Reforma do Ensino Médio leva à privatização e falta de diversidade

Mudanças devem desprofissionalizar e aumentar o número de jovens fora da escola

A reforma do Ensino Médio, sancionada em fevereiro deste ano, flexibiliza a grade curricular do estudante com 60% da grade curricular composta por disciplinas obrigatórias e 40% optativas.

Por Verônica Lugarini

ensino médio - Arquivo EBC

Dessa forma, no meio do curso, o estudante terá que escolher uma das cinco áreas para se especializar: linguagem e suas tecnologias; matemática e suas tecnologias; ciências da natureza e suas tecnologias; ciências humanas e sociais aplicadas ou formação técnica profissional. A reforma também prevê a ampliação gradual da carga horária anual, das 800 horas atuais para 1.000 horas em até cinco anos e, depois, para 1.400 horas sem prazo determinado.

Para Nereide Saviani, doutora em História e Filosofia da Educação pela PUC-SP, membro do Comitê Central e diretora da Escola Nacional de Formação João Amazonas, a reforma é só o início das políticas privatizadoras do governo Temer que poderá desembocar na privatização e na falta de diversidade no ensino médio.

“Ter um ensino de período integral pode significar a saída de jovens da escola porque não tem disponibilidade de estudar o dia inteiro e da possível redução de unidades escolares. Além da privatização por meio da terceirização dos professores, já que para atender a demanda da carga horária seria também necessário estender o horário de trabalho dos docentes, o que significa mais despesa”, analisou Nereide em entrevista ao Portal Vermelho.

É esse caráter de terceirização, da possibilidade de professores sem diplomas específicos poderem dar aula e de permitir que as escolas possam escolher o aprofundamento em algumas matérias poderá levar a falta de priorização e exclusão da diversidade no conteúdo escolar.

“Uma equipe formada por profissionais que não têm formação pedagógica de valorizar questões da diversidade e da diversidade regional. É preciso sempre contemplar a questão do negro em nossa sociedade, por exemplo”, explicou Nereide.

Falta de debate

“A reforma do ensino médio é aparente democrática porque não houve debate sobre a elaboração curricular entre especialistas, professores e principalmente, estudantes. A medida foi tomada às pressas, sem que fossem analisadas as consequências dessas mudanças”, disse Nereide.

Por exemplo, com a reforma do ensino médio as instituições não serão obrigadas a oferecer todas as ênfases curriculares, o que poderá obrigar os alunos a mudarem de escola ou até, que se tenha uma priorização ou déficit de determinadas áreas nas escolas brasileiras.

Já o ensino integral poderá aumentar o número de jovens fora da escola, já que muitos trabalham para complementar a renda familiar. Essa alteração também poderá ameaçar a qualidade e consistência de conteúdos passados, apenas para que sejam cumpridas as horas incluídas na carga horária.

Nereide destaca outro ponto negativo da reforma: a troca de uma formação profissional contínua por uma formação de caráter técnico profissionalizante estagnado.

“Isso significa que o aluno que optar pelo curso técnico tem grandes chances de parar de estudar após a conclusão do ensino médio. Assim, além de não priorizar o estudo – por já estar inserido no mercado de trabalho – o aluno também terá menos tempo para se dedicar aos cursos de formação e cursos complementares”, disse a especialista.

Ensino técnico

O ensino técnico também delimita a ocupação qualificada, formando intencionalmente jovens para áreas específicas que atendam aos interesses do mercado. Segundo Nereide, a reforma é uma proposta altamente excludente porque o ensino médio tem uma dupla função: formar bases científicas – que são os fundamentos das modernas atuações na sociedade e que aprofundam o conhecimento e emancipam o indivíduo – e técnica, que insere rapidamente o jovem no mercado de trabalho, mas que dificulta a continuidade do aprimoramento profissional. Assim, com a proposta há a priorização apenas da técnica de produção para profissões que interessam ao mercado de trabalho.