecipação das eleições direitas, a solução pelo voto popular”, destaca ele, enfatizando que a preocupação é que a população interpreta como uma tentativa de anular o processo democrático brasileiro e, por consequência, as eleições de 2018.

“É um programa mentiroso, que não diz nada, apenas esconde todas as corrupções e todas as atitudes nefastas na história do Brasil construídas pelo PSDB. E ao mesmo tempo levanta a lebre de mais um possível boicote à democracia”, conclui a deputada.

Já Orlando Silva disse que, ao buscarem uma "fórmula mágica" do parlamentarismo, os tucanos explicaram mal, simplificando uma falsa unidade na escolha de um pretenso primeiro ministro. Ele lembrou que a direita sempre tentou emplacar o parlamentarismo em momentos de crise política.

"Ao tentar disfarçar uma proposta avançada o PSDB, sem querer, se auto-denunciou conservador", analisou.